Luta desigual
24 de junho de 2008O encarregado de segurança e política externa da União Européia (UE), Javier Solana, caracterizou as eleições zimbabueanas como uma "paródia da democracia". No entanto, não só desde o primeiro turno destas últimas eleições é que falta qualquer tom de comicidade. O Zimbábue é uma ditadura – muito séria, cega e furiosa. Que se abate sobre tudo o que há de coragem democrática e opiniões adversas no país. O desejo do povo, expresso no primeiro turno, está sendo invertido, ignorado e destruído pelas milícias de Mugabe. Desejo do povo é aquilo que Mugabe considera certo – assim se faz política no Zimbábue. E é assim que se deve entender o anúncio do autocrata Mugabe de que partirá para a guerra, caso perca as eleições contra Tsvangirai.
De fato, o regime já deu início a tal guerra desde o primeiro turno, com milícias perseguindo partidários da oposição, o próprio Tsvangirai tendo sido detido diversas vezes, seus comícios impedidos e todas as informações sobre o país cortadas, para que ninguém tenha real noção da dimensão do terror. Pelo menos 85 pessoas foram torturadas e espancadas até a morte após o primeiro turno.
Tsvangirai chamou o procedimento de Mugabe nas últimas semanas de violento e ilegítimo. E tirou as conseqüências ao anunciar que não participará do pleito.
Para o regime, é tudo muito simples: o candidato restante automaticamente continuará administrando. Business as usual no Zimbábue de Mugabe, que há quase três décadas governa o país. Isso tem que ser impedido, avaliam Europa e Estados Unidos, que querem levar o tema ao Conselho de Segurança da ONU. No entanto, dificilmente se poderia contar com uma maioria que permitisse adotar uma resolução clara. Mesmo o mediador e presidente sul-africano Thabo Mbeki – ele próprio considerado um lame duck político em seu país – fala a torto e a direito de diálogo e consenso, misturando criminosos e vítimas em sua retórica.
Este é o segundo escândalo: discretamente, os vizinhos africanos estão dando respaldo a Mugabe. A comissão mediadora sul-africana só fez com que a violência no país vizinho continuasse desenfreadamente. O caso do Zimbábue reafirma a opinião dos céticos, que há tempos argumentam que a nova África, comprometida com a democracia e o bom governo, nem existe. A nova África, preocupada em respeitar os direitos básicos através da União Africana e de métodos ambiciosos de monitoração mútua, até mesmo através de um conselho comum de paz e segurança, é – ou ao menos parece ser – uma bela quimera. Esta nova África – onde está ela no Zimbábue? Como ela legitima a democracia neste país?
Os vizinhos africanos deixam o povo zimbabueano sozinho na luta contra a tirania de Mugabe. Uma luta que é desigual demais para ser vencida apenas pelos próprios habitantes. Muitos milhões de zimbabueanos vivem no exterior e os que lá ficaram estão impotentemente expostos ao despotismo e à violência. Sem ajuda de fora, a vontade do povo não poderá prevalescer, isso é certo. É boa a sugestão do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, de adiar o pleito até que as Nações Unidas, a União Africana (UA) e a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) encontrem conjuntamente uma solução para a crise política.
Está claro também que só pode haver uma intervenção externa com o apoio dos vizinhos africanos. Afinal, só eles podem impedir que o terror de Mugabe prossiga e o povo continue a ser oprimido no Zimbábue. É hora de a nova África passar a se medir por seu próprio grau de auto-exigência e finalmente começar a agir.
Ute Schaeffer é chefe da DW-RADIO para África e Oriente Médio.