Tome-se como exemplo o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan. Quanto mais tempo ele fica no poder, mais vocifera, comparando a Alemanha atual, democrática e proba, à Alemanha do tempo do nazismo. A chanceler federal Angela Merkel responde a arroubos como esse de forma clara e objetiva. Ela também não se deixa provocar quando líderes poloneses falam em "ditames alemães". E nem pisca quando o presidente da Rússia, Vladimir Putin, diz que as sanções ocidentais são injustas. "Ele vive numa realidade própria", constata.
Agora é a vez de Donald Trump. E olhe que não foi pouco o que ele disse dela nos últimos meses! Merkel está destruindo a Alemanha, afirmou. Trump previu revoltas no país, disse que os amigos alemães dele estavam tão horrorizados com a política migratória de Merkel que cogitavam deixar a Europa. Mas Merkel sabe lidar com isso também: laconicamente, ela comunicou que se alegra com o encontro. As críticas de Trump ricocheteiam. A chanceler federal reduziu tanto as expectativas em relação ao encontro que muitas pessoas já acham que, se houver um aperto de mãos diante da Casa Branca, já terá sido um sucesso.
Ou seja, Merkel mantém a objetividade também antes da visita aos EUA. Há muita coisa em jogo. Uma guerra comercial entre a União Europeia e os Estados Unidos teria enormes consequências para a economia mundial. O enfraquecimento da Otan e o isolamento dos Estados Unidos seriam o fim da ordem mundial atual, com consequências imprevisíveis.
Se os Estados Unidos abandonarem o acordo climático de Paris, o resultado seriam morte e miséria na África. Renunciar a valores comuns acabaria com a credibilidade do Ocidente. Trump pode até desejar o colapso da União Europeia, mas Merkel defenderá o projeto europeu com ainda mais determinação. E vai se impor. Um dos pontos fortes dela é que ainda há muitos que a subestimam.
Tornar o mundo um lugar melhor – como os americanos gostam de dizer, de forma meio ridícula – é algo que Merkel também quer. Mas ela evita a pompa, não gosta de exageros e não se apresenta como a anti-Trump. Ela integra em vez de excluir. Ela é a inquestionável líder da Europa porque não reclama essa liderança. Ela não conhece a megalomania. Ela nunca diz algo impensado.
No encontro entre os dois, os observadores estarão focados em Trump. Ele vai novamente dizer algo sem pensar? Ele saberá negociar sem ameaçar? Ele saberá representar os Estados Unidos de forma digna? E se Trump cometer uma gafe, Merkel vai fazer de conta que não ouviu. Trump, afinal, não é o primeiro caso complicado que ela precisa enfrentar.