1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Polícia no pátio de escola em Berlim

(fm)31 de março de 2006

Violência em escola alemã gera debate sobre o sistema educacional e a política de integração do país.

https://p.dw.com/p/8BQl
Aulas, só com presença policialFoto: picture-alliance / dpa/dpaweb

A partir desta sexta-feira (31/03), a escola Rütli em Neukölln, Berlim, conta com a ajuda de policiais para que as aulas possam acontecer, uma resposta ao pedido de socorro do corpo docente para tornar a situação "tolerável".

Em carta à Secretaria da Educação, a diretora, Brigitte Pick, pedira o fechamento da instituição, pois a violência entre os alunos havia atingido proporções incontroláveis. Segundo ela, o clima entre os alunos estaria impregnado pelo sentimento de destruição, violência e comportamentos desrespeitosos.

Os professores estavam sendo ignorados e até mesmo atacados pelos alunos. Objetos eram freqüentemente lançados pelas janelas e as brigas aconteciam diariamente. Alguns professores estariam indo para as salas somente munidos de celulares, para poder pedir ajuda em casos extremos.

Situação generalizada

Rütli-Hauptschule in Berlin
Violência fugiu do controle na escola Rütli, no bairro de Neukölln em BerlimFoto: picture-alliance/ dpa

Após a proibição dos celulares em algumas escolas da Baviera e o pedido de socorro da escola Rütli em Berlim, começou um novo debate sobre a violência entre os jovens na Alemanha. Em meio às discussões, surge a controvérsia sobre o papel e a eficácia da Hauptschule no sistema educacional alemão. Paralelamente, questionam-se também as medidas de integração do país.

Alguns políticos e pedagogos pedem o fim da Hauptschule. Outros alertam para os perigos de generalizações em torno da eficácia do sistema educacional alemão e ressaltam o bom funcionamento das escolas do interior do país.

Motivos da violência

A encenação de atos violentos parece ser a mais nova moda nas escolas. Grupos de jovens agridem companheiros ou vítimas aleatórias – um processo chamado happy slapping – enquanto uma câmera ou o próprio celular registra as imagens que serão, posteriormente, transmitidas e difundidas pela internet.

Sociólogos concordam que casos de violência na família e baixo nível de instrução contribuem para aumentar o problema de violência nas escolas alemãs, principalmente entre os jovens com histórico familiar de imigração. Outro fator é o grande consumo de filmes de ação brutais e jogos de violência.

Mais violência entre jovens estrangeiros

Os dados de um projeto de pesquisa do professor Christian Pfeiffer, do Instituto de Pesquisas Criminais da Baixa Saxônia, mostraram um outro fator: a imagem masculina vigente em determinados grupos.

Na pesquisa, os jovens concordaram com afirmações como "um homem que não está preparado para se defender com violência não é um homem de verdade", ou "mulheres e crianças devem obedecer incondicionalmente ao homem, o chefe da família".

O estudo revelou também que um garoto de família turca é, em média, maltratado três vezes mais pelos pais do que um companheiro de classe alemão (12,2% contra 3,7%). Além disso, crianças de famílias migrantes vivenciam violência por parte dos familiares com freqüência quatro vezes maior do que as alemãs (28,5% contra 6,5%).

Despejo para alunos-problema

A porcentagem dos estrangeiros matriculados nas Hauptschulen é grande nas metrópoles alemãs. Em Berlim, cerca de 40% dos alunos dessas escolas são estrangeiros. Em Neukölln, os números chegam a 68%.

Na escola Rütli, 83% dos alunos não são de nacionalidade alemã. A maioria é de origem libanesa ou turca e a língua franca é o árabe. Na escola não há professores provenientes de outros círculos culturais e, por este motivo, eles têm dificuldades para superar barreiras de comunicação.

As crianças com maiores dificuldades na escola fundamental são encaminhadas para a Hauptschule, que se tornou uma espécie de despejo para alunos-problema.

Índices estáveis

Segundo estimativas de criminalistas alemães, o número dos atos violentos tem se mantido relativamente estável nos últimos anos, mas os jovens estão se tornando mais brutais.

Os jovens se agridem mais e continuam a bater, ainda quando a vítima já está caída no chão. Em alguns Estados, como em Brandemburgo e Berlim, aumenta o número de ocorrências policiais referentes a atos de delinqüência juvenil.

Leia mais sobre o problema da violência nas escolas alemãs e a posição de políticos sobre o ocorrido na escola Rütli.

