Hillary Clinton é a inegável vencedora desta Superterça. Na verdade, agora não há mais como detê-la. É grande demais o número de delegados eleitorais que ela conquistou diretamente ou que conseguiu reunir em torno de si, como superdelegados, para ainda permitir que Bernie Sanders represente concorrência séria a ela – mesmo ele tendo obtido maioria em quatro respeitáveis estados americanos.
Fazendo-se uma breve pausa em meio a toda essa loucura eleitoral, nota-se o que há de notável neste momento em que se escreve história: com grande probabilidade, os atuais resultados significam que Hillary Clinton será a primeira mulher a se apresentar como candidata num pleito presidencial nos Estados Unidos.
Há décadas ela luta incansavelmente para assumir a Casa Branca. Nenhuma humilhação foi capaz de detê-la, fossem os casos amorosos de seu marido ou reveses políticos. Ela ensina que cair do cavalo não é problema: o único erro seria ficar no chão.
Essa mulher é pura disciplina e vontade; não seria justo reduzir unicamente à fome de poder essa vontade de dar forma. Com grande continuidade, Hillary luta por suas visões de um mundo melhor e mais justo. Sem o trabalho preliminar dela, não existiria o Obama Care, o seguro de saúde para todos os americanos.
Não é preciso estar totalmente de acordo com todas as concepções políticas e pressupostos econômicos dela. Ao mesmo, este é um dia em que tal engajamento deveria receber reconhecimento. Pois, também no ano de 2016, os EUA são mais do que Donald Trump.
E isso nos leva, forçosamente, ao grande perdedor da noite, o Partido Republicano. Como já se esperava, Trump venceu em grande estilo, obtendo a dianteira em sete de 12 estados. É verdade que Ted Cruz pode conquistar pontos com a esperada vitória no Texas e a pequena surpresa de uma dianteira apertada em Oklahoma. Mas será preciso acontecer algo espantoso para que ele ainda arrebate de Trump a primeira posição.
Marco Rubio permanece abatido. E, embora muitos republicanos tenham se agarrado desesperadamente à esperança de que o senador da Flórida ainda ganhasse pontos com suas recentes investidas contra Trump, essa batalha parece decidida.
E assim, agora a situação fica extremamente delicada para os republicanos, que se autodenominam "Grand Old Party" (GOP) – o grande velho partido.
Será mesmo o caso de escolher um Donald Trump como concorrente à presidência, quando a legenda se reunir na grande convenção partidária e os delegados indicarem o candidato? Políticos prestigiados já começam a considerar, mais ou menos publicamente, a possibilidade de negar esse respaldo a Trump. Ou seja, simplesmente apresentar um outro candidato, próprio.
Porém, que noção de democracia seria essa, se os delegados dos diferentes estados não acatarem mais o voto dos eleitores e eleitoras? Por mais que sejam compreensíveis as vicissitudes do partido: quem leva eleições a sério tem que aceitar os resultados, por mais que eles doam.
Além disso, desde cedo Donald Trump já anunciou que, em caso de dúvida, ele se apresentaria como candidato independente, no pleito presidencial propriamente dito. Ou seja, sem vinculação partidária, mas tendo dado a prova de que não se deixa deter por ninguém. Nem mesmo pela própria legenda, aquela pela qual ele fez campanha eleitoral e que, a partir dessa decisão dele, possivelmente resvalaria em problemas existenciais de credibilidade. Enfim: um dilema, na mais perfeita acepção do termo.