Para gregos, vitória do "não" marca recomeço
6 de julho de 2015Enquanto ainda festejavam nas primeiras horas da manhã desta segunda-feira (06/07), partidários do "não" se esforçavam para deixar claro que sua decisão não marcava o fim da história do país na zona do euro, mas um recomeço na queda de braço entre Atenas e os credores.
"Essa é a marca da vontade do povo grego, e agora cabe aos europeus decidirem se respeitam nossa opinião e querem nos ajudar", disse o estudante Nikos Tarasis, de 23 anos, no centro histórico de Atenas.
Os sinais de recomeço apareceram cedo, com a renúncia do controverso ministro das Finanças Yanis Varoufakis, rosto mais conhecido da ala mais dura do governo do primeiro-ministro Alexis Tsipras e que chegou a acusar os credores de fazerem terrorismo com o povo grego.
A mudança pode ser interpretada como um sinal de Atenas de maior disposição para chegar a um consenso com os credores – durante a última semana, tanto Tsipras quanto a maioria do povo grego disseram ter o desejo de continuar na zona do euro.
"Acordo ou Grexit", titula nesta segunda-feira o jornal econômico de tendência liberal Kathimerini. "Reforma ou Grexit", estampou na manchete o diário Ta Nea, também optando pelo acrônimo usado para uma eventual saída da Grécia do euro. "61% dizem não à austeridade", grafou em sua primeira página o Avgi, jornal partidário da esquerda.
Risco de escassez
"Nós trabalhamos para alcançar um entendimento. O nosso povo mostrou que pode aguentar firme", disse o ministro do Interior, Nikos Voutsis. "Os gregos já aguentaram durante uma semana, eles vão suportar mais alguns dias."
Voutsis se referia ao controle de capitais imposto na Grécia, que na segunda-feira passada fechou os bancos e estabeleceu um limite de saques à população.
Em resposta a um pedido de França e Alemanha, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, convocou para esta terça-feira uma reunião emergencial de líderes da União Europeia (UE) para discutir o resultado do referendo.
A rejeição dos gregos às medidas de austeridade jogou a Grécia – e a zona do euro – em águas nunca antes navegadas. No momento, o país é incapaz de pegar emprestado dinheiro nos principais mercados e tem uma das dívidas públicas mais altas do mundo. Na semana passada, o Fundo Monetário Internacional (FMI) alertou que seria necessário um aporte financeiro de mais de 50 bilhões de euros para aliviar a situação.
O economista Kostas Stoupas diz que o governo grego está num beco sem saída e, devido ao fechamento dos bancos, pode ver a situação sair de controle nas próximas semanas. Segundo ele, é possível que haja dificuldades para arcar com os custos do funcionalismo público e que comecem a faltar produtos básicos, como medicamentos, mantimentos e combustível.
"A vitória do 'não' no referendo dificulta a posição da Grécia nas negociações", opina o economista, num discurso contrário ao adotado pelo governo grego, que diz que, agora, com o apoio expresso do povo, terá melhores cartas no jogo com os credores.
Tsipras: acordo rápido
Tsipras afirmou, em pronunciamento na televisão estatal neste domingo (05/07), que o país quer encontrar uma "solução sustentável e permanente" ao que chamou de "crise humanitária". Segundo ele, a Grécia precisa abandonar o cenário de austeridade. Atenas, afirmou, não quer entrar em conflito com os financiadores da dívida, mas voltar à mesa de negociações.
"Sabemos que não há soluções fáceis, mas existem soluções justas e viáveis quando há vontade de ambos os lados", declarou Tsipras. O resultado do referendo, prosseguiu o premiê, não representa uma "ruptura com a Europa", mas dá maior poder de negociação ao país.
A derrota esmagadora do "sim" teve consequências também para a oposição grega. Após um encontro com o presidente Prokopis Pavlopoulos e outros líderes partidários, o ex-primeiro-ministro Antonis Samaras renunciou à chefia da Nova Democracia, principal legenda de oposição grega.
"Renuncio à liderança da Nova Democracia e pedi a Evangelos Meimarakis que assuma provisoriamente a presidência", afirmou Samaras, cedendo o cargo ao deputado e ex-presidente do Parlamento.
Em suas primeiras declarações após assumir o cargo, Meimarakis pressionou Tsipras a cumprir a promessa de chegar a um acordo com os credores "nas próximas 48 horas". Um consenso, no entanto, se anuncia complicado.
Nesta segunda-feira, um porta-voz do governo alemão afirmou que a porta para as negociações com a Grécia estão abertas, mas que as condições para tais conversas ainda não foram cumpridas.
"O governo toma conhecimento da clara votação para o 'não' e a respeita", disse Steffen Seibert, porta-voz da chancelaria federal. "Mas, diante da decisão de ontem dos cidadãos gregos, os requisitos para iniciar as negociações sobre um novo programa de ajuda não existem no momento."