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Pandemia impulsiona demanda por cães e gatos na Alemanha

27 de janeiro de 2021

Preços de animais de estimação disparam na internet, enquanto abrigos e criadores relatam enxurrada de pedidos. Mas esse boom pode ter impactos negativos.

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Filhotes de labrador na grama
Pandemia de coronavírus está impulsionando o comércio de filhotes na AlemanhaFoto: Roger Tidman/imageBROKER/FLPA/picture alliance

Quando Bernadette Dierks-Meyer anunciou a chegada iminente de uma nova ninhada no seu site Labrador Club, da Alemanha, a criadora de cães não tinha ideia do que vinha pela frente. Ela esperava cerca de dez pedidos, como geralmente ocorre. Em poucos dias, porém, Dierks-Meyer foi bombardeada com ofertas pelos filhotes – que, aliás, ainda nem nasceram.

"Já recebi mais de 60 pedidos", conta Dierks-Meyer à DW. "Felizmente, não divulguei o número do meu telefone, senão poderia estar recebendo ligações até no meio da noite. E eu sei de criadores que recebem muito mais pedidos".

Cães que detectam coronavírus ainda encontram resistência

Com a pandemia de covid-19, os alemães descobriram seu amor pelos animais. A demanda por cachorros e gatos – os favoritos tradicionalmente – aumentou no país. Mesmo antes do início da pandemia, uma em cada quatro famílias alemãs tinha um gato e uma em cada cinco possuía um cão. 

Agora, em tempos de lockdown e restrições de contatos, as pessoas estão solitárias e muitas das que estão de licença ou trabalhando em casa têm mais tempo para cuidar de um animal de estimação. A procura por uma companhia de quatro patas aumentou imensamente. De acordo com a Associação Alemã de Cães (VDH), em 2020 foram comercializados cerca de 20% mais cachorros do que em anos anteriores.

Um abraço em tempos solitários de covid-19

"Talvez seja a necessidade de um parceiro", opina Dierks-Meyer sobre o aumento da demanda. Aficionada por labradores e com um porão repleto de troféus de competições esportivas nacionais e internacionais de cães, ela recebe atualmente pilhas de pedidos nos quais os remetentes contam toda história familiar e se queixam sobre o falecimento do amigo de quatro patas. "São relatos muito, muito simpáticos", diz ela. "Mas eu não posso dar um cachorro a todos eles. Eu não tenho tantos filhotes assim."

Formada em medicina veterinária, Dierks-Meyer cobra 1,5 mil euros (cerca de R$ 9,8 mil) por filhote – preço relativamente baixo para cães com pedigree. Para aqueles que, ao contrário da criadora, não seguem as rígidas diretrizes oficiais (duas ninhadas em dois anos) e veem apenas um negócio lucrativo nos animais, a pandemia trouxe tempos áureos. Já, para alguns animais, os tempos são sombrios.

Julia Zerwas conhece muitas histórias de animais sem finais felizes. E é isso que a move. Após abandonar o curso de medicina veterinária em Munique, voltou para Bonn, e há dez anos trabalha no abrigo de animais Albert Schweitzer.

Labrador Retriever preto brinca na grama.
Dierks-Meyer cobra 1,5 mil euros por cada labradorFoto: SANDRA FOTODESIGN/imago images

"Outro dia, tivemos um caso de devolução de um animal porque ele não havia se adaptado na casa de quem o adotou após três dias", conta Zerwas. Nos abrigos, há um temor de que muitos animais acabem por lá assim que a pandemia passar e alguns dos novos donos se cansarem do novo hobby.

Cerca de 48 cães, 52 gatos e 175 pequenos animais vivem no abrigo localizado nos arredores de uma rodovia em Bonn, inclusive cobras, lagartos e pombos. Pode-se dizer que Zerwas e seus 20 colegas atuam no tratamento intensivo de animais de estimação: quando nada mais resolve, lá estão eles.

Cachorro, gato ou serpente?

