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Os deuses exilados de Verger

Rodrigo Rimon4 de setembro de 2004

Exposição em Berlim reúne 300 fotos do francês Pierre Verger e uma instalação multimídia do brasileiro Mário Cravo Neto. As fotos, exibidas pela primeira vez na Alemanha, documentam a herança da cultura afro-brasileira.

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Fotos viajarão pela Europa até 2006Foto: AP

Tudo começou com um ritual do babalorixá Balbino Daniel de Paula: foi ele quem fez o Ministro brasileiro da Cultura, Gilberto Gil, ajoelhar no Museu Etnológico de Berlim durante a abertura da exposição Deuses Negros no Exílio. Um pouco de cachaça, um punhado de terra para substituir o chão de madeira do museu e um ritual de candomblé convocaram o fotógrafo francês Pierre Verger, falecido em 1996 em Salvador, ao recinto do museu.

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Filha de santo em transe durante ritual em Salvador, 1950Foto: Pierre F. Verger

Foi assim que o próprio Verger, presente em espírito, pôde agradecer e propor um brinde aos organizadores de sua mostra na Alemanha, os alemães Michael Thoss, do Instituto Goethe, e Manfred Metzner, da editora Wunderhorn, responsável pela publicação do catálogo. E os primeiros visitantes puderam vivenciar um pouco da crença, à qual Pierre Verger – rebatizado Pierre Fatumbi Verger em uma cerimônia na África em 1953 – dedicou sua obra.

São mais de 300 imagens expostas em três salas, através das quais Verger buscou documentar a herança cultural afro-brasileira e as práticas religiosas da América negra e da África. São fotos recolhidas ao longo de cinco décadas, hoje arquivadas pela Fundação Pierre Verger, de Salvador, que o próprio fotógrafo fundou em 1989 e presidiu até sua morte.

Verger: um descobrimento tardio

"Verger é um fotógrafo excepcional, totalmente desconhecido na Europa, que tinha uma postura crítica à etnologia de seu tempo", explica Michael Thoss, do Instituto Goethe.

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Capoeira em Salvador, 1946-1948Foto: Pierre F. Verger

O reconhecimento da mídia alemã reflete sua importância. Segundo o jornal Berliner Zeitung, "como mediador entre culturas, Verger contribuiu enormemente com sua documentação à etnologia pós-colonial". O Berliner Morgenpost chamou a mostra de "tardio descobrimento de um fotógrafo internacional, cujas lentes testemunham não uma distância etnológica, mas empatia e conhecimento". Um pouco mais modesto foi o jornal Tagesspiegel: mesmo que suas fotos não sejam tecnicamente comparáveis às de Cartier Bresson ou Robert Capa, seu caráter documentário faz sua obra ser única.

Segundo o atual presidente da fundação, Gilberto Sá, "nenhum fotógrafo conseguiu captar mais dignidade humana do que Verger. Você não tem pena nenhuma das pessoas mostradas nas fotos, como acontece em Sebastião Salgado, por exemplo", disse Sá à DW-WORLD.

Cravo Neto: outra técnica

Schwarze Götter im Exil Mario Cravo Neto
Fotos da instalação de Mário Cravo NetoFoto: Mario Cravo Neto

As 160 fotos que compõem a instalação multimídia Trance_Territories, do baiano Mário Cravo Neto, paralela à exposição, são uma homenagem a Verger. "Cravo Neto o conhecia desde criança, pois Verger freqüentava a casa de seu pai. Foi provavelmente ele quem introduziu Neto ao mundo da fotografia", conta Thoss.

Mas, para Gilberto Sá, a obra de Cravo Neto não é apenas a continuidade da iniciada por Verger. "Cravo Neto domina um aparato técnico moderno que nem existia na época de Verger", argumenta.

A mostra poderá ser visitada até 7 de novembro no Museu Etnológico de Berlim, de onde seguirá, até 2006, para Frankfurt, Stuttgart, Munique, Leipzig, Bremen e Paris.