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Papa teve maior enterro da história da Igreja

Geraldo Hoffmann8 de abril de 2005

Funeral de João Paulo 2º reuniu milhões de fiéis e mais de 200 representantes de governos. Roma armou maior esquema de segurança da história. Cardeal alemão Ratzinger celebrou missa campal no Vaticano.

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Cardeal alemão Ratzinger (e)observa retirada do caixão após missaFoto: AP

Cerca de quatro milhões de pessoas (segundo estimativas da polícia italiana) reunidas nas praças de Roma – 300 mil na Praça de São Pedro – e mais de um bilhão de telespectadores em todo o mundo assistiram ao enterro do papa João Paulo 2º, nesta sexta-feira (08/04). Na Alemanha, milhares de pessoas acompanharam o enterro diante de telões instalados em Igrejas.

Foi o maior funeral da história da Igreja Católica. A cerimônia fúnebre também foi uma espécie de encontro de cúpula de representantes de 138 países que mantêm relações diplomáticas com o Vaticano.

A missa de corpo presente foi celebrada pelo cardeal alemão Joseph Ratzinger, um dos favoritos para suceder João Paulo 2º, diante dos estadistas e milhares de peregrinos emocionados, muito deles jovens, que segundo Ratzinger, sempre foram vistos por João Paulo 2ºI como "o futuro da Igreja".

"Podem estar certos de que nosso querido papa agora nos vê abençoa da janela da casa do Pai", disse Ratzinger em seu sermão sobre a vida de João Paulo 2º, que foi interrompido 13 vezes por aplausos da multidão. Em faixas e aclamações, também foi pedida a "canonização imediata" de João Paulo 2º.

Após a celebração, o corpo do papa, deitado num caixão simples de madeira, foi enterrado na cripta da basílica de São Pedro, no mesmo lugar onde ficou o corpo do papa João 23 (1958–1963) até sua beatificação em 2000.

Papst Beerdigung Petersdom Platz
Milhares de fiéis acompanharam a cerimônia fúnebreFoto: AP

Estima-se que desde a morte do papa, no último sábado (02/04), aproximadamente cinco milhões de peregrinos passaram por Roma para se despedir do Santo Padre. Mais de 200 chefes de Estado e governo, representantes de monarquias, diplomatas e líderes partidários participaram do gigantesco funeral na "cidade eterna".

Muitos dos estadistas vieram pedir a bênção papal quando ainda eram candidatos aos cargos que hoje ocupam. Outros não quiseram perder a última oportunidade de ainda obter algum "capital político" do papa viajante e midiático, que pareceu onipresente de 1978 a 2005.

O presidente dos EUA, George W. Bush, veio acompanhado do pai, da secretária de Estado norte-americana, Condoleezza Rice, e do ex-presidente Bill Clinton. Estiveram presentes também chefes de Estado não muito simpáticos aos EUA, como os presidentes da Síria, Baschar el Assad, e do Simbábue, Robert Mugabe. Este último, aliás, proibido de entrar na União Européia, mas o Vaticano não é território da UE.

Até inimigos teriam se dado as mãos durante a cerimônia. O presidente israelense, Moshe Katzav, teria conversado brevemente com ao menos três líderes de países com os quais não mantém relações formais (Argélia, Irã e Síria), informaram as agências de notícias.

Políticos alemães de peso

Também o presidente da Autoridade Palestina, Ahmed Kureia, e o ministro israelense das Relações Exteriores, Silvan Shalom, renderam suas últimas homenagens a João Paulo 2º. A Polônia, terra natal do papa, foi representada pelo presidente Aleksander Kwasniewski e o ex-presidente Lech Walesa.

Papst Beerdigung Kardinäle
Cardeais prestam última homenagem a Karol WojtylaFoto: AP

A Alemanha participou com os pesos pesados da política: o presidente Horst Köhler e o chanceler federal Gerhard Schröder (SPD), o presidente do Bundestag (Parlamento alemão), Wolfgang Thierse, o ministro das Relações Exteriores, Joschka Fischer, e lideranças da oposição, como Angela Merkel (presidente da União Democrata Cristã – CDU) e o governador da Baviera, Edmund Stoiber (União Social Cristã – CSU).

Do Brasil, o presidente Lula, que diz ser "um homem de muita fé", veio com uma comitiva de 13 pessoas, incluindo representantes de várias religiões. Mais do que Lula, porém, nos próximos dias, um outro brasileiro deverá chamar a atenção da imprensa internacional: o cardeal gaúcho dom Paulo Hummes, arcebispo de São Paulo, cotado como papável para a sucessão de João Paulo 2º, que será decidida a partir do próximo dia 18 de abril.

Ausentes e velhas divergências

Apesar da morte do príncipe Rainier, de Mônaco, quase todas as monarquias européias, independentemente de suas confissões, estiveram representadas no funeral do papa. O príncipe Charles até cedeu aos apelos populares e transferiu seu casamento para estar no Vaticano – e isso apesar do cisma entre a Igreja Anglicana e a Igreja Católica.

Entre os grandes ausentes foram citados a realeza da Holanda, representantes da China, Fidel Castro, o presidente russo Vladimir Putin, Mikhail Gorbatchov, o patriarca russo-ortodoxo Alexi 2º e o autor do atentado ao papa em 1981, Ali Agca. Segundo a imprensa alemã, o governo russo não deu lugar para Gorbatchov na delegação do país que foi a Roma.

Alexi 2º criticou Karol Wojtyla por seus contatos com as igrejas ortodoxas da Romênia, Grécia, Geórgia, Armênia e Ucrânia. Apesar de Alexi 2º ter conseguido impedir qualquer visita do papa a Moscou, Putin disse que "toda uma era está vinculada ao nome de João Paulo 2º". A China não mandou representante porque rompeu em 1951 suas relações com o Vaticano, único Estado europeu que reconhece o governo de Taiwan.

Papst Beerdigung Sarg vor dem Petersdom
Caixão simples de madeiraFoto: AP

Segurança máxima

As autoridades italianas mobilizaram entre 10 e 15 mil integrantes do corpo de bombeiros, da polícia, exército e defesa civil para cuidar da multidão durante o funeral. Sete mil policiais e cerca de mil atiradores de elite italianos estavam posicionados no Vaticano.

Quase 1500 membros de unidades especializadas da polícia e carabineiros estavam encarregados da proteção dos cerca de 200 estadistas e diplomatas, enquanto os demais policiais se ocuparam de manter a ordem pública e monitorar os peregrinos.

Milhares de fiéis, principalmente poloneses que haviam chegado tarde ao velório, passaram a noite de quinta para sexta-feira nos arredores da praça São Pedro, aguardando a cerimônia fúnebre. Deitados em cobertores, sacos de dormir e até caixas de papelão, transformaram o Vaticano em um imenso albergue a céu aberto.

Devido ao temor de um atentado terrorista, aviões AWACS e soldados da Otan, estacionados perto de Aachen, na Alemanha, foram transferidos para a capital italiana. O espaço aéreo sobre Roma permaneceu interditado num raio de 35 milhas. Além disso, haviam sido instalados mísseis antiaéreos Spada em pontos estratégicos e mísseis de médio alcance no aeroporto de Practica di Mare. Dois helicópteros militares circularam sobre Roma durante o funeral.

Apesar do forte esquema de segurança, João Paulo 2º, o papa das multidões e dos superlativos, teria curtido essa despedida.