Seja uma chamada de emergência na região de Eifel, quando 125 cães foram descobertos em uma única casa, ou 100 hamsters que de repente precisam de um novo lar ao mesmo tempo, ou um cachorro que acabou abandonado no abrigo depois que 13 proprietários desistiram dele – Zerwas está acostumada a tornar o impossível possível, mas a pandemia trouxe novos e enormes desafios.

"Tivemos que limitar enormemente o acesso do público e agora permitimos apenas visitas com hora marcada. Isso significa, é claro, que encontramos novos lares para um número menor animais. Ao mesmo tempo, os pedidos cresceram drasticamente", conta Zerwas.

A situação financeira do abrigo também é motivo de preocupação. "Os visitantes sempre deixavam uma doação, e agora estamos sentindo falta desse dinheiro. Por conta disso, recentemente tivemos que lançar um novo apelo".

Julia Zerwas ao lado de cachorro no abrigo de animais Albert Schweitzer, em Bonn, na Alemanha
Julia Zerwas atua no abrigo de animais Albert Schweitzer, em BonnFoto: Oliver Pieper/DW

E qual é o conselho de Zerwas para aqueles que estão pensando em adotar um animal de estimação? "Que pensem muito sobre como será após a pandemia. Será que ainda terei tempo? E vontade? Será que um animal de estimação se encaixa na minha vida normal, ou apenas agora?"

Comércio ilegal de filhotes prospera

"Abrigos têm recebido perguntas sobre a possibilidade de se ter um cachorro por três meses, apenas durante o tempo em que os novos donos estiverem trabalhando em casa", conta Hester Pommerening, da Liga do Bem-Estar Animal da Alemanha. "E tem abrigos que receberam 500 solicitações em um único fim de semana."

Pommerening atua como uma voz para os animais, o que na Alemanha é um trabalho de tempo integral. Ela se opõe fortemente aos testes em animais e tem uma lista de demandas de reformas para a agricultura. Mas atualmente, para ela, o problema mais urgente é o comércio ilegal de cachorros.

O comércio de animais de estimação é agora considerado a terceira maior fonte de renda ilegal na União Europeia, depois do tráfico organizado de drogas e de armas. Segundo a Federação de Bem-Estar Animal alemã, entre janeiro e outubro de 2020, foram relatados 75 casos de comércio ilegal de pets, envolvendo mais de 800 animais (principalmente cães). O número de casos não denunciados é provavelmente ainda muito maior.

"O bichinho fofinho está a apenas um clique de distância. Mas estamos falando de um ser vivo que não pode ser devolvido para a loja tão facilmente quanto um suéter ou um brinquedo", diz Pommerening. E, ainda assim, a perspectiva é tão tentadora: se a procura diretamente com criadores ou em abrigos não obtiver sucesso, uma rápida olhada nos classificados do eBay é o suficiente para receber ofertas de uma enxurrada de olhares carentes.

"Mas, por trás desses anúncios, muitas vezes há animais doentes que foram separados de suas mães muito cedo, que têm comportamento perturbado ou são gerados em condições cruéis no Leste Europeu", diz Pommerening. "Muitos animais também morrem porque não recebem nenhuma vacina sequer."

Rede especializada 

A máfia dos animais de estimação na Romênia, Hungria, Sérvia e Turquia é refinada. Os anúncios dificilmente podem ser distinguidos dos de empresas respeitáveis, os preços são normais e os pedidos por escrito recebem respostas amigáveis.

No mais tardar na entrega, os clientes em potencial devem ficar atentos. "Eles costumam dar desculpas para evitar que o animal seja buscado em alguma residência e a entrega acaba sendo realizada em um estacionamento", diz a ativista. Além disso, os comerciantes ilegais muitas vezes recebem pedidos de animais exóticos, como cobras e até cangurus.

Pommerening ressalta que animais não devem ser vendidos na internet e aconselha interessados a evitar esse tipo de negócio.