Opinião: Governo impediu que China virasse segundo Brasil
A diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, definiu bem a situação da China na semana passada: segundo ela, é "normal" que a economia do país cresça pouco no momento. Na China, prosseguiu, está em curso uma grande transformação – "uma transformação para um crescimento duradouro". O panorama, como definiu Lagarde, é "difícil, mas administrável".
Com a declaração, a chefe do FMI deu apoio ao rumo tomado pela China, mas, ao mesmo tempo, alertou para um excesso de euforia. Isso porque os mercados internacionais, sedentos por notícias positivas, podem supervalorizá-las, da mesma forma que fizeram com as notícias ruins do segundo semestre do ano passado. Os mercados olham nervosos para os dois lados, em parte porque estão inflados com dinheiro barato.
Sem dúvida, há motivo para alegria. Na semana passada, o governo divulgou que em março as exportações na segunda maior economia do mundo cresceram 18,7% em relação ao mesmo mês de 2015. Da mesma forma, aumenta significativamente o interesse dos investidores estrangeiros na China: os investimentos provenientes do exterior avançaram 3,4% no primeiro trimestre do ano, para cerca de 30 bilhões de euros – definitivamente, fuga significa outra coisa.
No campo da política monetária, a situação parece se acalmar, uma vez que, nos últimos meses, Pequim não precisou utilizar seus fundos de reserva para estabilizar o yuan. Pelo contrário: pela primeira vez em mais de meio ano, as reservas voltaram a crescer, aumentando em 10,3 bilhões em março, para 3,21 trilhões de dólares.
Isso não significa, porém, uma volta automática da China ao velho caminho do crescimento. Até mesmo uma comissão de especialistas do governo chinês admitiu que o crescimento de 6,7%, registrado no primeiro trimestre deste ano, pode ser passageiro. Segundo eles, nos próximos anos, os números não devem se segurar nesse patamar.
O FMI prevê um crescimento de 6,5% para 2016 e de 6,2% em 2017. Isso, no entanto, diz pouco sobre a força da economia chinesa. A economia americana, por exemplo, teve pela última vez uma expansão acima de 7% em 1984. E esbanjou força durante outros 25 anos, até perder temporariamente o fôlego em 2008.
A pergunta-chave agora é o quão rápido Pequim conseguirá remodelar sua economia. Isso significa, entre outras coisas: mais serviço, mais classe média, mais comércio interno. Em busca disso, o governo, como mostram as novas cifras, voltou a pôr em marcha um recurso clássico para a conjuntura e, de forma pontual e no momento certo, colocou a enfraquecida economia nos trilhos. E isso sem usar todos os recursos que tinha em mãos.
A economia chinesa continua, porém, numa fase difícil: sobrecarga na indústria pesada, alto endividamento nas empresas, e companhias estatais necessitadas de mudanças – muitas reformas que estão associadas umas às outras.
Mas isso é sorte e azar ao mesmo tempo. Porque, assim, um problema específico não faz rachar toda a conjuntura, que é garantida por setores fortes, compensando as fraquezas. Mesmo em tempos de números pobres na economia, houve setores fortes – como o consumo. Se não fosse assim, o grande estouro já teria acontecido há muito tempo. Se não fosse assim, a China seria um segundo Brasil.
O jornalista Frank Sierens é colunista da redação alemã da DW e vive há 20 anos em Pequim