Vitória de Erdogan é derrota para opositores da islamização da Turquia
11 de agosto de 2014A escolha dos eleitores turcos, que pela primeira vez elegeram seu chefe de Estado, é clara: Recep Tayyip Erdogan ultrapassou com folga os 50% necessários para a vitória no primeiro turno. Esse resultado é democraticamente correto e, portanto, incontestável. Isso é um lado da moeda. Por outro lado, existe o temor de que a Turquia esteja a caminho de se transformar numa república islâmica, com um aumento das normas religiosas na vida cotidiana dos cidadãos.
Com a vitória de Erdogan continua a desmoronar o trabalho de reforma do fundador da república, Mustafa Kemal Atatürk. As elites kemalistas não estavam dispostas a admitir isso nos últimos anos, mas sua arrogância diante de muitos problemas, que dificultam de forma significativa a vida diária das pessoas, conduziu ao status quo político na Turquia. Foi justamente isso que permitiu ao conservador e islâmico Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP), de Erdogan, chegar ao poder em 2002, com 34% dos votos, e desde então ampliar sua popularidade de forma constante, aumentando sua quota para quase 50% nas eleições parlamentares há três anos. No final, o AKP venceu todas as eleições e agora coroou sua ascensão à esmagadora força política na Turquia com a ascensão de seu líder e chefe do governo ao posto de presidente do país.
O AKP emergiu das cinzas de quatro partidos religiosos. Estes haviam sido proibidos, entre o fim dos anos 1960 e a segunda metade da década de 1990, pelos militares e pelo Tribunal Constitucional, controlado por eles. As legendas foram consideradas "centros de atividades fundamentalistas". Com base na experiência desses partidos antecessores, Erdogan sabia exatamente quais eram os problemas que afligiam o cidadão médio, do que ele precisava e o que ele queria. Isso é algo que agora é retribuído pelos eleitores. Acima de tudo, Erdogan é recompensado nas eleições por ter dado ao povo turco uma nova autoestima, com base em valores religiosos.
Para Erdogan, pouco importa que as liberdades de imprensa e de expressão tenham sido tão severamente restringidas na Turquia que o país agora ocupa, vergonhosamente, os últimos nas comparações internacionais. E seus seguidores também ignoram as amplas denúncias de corrupção e abuso de poder que pesam sobre Erdogan, sua família e seus colaboradores políticos, em favor da relativa prosperidade alcançada.
Erdogan foi eleito para um mandato de cinco anos. Mas mesmo agora já é possível prever que o político de 60 anos deseja permanecer pelo menos por mais um segundo mandato como chefe de Estado. Assim, entrará para a história, na celebração dos 100 anos da república, em 2023, como o homem que conseguiu reverter quase toda a obra reformista de Atatürk. É bem provável que seja instituído um novo regime, baseado num sistema presidencialista, com um Parlamento marginalizado em sua importância. Por isso é que Erdogan fala sempre da "velha" e da "nova" Turquia.
Seu rival Ekmeleddin Ihsanoglu, apoiado por 14 partidos, alcançou apenas 39% dos votos. Um sucesso moderado foi alcançado pelo político curdo Selahattin Demirtas, de 41 anos, com pouco mais de 9%. Este pode ser o sinal de que seu partido pró-curdo HDP pode conseguir pela primeira vez ultrapassar a marca de 10% nas próximas eleições parlamentares.
Mesmo que Erdogan tenha boa fama entre algumas pessoas na Turquia, sua reputação externa ainda deixa muito a desejar. Rodeado por centros de crise, como Iraque, Síria, Gaza-Israel, Ucrânia, Rússia e, recentemente, novas disputas entre o Azerbaijão e a Armênia em torno da região de Nagorno-Karabakh, Erdogan precisa aplacar o temor de que vai jogar gasolina na fogueira. Porque foi exatamente isso que ele fez em diversas ocasiões.
A UE e, especialmente, a Alemanha, terão que continuar lidando com um Erdogan cada vez mais desconfortável. A aventura da Turquia em direção a uma candidatura à UE está chegando inexoravelmente ao fim, sem sucesso. Isso não significa o fim do mundo, mas as possibilidades de influência da União Europeia sobre os acontecimentos na Turquia devem se tornar cada vez menores. Se isso é bom para os interesses dos europeus na região, é algo que pode ser questionado.