Papa Francisco pede mais solidariedade à luta contra a fome
20 de novembro de 2014Na Conferência Internacional sobre Nutrição (ICN2) da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o papa Francisco pediu mais solidariedade e ações concretas no combate à fome mundial. Segundo o pontífice, é "obrigação moral compartilhar a riqueza econômica com o mundo". O discurso, realizado nesta quinta-feira (20/11) em Roma, foi aplaudido de pé pelas autoridades presentes.
"Nossas sociedades são caracterizadas por um crescente individualismo e por uma cisão", disse o argentino aos delegados de 170 países. Isso faz com que os mais fracos sejam privados de uma vida digna, prosseguiu.
Apesar dos avanços, "o número de pessoas que sofrem de fome e desnutrição segue inaceitavelmente alto", afirmou o pontífice. Ele considera viável a exigência de reduzir a fome mundial pela metade. "Não temos um problema de calorias. Nós temos um problema de produção, abastecimento e organização", definiu.
Segundo o papa, os desafios hoje são a falta de solidariedade e de uma distribuição justa dos recursos no mundo. Ele também falou numa crescente desconfiança entre países e entre cidadãos. "Qualquer um, a quem falta o pão de cada dia e um trabalho decente, sabe bem disso", disse. Francisco salientou ainda que os mendigos nas ruas, resguardados de seu direito civil por uma alimentação saudável, pedem dignidade, e não esmolas.
O papa reconheceu que a comunidade internacional deu muito pouca atenção ao tema no passado. Em sua primeira visita a uma agência da ONU, ele também renovou sua crítica ao capitalismo. Segundo ele, o combate à fome e a desnutrição é dificultada pelo mercado, que é gerido pela premissa primária de lucro. Os alimentos foram degradados a uma mercadoria como outra qualquer, que também se transformou em objeto de especulação financeira, reclamou o líder da Igreja Católica.
Francisco citou ainda o papa João Paulo 2º, que, na Cúpula Mundial de Alimentação de 1992, também em Roma, advertiu para um "paradoxo da abundância". "Há comida suficiente para todos, mas nem todos podem comer", disse então o pontífice polonês. Há desperdício, consumo excessivo e a utilização de alimentos para outros fins. "Infelizmente, esse 'paradoxo' segue sendo atual", lamentou Francisco.
Medidas contra a fome precisam levar em conta a produção e o acesso aos alimentos, além da mudança climática e do comércio agrícola. "Mas a primeira preocupação precisa ser o próprio ser humano. Todos aqueles que sofrem com a falta de alimentação diária", pediu o papa.
Além disso, o tema da fome está envolto em corrupção, manipulações e desinformações que precisam ser superadas, disse.
Francisco também chamou a atenção para a preservação ambiental. "Deus perdoa sempre; as pessoas, às vezes; mas a natureza, nunca. Precisamos nos preocupar com o meio ambiente, senão ele reage com destruição."
A conferência em Roma, que tem convidados ilustres como a rainha Letizia da Espanha, o economista americano Jeffrey Sachs e Melinda Gates, esposa do fundador da Microsoft, vai decorrer até esta sexta-feira. No primeiro dia, quarta-feira, os participantes acordaram uma declaração internacional que prevê o acesso seguro e suficiente a alimentos nutritivos para todas as pessoas do mundo. De acordo com dados da ONU, cerca de 805 milhões de pessoas não têm o suficiente para comer.
Obesidade também é sinal de má nutrição
Em conjunto com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a FAO lançou nesta quinta-feira uma campanha contra a obesidade e por uma conscientização de uma nutrição mais saudável e sustentável.
"Parte de nosso desequilibrado mundo ainda morre de fome, e a outra parte come até atingir a obesidade", alertou a diretora-geral da OMS, Margaret Chan.
"O sistema alimentar não funciona mais devido à dependência que existe da produção industrial, que é cada vez mais barata e pior para a saúde. É necessário pedir que sejam preparados pratos menos gordurosos, menos doces, menos salgados, mais equilibrados", disse Chan.
Má nutrição não está, portanto, relacionada apenas à fome. Cerca de 2 bilhões de pessoas sofrem com a falta de nutrientes, como vitamina A, zinco e ferro – enquanto aproximadamente 500 milhões de adultos e 42 milhões de crianças sofrem de obesidade.
PV/dpa/epd