Ataque de Chávez é burrice
13 de maio de 2008Hugo Chávez exagerou no tom e nada mais se deve deduzir além disso. Aproximar Angela Merkel de Hitler é uma falta de respeito e uma burrice. E é uma burrice de tal tamanho que a chanceler federal faz muito bem em não reagir ao ataque do presidente venezuelano.
"As declarações do presidente Chávez falam por si mesmas", comentou Angela Merkel através do seu vice-porta-voz de governo, que também se referiu à entrevista de Angela Merkel que provocou furor naquele que se autodenomina revolucionário e combatente da causa latino-americana.
No contexto de sua primeira viagem à América Latina, dois anos após assumir a chefia do governo alemão, Angela Merkel afirmou que Chávez não fala pela América Latina e que cada país da região tem voz própria e se orienta por seus próprios interesses.
Em princípio, Angela Merkel está também correta neste ponto e – sem querer – delineou o problema fundamental e a crítica situação das relações entre a União Européia e a América Latina.
Oficialmente, a União Européia negocia somente com os blocos regionais da América Latina, como o Mercosul ou a Comunidade Andina. E as negociações emperram justamente porque os países da região põem, muitas vezes, seus interesses particulares à frente dos objetivos comuns – há anos que o tratado de livre comércio com o Mercosul está na gaveta.
Apesar das declarações contrárias de políticos, o interesse da Europa pela América Latina começa a diminuir. Há muito que a economia alemã vem se direcionando aos crescentes mercados asiáticos. Somente o volume de exportações para a China supera em um terço o valor total das exportações para a América Latina.
A África situa-se, geograficamente, mais perto da Europa. Através dos refugiados, os problemas sociais do continente africano estão às portas do continente – desta forma, engajar-se contra a miséria ao sul do Saara é interesse dos próprios europeus.
A América Latina é, mundialmente, o continente de maior desigualdade social. Os sistemas econômicos neoliberais, introduzidos na região pelas ditaduras militares apoiadas pelos EUA durante as décadas de 1970 e 1980, provocaram o empobrecimento de grande parte da população entre e o Rio Grande e a Terra do Fogo. O escorregão à esquerda dos últimos três anos não veio de graça.
Isto ainda não provocou a diminuição da miséria, mas a população tem pelo menos o sentimento de que é regida por políticos que representam seus interesses e não os interesses de investidores estrangeiros.
Se e de que forma alguém como Hugo Chávez pode se apresentar como advogado de outros países latino-americanos, depende de se conseguir uma resposta à questão social na região. A observação da chanceler federal Merkel de que a União Européia, como a maior doadora na ajuda ao desenvolvimento, seria responsável pela diminuição de desigualdades é, neste contexto, insatisfatória.
Enquanto a UE não levar a sério a atitude crítica de países como Argentina, Bolívia e Equador em relação ao livre comércio e as organizações financeiras internacionais, o diálogo entre a Europa e a América Latina continuará sem resultados concretos.
Tomara que a chanceler federal encontre tempo, durante o encontro de cúpula em Lima, para conversas com representantes destes países, pois suas conversas políticas posteriores com os governos conservadores da Colômbia e do México não deverão ser caracterizadas por discussões controversas.
O fato de a viagem da chanceler federal à América Latina só ter chamado a atenção do grande público alemão após as desrespeitosas e burras declarações de Hugo Chávez é algo que fala, realmente, por si. (ca)
Mirjam Gehrke é redatora do programa em alemão da DW-RADIO especializada em América Latina.