Na internet, não existe "pílula do dia seguinte"
13 de maio de 2014A sentença da Corte Europeia de Justiça foi surpreendente. Primeiro porque, em junho do ano passado, o advogado-geral do tribunal, Niilo Jääskinen, já havia interpretado que as diretivas de proteção de dados da União Europeia, do ano de 1995, não contemplavam o chamado "direito de ser esquecido". Quando se busca no Google o nome de Jääskinens, seu parecer surge bem alto nos resultados listados.
A sentença é surpreendente também porque força o Google a ouvir os pedidos dos usuários para que determinadas informações sejam apagadas. Até aqui, a gigante da internet podia argumentar com a neutralidade dos seus algoritmos – o que agora parece passado.
Mas não convém festejar a sentença da corte, que atingiu os tentáculos da Google, uma empresa que vive da venda de publicidade. Pois, com a decisão, apenas o portador das supostas más notícias – ou seja, a ferramenta que fornece o resultado de uma busca – está sendo responsabilizado.
O material que originou a ação judicial de um cidadão espanhol – um artigo de jornal de 1998 – pode continuar na rede. E, com isso, o "direito de ser esquecido" continua sendo uma questão frágil. A sentença não é, absolutamente, uma carta branca e, de forma alguma, uma "pílula do dia seguinte" para o mundo digital. Ela não pode ser entendida como uma borracha com a qual o usuário pode apagar conteúdo sobre ele.
Isso seria ir por um caminho totalmente errado. Continua sendo conveniente pensar bem antes de publicar informações sobre si mesmo na internet. A frase "depois eu posso pedir ao Google que apague" não pode se tornar um chavão ao qual se recorre quando, por exemplo, uma selfie embaraçosa for postada. A internet não esquece – nem depois dessa sentença da corte europeia. Continuará sendo possível encontrar conteúdos desagradáveis na rede – alguns pelas redes sociais.
E isso é bom. Pois ninguém quer que um político possa apagar resultados desagradáveis na busca do Google porque se encontra em campanha eleitoral. Em sua sentença, a própria corte europeia destacou "o papel da pessoa afetada na vida pública" e "o predominante interesse do público em ter acesso a essa informação" como critério para uma decisão futura contra o direito de apagar o resultado de uma busca.
Nada garante, porém, que no futuro tribunais tenham que decidir se cabelos tingidos ou uma companhia atraente são algo de interesse público, no caso de pessoas conhecidas.
A sentença é, em todo caso, um bom ponto de partida para um debate: sobre o que publicamos na internet; sobre o que acontece com nossos dados; sobre quem pode ter acesso a eles e quem pode ganhar dinheiro com eles. E serve como lembrete de que nossa jurisdição continua correndo atrás da realidade.