Real ou virtual?
2 de agosto de 2007A documenta 12 pretende mostrar as conexões entre a modernidade e a contemporaneidade. Isso já ficou claro tanto na arquitetura e na organização da exposição, como nos discursos feitos pela dupla de curadores Roger Buergel e Ruth Noack. A proposta da curadoria inclui também o projeto documenta magazines, que reuniu publicações sobre arte contemporânea ao redor do mundo para discutir os leitmotive da mostra e depois publicar uma revista a respeito de cada um deles.
Durante uma semana, editores envolvidos no projeto se encontraram para discutir com o público o presente e o futuro de publicações de arte e cultura. A Semana do Papel e do Pixel trouxe à tona debates que podem ir além do âmbito editorial. Ao longo da Semana, ficou claro que o fenômeno dos blogs não pode mais ficar de fora das discussões que tratam da convivência dos mundos virtual e real. Principalmente se isso faz parte do programa oficial de uma mostra de arte contemporânea observada pelo mundo inteiro e documentada pelos mais diversos tipos de mídia.
Em pauta, o virtual e o real
As discussões giraram em torno dos mundos real e virtual e da clara divisão que ainda existe entre eles, apesar das contaminações mútuas cada vez mais possíveis e já detectadas. Revistas impressas criam programas que simulam a virada de página para sua versões online, com o objetivo de tornar o espaço virtual cada vez mais parecido com a vida real. O meio eletrônico, por sua vez, permite buscas mais eficazes e satisfaz a necessidade de arquivamento.
Apesar de o meio virtual se tornar cada vez mais palpável e prático, um dos consensos entre os palestrantes foi o de que ainda há no leitor a vontade de poder tocar o papel e ler a palavra impressa .
As publicações em papel seriam mais confiáveis, mas estáticas, segundo Alessandro Ludovico, um dos organizadores da Semana e editor da publicação Neural sobre arte e mídia. Ludovico afirmou, durante uma das conferências, que as edições impressas ganham credibilidade, mas perdem chences de disseminação – por serem caras e, em alguns contextos, politicamente inviáveis.
Na conferência “The art of blogging” (A arte de fazer blogs), Regine Debatty, criadora do blog We Make Money Not Art, declarou que prefere ler impressos, mas detesta escrever para eles. A impossibilidade da mudança e da edição em tempo real são os principais motivos. Durante a Semana do Papel e do Pixel ficaram, de um lado, as obras de arte fazendo as diferentes mídias dialogarem e, do outro, as divergências sobre a forma ideal de se falar sobre elas.
Uma documenta virtual
No centro de tudo está a documenta 12, catalisadora das discussões e debates. A mostra que dura cem dias pretende tornar a arte contemporânea mais palpável para o público em geral; questionar como o sujeito se situa e se inscreve no mundo de hoje; e falar dos papéis da educação estética para a sociedade. Junto com a exposição, blogs ajudam a formar uma documenta virtual.
Os blogs são atualizados a cada dia, com impressões escritas, críticas, fotos, vídeos e áudios sobre o que acontece. Um imediatismo que só o meio eletrônico permite. Uma diversidade de informações concentrada em um só local, uma possibilidade de estar na documenta sem realmente ir até Kassel. Será?
O fato é que muito do que consta dessas publicações online só faz sentido durante os cem dias de duração da mostra, constituindo algo que jamais poderia ir para o papel, sejam jornais ou revistas especializadas. Algo que, finalmente, tiraria do meio eletrônico os estigmas de simples formas de economizar papel e convergir mídias.
Esses blogs dão ao visitante-internauta-espectador as mais diferentes possibilidades de participação. A maioria das 95 publicações envolvidas com a documenta com plataformas na rede permite a interação através dos já tradicionais comentários e fóruns de discussão. Um exemplo é o site Labforculture.org, que estava à frente da organização da Semana do Papel e do Pixel.
Há blogs, entretanto, como o documenta12blog.de, que permitem a participação de qualquer um com contribuições pessoais das mais diversas espécies: comentários, artigos, gravações de entrevistas, fotos e vídeos. O mesmo faz o saab-documenta.de.
O site documenta-dock.net é um projeto da Escola Superior de Artes de Kassel, mas pretende, assim como os blogs, tirar dos meios formadores de opinião e dos especialistas o monopólio da fala sobre obras e exposições. Para isso, eles se colocam no lugar do espectador comum e entrevistam artistas, curadores e historiadores da arte, fazendo perguntas que geralmente são encaradas como óbvias por quem trabalha no meio.
Ainda o papel
A extrema mobilidade dos blogs e o quase diletantismo dos blogueiros podem até fazer com que essas páginas virtuais percam o sentido depois de passados os cem dias. Mas muito do que está dito nelas será relevante para enriquecer debates futuros. Talvez só o papel e os sites oficiais digam isso.
Mesmo as publicações envolvidas com a documenta, que encontraram na rede uma possibilidade de disseminar suas idéias, formando a oposição aos chamados meios de comunicação do mainstream, foram as responsáveis pelo conteúdo das revistas publicadas sobre cada um dos temas propostos pelos curadores. Esgotadas, as revistas Modernity?, Life! e Education foram editadas juntas, na chamada Reader’s Edition. E a opinião desses editores e multiplicadores culturais foi chancelada pelo papel e pela marca da documenta.