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Controle da internet

Geraldo Hoffmann15 de novembro de 2007

Em entrevista à DW-WORLD.DE, perito alemão em regulamentação da web defende a liberdade da rede e descarta sua administração pela ONU, como sugeriu o ministro da Cultura, Gilberto Gil, no Fórum de Governança da Internet.

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Fórum no Rio de Janeiro discute futuro da internetFoto: AP

De acordo com dados da Organização das Nações Unidas (ONU), cerca de 1,2 bilhão de pessoas usam a internet, enquanto 5 bilhões ainda não têm acesso à rede. A exclusão digital, bem como a liberdade de expressão, crime cibernético, pornografia infantil, segurança, infra-estruturas críticas e a administração da WWW são temas discutidos no 2º Fórum de Governança da Internet (IGF), que termina nesta quinta-feira (15/11), no Rio de Janeiro.

Fundado no ano passado por decisão da Cúpula Mundial da Sociedade da Informação de 2005 na Tunísia, o fórum reúne no Rio cerca de 1.200 peritos de mais de 70 países. A Alemanha participa com um workshop sobre "melhores práticas" na área de tecnologia da informação, coordenado por Horst Zuse, filho do inventor do computador programável, Konrad Zuse.

Além disso, a iniciativa "Invest in Germany" distribuiu aos participantes do fórum o livro The Power of Ideas: Internet Governance in a Global Stakeholder Environment, de autoria de Wolfgang Kleinwächter e patrocinado pelo presidente alemão Horst Köhler, no qual 34 peritos internacionais em tecnologia da informação apresentam suas visões sobre o futuro da internet. Em entrevista à DW-WORLD.DE, Kleinwächter fala sobre os principais temas do encontro no Rio.

DW-WORLD.DE: A Alemanha apresenta-se no 2° Forum de Governança da Internet como "país das idéias". Como deve ser a futura ordem mundial da internet na visão dos alemães?

Wolfgang Kleinwächter: Não é fácil definir uma "posição alemã", visto que a governança da internet é um processo multi-stakeholder, em que o governo, a sociedade civil e a iniciativa privada nem sempre defendem a mesma idéia. Apesar disso, existe uma grande concordância de que a rede precisa ser livre e segura. No tocante à supervisão pela Icann [Internet Corporation for Assigned Names and Numbers – corporação responsável por regras para o uso da internet, sediada na Califórnia] e à administração dos recursos centrais da internet há pelo menos o consenso de que o papel único do governo norte-americano precisa ser reduzido.

O ministro brasileiro da Cultura, Gilberto Gil, propôs na abertura do IGF no Rio um mandato da ONU para administrar a internet em vez da Icann. O senhor é a favor dessa proposta?

ICANN Internetverwaltung Logo Grafik WSIS Weltinformationsgipfel
Atualmente, a Icann (EUA) define regras para uso da internetFoto: AP

De forma alguma. A Icann firmou-se como inovação estável no sistema da política internacional, apesar das fraquezas desse mecanismo. O processo de elaboração política é de baixo para cima, decisões só são tomadas pelo board após amplas discussões públicas, das quais qualquer um pode participar, e após consultas a todos os stakeholders.

O board é bem internacional e se renova constantemente, visto que ninguém pode integrá-lo por mais de seis anos. Além disso, o processo de revisão garante um controle permanente da efetividade das estruturas. Caso se subordinasse isso tudo à ONU, seria grande o risco de que o processo predominantemente técnico se tornasse um brinquedo nas mãos dos políticos, prejudicando sobretudo os usuários da internet.

O Fórum de Governança da Internet, como "representante da sociedade civil mundial", não poderia assumir essa tarefa?

O IGF é uma plataforma maravilhosa para a discussão. Aqui qualquer pessoa pode dar a sua contribuição e apresentar argumentos fortes para mudanças desse complexo sistema, formado por muitos players e níveis. Justamente por não ter poder decisório, o IGF pode discutir livremente. Transformá-lo numa espécie de autoridade negociadora resultaria no oposto do que os usuários da internet esperam: o desenvolvimento inovador de uma rede segura e livre para todos.

É possível administrar ("governar") a internet sem que isso vire controle?

Determinados recursos, como nomes de domínios e endereços IP, naturalmente precisam ser administrados. E muitas coisas da internet – por exemplo, a luta contra o crime cibernético – dependem de cooperação e acordos internacionais. Mas isso é um sistema muito descentralizado de gerenciamento e administração. Entregar todas essas tarefas a uma autoridade seria puro absurdo e não levaria a nada.

No Rio também se discute sobre crime cibernético. A armazenagem preventiva de dados telefônicos e de internet, aprovada na semana passada pelo Parlamento alemão, é um bom exemplo de como o Estado pode enfrentar criminosos na internet?

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Participantes do IGF acessam a internet durante a conferência no RioFoto: AP

Minha opinião pessoal é que um Estado democrático deve prestar muita atenção para não ferir direitos e liberdades fundamentais ou colocá-los à disposição, ao perseguir o objetivo legítimo de combater criminosos também na internet. Crimes precisam ser investigados. Mas colocar todos sob suspeita, espionar ou observar quem faz o quê na web é outra questão. Precisa-se de um sistema muito equilibrado, que também controle principalmente os possíveis controladores e siga regras estritamente democráticas. Caso contrário, rapidamente se pode ter uma situação como na China ou cair nas mãos de um espião.

Um outro tema do IGF é o direito ao acesso à informação. Como se poderia diminuir o fosso digital entre países industrializados e nações em desenvolvimento?

Este é o grande desafio para o futuro. Aqui se fala muito do "próximo bilhão de usuários de internet". A Cúpula Mundial da Sociedade da Informação decidiu que, até 2015, metade da humanidade, portanto cerca de três bilhões de pessoas, devem estar online. Para atingir isso, precisam ser mobilizados muitos recursos críticos, desde eletricidade até educação. As chances para tanto, porém, não são ruins, considerando-se o boom da telefonia celular na África e na América Latina e levando em conta que, em três a cinco anos, todos esses celulares serão minicomputadores com acesso à internet.

No seu livro The Power of Ideas: Internet Governance in a Global Stakeholder Environment são feitas sugestões práticas para a democratização da internet. O que poderia ser feito imediatamente sem grande esforço?

O importante seria fortalecer mundialmente a conscientização e o conhecimento sobre os problemas da internet, isto é, investir mais dinheiro em educação. Na Alemanha, por exemplo, a educação para a internet já deveria começar no jardim-de-infância.

Wolfgang Kleinwächter é professor de Política e Regulamentação da Internet na Universidade de Aarhus (Dinamarca), bem como consultor especial da direção do Internet Governance Forum (IGF) da ONU e da Aliança Global para Tecnologia da Informação e Comunicação (Gaid). Desde o final dos anos 1990, atuou em várias funções na Icann. Ele é autor de vários livros sobre governança da internet e sociedade da informação.