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Protestos de negacionistas não devem ser proibidos

3 de agosto de 2020

Protestos absurdos contra as medidas de contenção do coronavírus podem ser irritantes, mas não motivo para cercear a liberdade de reunião. Agir assim seria fazer o jogo dos inimigos da democracia, opina Marcel Fürstenau.

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Deutschland Demonstration gegen Corona-Maßnahmen in Berlin
Foto: AFP/J. MacDougall

Nada de máscaras, nem de distanciamento: a manifestação em Berlim contra as restrições para o combate ao coronavírus, no último sábado (01/08) foi uma provocação direcionada; um atentado contra a sensatez de uma sociedade majoritariamente solidária que há meses resiste à pandemia unindo forças.

A esmagadora maioria dos que vivem na Alemanha acata as restrições com maior ou menor entusiasmo, por estar segura de que só assim se vencerá a luta contra o vírus, no longo prazo. A recompensa por tamanha paciência e senso comunitário são os números impressionantemente baixos de infecções e óbitos por covid-19 do país, na comparação mundial.

Tais êxitos também possibilitaram amplas flexibilizações: há muito, bares e restaurantes reabriram; cinemas e concertos despertaram de seus sonos mágicos; viagens não estão mais proibidas; nas escolas voltaram as aulas. Tudo isso faz parecer ainda mais absurdo e inquietante o protesto deste fim de semana.

Ao que tudo indica, a maioria dos que lá se amontoaram só se importava e se importa consigo mesma. Por mais distintos que sejam suas origens e motivos, seu comportamento egoísta os une: nada de consideração, nada de discernimento, nada de responsabilidade. O slogan da manifestação já diz tudo: "O fim da pandemia – Dia da liberdade". Difícil imaginar maior ignorância e estupidez.

É bom que, apesar disso, esse grotesco protesto tenha se realizado. Menos bom é, como por automatismo, voltar-se a discutir sobre uma restrição da liberdade de reunião. Uma interdição a passeatas desse tipo daria aos participantes aquilo que lhes falta: um bom argumento: "Vejam só, o Estado cerceia nosso direito fundamental de liberdade de opinião e reunião!"

Berlim: extremistas protestam contra restrições por covid-19

Do jeito que foi, fica provado o contrário: esse Estado, essa democracia, tão obviamente desprezados na manifestação, deixaram o protesto se esvaziar por si só. Não haveria forma melhor de esse povinho bizarro, vindo de toda a Alemanha, se autodesmascarar e se submeter ao ridículo; todo o mundo pôde ver de que lado se encontram visão abrangente e tolerância, e de qual, tacanhice e intolerância.

Apesar de toda a compreensível raiva contra os ignorantes contumazes, essa manifestação foi também um triunfo da democracia e do Estado de direito. Pois quem infringe as leis ou ignora diretrizes tem que contar com consequências. Isso ocorreu em Berlim, onde, ainda durante a manifestação, a polícia apresentou queixa criminal contra os organizadores, por descumprimento das regras de higiene. Quando, então, durante o comício que se seguiu, continuou-se a transgredir à vontade as imposições, a polícia acabou com a festa.

Portanto, o Estado é perfeitamente capaz de agir. Para alguns, pode ter parecido insuficiente ou tardio demais, diante das imagens perturbadoras e do clima em parte agressivo. Entretanto, mesmo protestos abstrusos como esse devem continuar sendo possíveis. Por vezes eles serão difíceis de suportar, mas acima de tudo constituem também a expressão de uma sociedade livre.

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Marcel Fürstenau
Marcel Fürstenau Autor e repórter de política e história contemporânea, com foco na Alemanha.