Os paralelos entre China e Egito antigos
14 de julho de 2017"Cola" , plágio, espionagem industrial em grande estilo: há muitos motivos para dois resultados serem espantosamente semelhantes. Mas, e quando dois objetos são inexplicavelmente semelhantes, sem que se trate de nenhum desses casos, quando dois inventores chegaram à mesma ideia, quase ao mesmo tempo?
Em exemplo é o bridão, a parte da rédea que fica na boca do cavalo: um bocado alongado de bronze, mantido flexível no centro por dois elos ligados entre si, permitindo puxá-lo para a direita e a esquerda, e assim conduzir o animal.
Essa invenção tão decisiva se encontra logo duas vezes na mostra especial China e Egito: Berços do mundo, que pode ser visitada até 3 de dezembro no Novo Museu (Neues Museum) de Berlim. Uma é originária no Egito, por volta de 1200 a.C., a outra na China, um pouco mais tarde. Certo está que, neste caso, ninguém "colou" do outro, já que em seus primórdios essas duas altas culturas não tiveram qualquer contato.
Respostas semelhantes para desafios humanos
Na época, era comum comerciantes cobrirem distâncias de até 3 mil quilômetros em suas viagens, porém os 8 mil quilômetros que separavam o Egito da China eram um obstáculo intransponível.
No entanto as duas primeiras civilizações avançadas da história da humanidade apresentam surpreendentes similaridades, não só no quotidiano e nos objetos de uso, como também, por exemplo, nos cultos funerários e em suas noções religiosas.
Para Friederike Seyfried, responsável pela exposição, juntamente com a curadora Mariana Jung, a explicação é simples: "Quem deseja um teto firme sobre a cabeça, e também roupas que protejam e enfeitem vai acabar chegado em algum momento às mesmas soluções."
Assim, chineses e egípcios em algum momento inventaram a agulha, experimentando inicialmente com espinhas de peixe, raques de penas ou ossinhos. Da mesma forma, os indivíduos desenvolveram respostas e noções de divindade para questões abstratas, como "o que acontece após a morte".
Quase 5 mil anos e 8 mil quilômetros de distância
Friederike Seyfried é diretora do Museu Egípcio e da Coleção de Papiros de Berlim, de onde provém aproximadamente a metade das peças expostas na mostra especial. A outra metade são empréstimos do Museu de Xangai, com o qual os museus estatais da capital alemã mantêm cooperação.
Partiu de ambas as casas a ideia e o desejo de realizar essa inusitada e bem-sucedida justaposição, cobrindo de 4500 a.C. até a Antiguidade Greco-Romana, por volta de 300 d.C.. Em vez de ordenadas cronologicamente, porém, as peças são apresentadas em cinco grupos temáticos: Quotidiano, Escrita, Domínio e administração, Culto dos mortos e Céu divino.
Afinal, o que torna tão excitante essa exposição, é a questão cultural-antropológica que ela propõe: como se desenvolve a cultura humana? E a que soluções chegam os seres humanos diante de determinados desafios?
Unidos pela necessidade, separados pelos materiais
Modelos de terracota, numa das primeiras vitrinas, mostram como a estrutura das moradias simples do Egito se assemelhava às da China. Ambos também adotaram desde cedo os cães como animais de estimação.
Estátuas, joias, potes para cosméticos e peças de cerâmica igualmente contam sobre a vida no dia a dia dessas duas culturas. E seus artefatos de higiene pessoal, por exemplo, não eram muito diferentes: sempre um conjunto formado por um jarro com alça e uma bacia. Só o tipo de decoração nos recipientes de bronze revela as diferentes assinaturas culturais: no Egito as delicadas cinzeladuras só eram aplicadas após a fundição.
Dependentes das matérias primas à disposição, ambas se distinguiam, ainda, no tocante aos materiais empregados. Além do bronze, objetos de luxo típicos para os chineses eram vasilhas laqueadas. No Egito, em contrapartida, onde não existiam as árvores produtoras da resina da laca, o vidro era a acepção do luxo, como testemunham os recipientes de vidro opaco para guardar óleos e perfumes, com mais de 3.500 anos de existência.
Semelhanças entre os usos funerários
O culto aos mortos compõe uma das seções mais interessantes da mostra, pois ambas as sociedades desenvolveram rituais e práticas se sepultamento complexos, como mostram as preciosas oferendas funerárias.
Uma das mais impressionantes entre as peças cedidas por Xangai é a vestimenta de jade com que um certo Liu He foi solenemente sepultado, durante a Dinastia Han Ocidental (século 206 a.C. ao 9º d.C.). O traje prateado com reflexos verdes, confeccionado com 2.216 plaquinhas do mineral translúcido unidas com fios de prata, é como uma armadura para proteger o corpo e a alma do morto no além. Para os chineses, o jade era a pedra da imortalidade.
A peça é confrontada com a múmia da egípcia Nes-Chons-pa-cheret, morta mais de sete séculos antes. Aqui, o invólucro artisticamente decorado com divindades aladas visava oferecer proteção para o corpo mumificado e preservá-lo para a eternidade.
A mostra China und Ägypten. Wiegen der Welt (China e Egito: Berços do mundo), no Neues Museum de Berlim, exibe, de 6 de julho a 3 de dezembro de 2017, peças da Antiguidade no Egito e na China, muitas das quais pela primeira vez na Europa.