Um ano de Evo Morales
22 de janeiro de 2007Evo Morales, o primeiro presidente indígena da Bolívia eleito democraticamente, fracassou. Há muitas provas para esta tese, mas ela é falsa. Evo Morales é um populista de esquerda. Também para esta afirmação é possível encontrar argumentos, mas ela igualmente não é verdadeira. Com certeza, ele não é o monstro pintado pelo governo norte-americano.
Quem analisa o primeiro ano de governo de Morales precisa vê-lo como um todo. Quem pinçar apenas sintomas isolados fará um diagnóstico errado. Quem quiser acentuar o fracasso desse governo pode, por exemplo, destacar o conflito entre as províncias ricas da planície Oriental e as pobres do altiplano. Esse conflito se agravou nos últimos tempos – houve mortos e feridos. A planície pede mais autonomia, o que Morales e seus adeptos rejeitam.
Retórica radical
Com declarações precipitadas e carregadas de ideologia, Morales e sua equipe contribuíram para que as forças radicais passassem a dar o tom no conflito regional. De um lado está a ala radical do MAS, o Movimento ao Socialismo liderado por Morales. Seus porta-vozes dizem que, "após os 500 anos de exploração pela oligarquia", querem transformar o país o quanto antes possível, com o "pé-de-cabra revolucionário", sem considerar as regras democráticas e possíveis prejuízos.
Do outro lado estão os representantes radicais da "oligarquia", ricos empresários e latifundiários, descendentes brancos dos colonizadores. Eles aproveitam cada falha de Morales para criar um clima adverso ao presidente no país e no exterior. Ameaçam abertamente com uma guerra civil, caso Morales não respeite seus privilégios.
Novo uso dos recursos
Mas há também uma leitura positiva do governo Morales. Quem quiser exaltá-lo como salvador da pátria, pode argumentar que ele devolveu a dignidade aos indígenas. O aymará Morales continua gozando de apoio irrestrito da população marginalizada durante séculos. Noventa por cento dos bolivianos – portanto, entre eles também adversários de Morales – consideram positivo o reordenamento do setor do gás natural.
Com muita habilidade, o presidente e sua equipe conseguiram arrancar novos contratos das empresas energéticas atuantes no país, de forma que o Estado boliviano passa a ter fartas receitas com a venda do gás. Graças ao alto preço do produto, naturalmente as empresas também continuam lucrando. Mas as advertências de analistas e empresas multinacionais de que Morales estava enxotando os investidores estrangeiros foram infundadas. Nenhuma empresa abandonou o país.
Há, portanto, dois lados da moeda na avaliação do primeiro ano de governo de Evo Morales. Até mesmo seus adversários concordam que não há alternativa a ele. Uma derrubada de seu governo desencadearia um incêndio que levaria o país definitivamente à falência.
Busca de interesses comuns
Morales ainda tem a chance de conduzir o país a um futuro pacífico. Para isso, no entanto, ele precisa se comportar como um presidente e não como um furioso líder sindical. Precisa conquistar os moderados que existem entre seus seguidores e adversários. Um passo seria obrigar a ala radical do MAS a fazer concessões na bloqueada Assembléia Nacional Constituinte.
Com certeza, fazer concessões é algo difícil para Morales, uma vez que ele mesmo foi um arrojado reivindicador cocalero e radical líder sindical. Mas ele não tem escolha. Morales está diante do grande desafio de mostrar aos grupos inimigos que ambos têm interesses comuns. Somente se todas as forças puderem participar do processo político, o país conseguirá romper a espiral da violência.
Steffen Leidel é repórter da redação alemã da DW-WORLD. Ele é autor de reportagens sobre a Bolívia para o especial "América Latina" da DW-WORLD.