'Panelaço' contra Cristina Kirchner revela divisão interna na Argentina
9 de novembro de 2012A manifestação popular da noite desta quinta-feira (08/10) foi organizada através de redes sociais e e-mails e reuniu mais de 700 mil pessoas em locais centrais do país, sobretudo nas metrópoles. Um número sem precedentes – e mais uma evidência da divisão interna na Argentina.
Os manifestantes protestam contra a corrupção generalizada, a criminalidade e a inflação no país. A população também rejeitou uma possível reeleição da presidente Cristina Kirchner. Com um “panelaço” e agitando bandeiras, milhares de pessoas gritavam: "Sim à democracia, não à reeleição".
Cristina Kirchner, do partido de centro-esquerda, foi eleita a primeira mulher presidente da Argentina. Tomou posse em 2007 e foi reeleita no ano passado para o segundo mandato, com 54% dos votos. No poder, ela sucedeu seu marido, Néstor Kirchner, que morreu de um ataque cardíaco em 2010.
Pela Constituição, Kirchner não pode concorrer a um terceiro mandato em 2015, mas seus partidários no Congresso já falam em uma emenda constitucional. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Instituto Management & Fit, 80% dos argentinos se opõem a tal alteração.
Sociedade dividida
Uma parte da população louva quase diariamente as supostas boas ações do governo. Entre elas estão a estatização do maior conglomerado petrolífero do país e a proteção da própria economia contra a concorrência estrangeira.
Outra parte participa dos "panelaços" – ou cacerolazos –, batendo frigideiras e panelas diante do palácio presidencial, num protesto veemente contra o populismo, a corrupção e o dirigismo estatal. Muitos, como o escritor e jornalista Marcelo Birmajer, veem as liberdades civis em perigo.
"Quis participar [dos protestos] pois acredito que o governo esteja atentando contra a liberdade de expressão. Eu trabalho também para jornais, portanto também vivo da liberdade de opinião. Preciso dela para viver."
Ameaça e difamação
Apenas uns poucos entre os participantes dos "panelaços" têm coragem de dar entrevistas. Eles temem as investidas da imprensa ligada ao governo. Com razão, comenta Birmajer.
"Você é atacado nos discursos da presidente, que são transmitidos para todo o país. Eles mandam para cima de você a Afip, a polícia fiscal. A mídia deles te ridiculariza. É claro que isso dá medo."
Quem critica as autoridades ou a política governamental é declarado inimigo da Argentina. Membros do governo difamam os manifestantes como extremistas de direita, egoístas e reacionários.
Nas redes sociais trava-se um inflamado embate entre adeptos e adversários do governo. A presidente Cristina Fernández de Kirchner declarou recentemente, num discurso: "Só se precisa temer a Deus. E a mim, um pouquinho". O que para os próprios pode soar como retórica confiante, mas para muitos argentinos significa uma ameaça.
Temor pela democracia
Muitos cidadãos consideram especialmente antidemocráticas medidas como as restrições à aquisição de dólares americanos. Eles se sentem inseguros, não confiam no peso argentino. Há um bom tempo, o dólar tornou-se a moeda-base tanto para poupanças como para negócios imobiliários.
Segundo o governo, os protestos são manipulados pela oposição. Os manifestantes rechaçam a acusação e declaram-se independentes, do ponto de vista partidário. Na opinião do autor Marcelo Birmajer, a oposição nem tem meios de instrumentalizar as passeatas em favor próprio.
"Não vejo nenhum oposicionista que conte com uma base ampla de apoio entre a população. Sem dúvida, há várias lideranças, mas no momento ninguém está em condições de catalizar os interesses da massa e iniciar uma mudança."
Autor: Marc Koch, de Buenos Aires (av/afn)
Revisão: Francis França