Peruano processa empresa alemã por degelo dos Andes
24 de novembro de 2015Um pequeno agricultor peruano entrou nesta terça-feira (24/11) com uma ação contra a empresa alemã de energia RWE no tribunal da cidade de Essen. Saúl Luciano Lliuya afirmou ser vítima dos efeitos das mudanças climáticas na região onde vive e pede uma reparação da empresa alemã, considerada a maior emissora individual de gases poluentes da Europa.
O agricultor disse que não esperava que sua causa fosse chegar tão longe quando entrou em contato com a ONG alemã Germanwatch durante a Conferência do Clima da ONU (COP20) em dezembro de 2014, em Lima. "Não esperava tanta repercussão, mas as mudanças climáticas interessam a todos", declarou.
O agricultor e guia de montanha vive e trabalha em Huaraz, uma cidade cerca de 450 quilômetros ao norte de Lima e localizada na Cordilheira Branca, no norte dos Andes peruanos.
Depois de ver com seus próprios olhos como o volume do lago glacial de Palcacocha aumenta gradualmente por causa do degelo, e preocupado com as consequências trágicas – como inundações – que o transbordamento ou rompimento da barragem poderiam acarretar para sua cidade, Lliuya decidiu pedir ajuda para a ONG especializada em mudanças climáticas.
"Todos os anos eu subo [nas montanhas] Alpamayo, Chupicalqui e Huascarán e vejo que o degelo está cada vez mais preocupante, razão pela qual me atrevo a entrar com a ação. É algo injusto: os que menos poluem são os mais afetados pela mudanças climáticas", afirmou Lliuya.
Cota de responsabilidade
Depois de analisar quais são as 50 empresas que mais poluem em nível mundial, a ONG alemã aconselhou Lliuya a apresentar uma ação individual contra a RWE para obter fundos para a construção de um dique que possa prevenir uma possível inundação da cidade e garantir a segurança dos turistas europeus e americanos que visitam a região caso haja o colapso da represa do lago de Palcacocha.
De acordo com a Germanwatch, tendo em conta que a RWE é a principal emissora de CO2 em nível europeu e responsável por 0,5% das emissões em nível mundial desde o início da Revolução Industrial – segundo um estudo publicado em 2014 –, ela teria que disponibilizar cerca de 17 mil dos 3,5 milhões de euros que deveriam ser investidos para evitar o possível colapso do lago glacial. Um valor simbólico, mas que, segundo a ONG, "seria um primeiro passo importante para a causa".
Antes de a ação ser ajuizada, a gigante energética RWE declarou à agência de notícias AFP que não poderia comentar o caso pois sabia dele somente pela mídia. Mas, referindo-se a processos anteriores nos EUA e Alemanha, a empresa afirmou que não vê "nenhuma base legal" para tais reivindicações.
Autoridades locais
Como proprietário de vários terrenos agrícolas – que somam de dois a três hectares – nas montanhas próximas à cidade, Lliuya disse considerar de grande importância a conservação do habitat natural da região. Em suas propriedades, localizadas a cerca de 3.600 metros de altitude, sua família cultiva principalmente batatas, quinoa e milho.
E esse meio de subsistência é a mesmo de grande parte da população de Huaray. Por essa razão, e uma vez que "a política no Peru é instável e não se envolve nessas questões", afirmou Lliuya, "temos promovido conversas em nível local com o governo" que, através de seu prefeito, "se comprometeu a administrar o dinheiro caso a ação prospere".
O processo continua
A advogada de Lliuya, Roda Verheyen, explicou que os agricultores desta e de outras regiões do Peru afetadas pelo degelo das geleiras andinas têm duas opções: "Esperar que aconteça uma catástrofe ou fazer algo".
Verheyen afirmou que está consciente do desafio de defender uma causa desse tipo. Ela disse que, após apresentar a demanda no tribunal de Essen, a empresa será informada sobre a abertura do processo, o que pode demorar de uma a duas semanas.
Assim, a RWE terá a oportunidade de se defender das acusações. Em algum momento deverá ser marcada uma audiência, na qual as duas partes vão se reunir e, por último, o tribunal decidirá sobre o processo. "É provável que saia uma decisão nos próximos cinco anos", disse Verheyen.