Problema mal conhecido

KFZ Werkstatt Ausbildung von Jugendliche
Falta de perspectivas para o futuro gera violência nas escolasFoto: ZB - Fotoreport

A violência nas escolas alemãs ainda é um problema mal conhecido. Um estudo realizado pela psicóloga Mechthild Schäfer, publicado pelo jornal Die Welt, revelou que um em cada 25 alunos sofre algum tipo de ataque violento por semana nas escolas alemãs.

Levando-se em conta que há no país cerca de 10 milhões de alunos de nível médio e básico, as estatísticas de violência nas escolas estariam por volta dos 500 mil casos por semana. O estudo mostrou ainda que a violência ocorre em todos os tipos de escola, seja na Hauptschule seja no Gymnasium (que permite o acesso a cursos universitários), tanto nas áreas metropolitanas quanto no interior do país.

Heinz-Peter Meidinger, diretor da Associação de Filólogos Alemães, acredita que os números apresentados por Schäfer sejam realistas: "É assustador que tais casos passem tão freqüentemente despercebidos pelos professores", disse ao Die Welt.

Meidinger pediu aos seus colegas professores "mais sensibilidade para com o problema". Ele mencionou ainda a importância de amplas discussões públicas, bem como a necessidade de um programa de treinamento para professores para que "os casos de violência não sejam minimizados".

Violência é comum entre jovens da Alemanha

Islam-Unterricht an Schule
O sistema de ensino da Alemanha apresenta problemas de difícil soluçãoFoto: dpa

Um estudo da Universidade do Ruhr de Bochum, coordenado pelo professor Thomas Feltes, mostrou que um em cada cinco alunos da Hauptschule já bateu com tanta violência em um outro jovem que a vítima teve que ser hospitalizada. Outra revelação surpreeendente é que isso acontece em todos os tipos de escolas na Alemanha: na Gesamtschule 14% dos alunos já sofreram violência física; no Gymnasium, 8% dos alunos.

O pesquisador mostrou que os jovens usam mais de violência quando se sentem magoados. Dos quatro mil alunos entrevistados, 60% acreditavam que deviam defender a própria honra de qualquer forma. A metade afirmou que se deve usar a violência quando se é atacado.

Feltes acredita que os jovens, hoje em dia, estejam mais sensíveis às ofensas por causa da falta de perspectivas com relação ao futuro. "Eles não têm confiança no futuro" e, por este motivo, reagiriam mais intensivamente a um insulto. "Existem poucos alunos que sejam os alvos constantes de violências ou ameaças", completa Feltes. Para o pesquisador, o agressor de hoje será a vítima de amanhã.

Soluções concretas

Muitas escolas tentam oferecer aos alunos alternativas para a solução de conflitos. Na escola Bismarck, em Nurembergue, a ajuda mútua dos alunos tem causado bons efeitos. Em cada sala há um "mediador de brigas". Todos os dias na hora do intervalo, dois alunos da equipe "Conversa ao invés de soco" saem pelo pátio com coletes laranjas e se colocam à disposição para ouvir as crianças brigonas.

Unwillkommene Aussiedler
Jovens devem aprender a lidar com conflitosFoto: dpa

A iniciativa "Bremen sem armas" recolheu facas, canivetes e estrelas-ninja nas escolas da cidade.

Feltes coordena o projeto "Forte sem violência", programa que ajuda os jovens a resolver conflitos sem o uso da força. As entrevistas com os participantes mostraram que 70% dos alunos se sentem menos ameaçados e mais seguros por causa do projeto, reagindo menos agressivamente em situações de ameaça.

Em Bochum, a polícia já oferece há quase dez anos palestras e oficinas para que os jovens aprendam a se defender corretamente dos insultos.

A importância do idioma

A encarregada nacional para assuntos de imigração, Maria Böhmer, da União Democrata Cristã (CDU) analisou os acontecidos em Berlim como um alerta "em último grau" da existência de uma sociedade paralela na Alemanha.

Para o combate a este tipo de situação, Böhmer exigiu a criação de uma política de integração mais eficaz e que realmente possibilite aos jovens ter perspectivas tanto educacionais quanto profissionais.

A condição fundamental para a integração é a língua alemã. "O caminho encontrado pela escola Hoover é o que deve ser seguido", disse a encarregada, nesta sexta-feira (31/03). Por decisão conjunta dos pais, professores e alunos, somente o alemão é permitido na escola, durante os intervalos.

Quanto ao acontecido na escola de Neukölln, Maria Böhmer salientou os problemas lingüísticos da escola. "Quando os alunos só falam as próprias línguas, eles excluem os outros jovens e a situação se torna insustentável."

Ela ressaltou a importância de cursos de alemão também para os pais destes jovens: "Quando os pais não dominam a língua e não sabem como funciona o sistema educacional, eles não podem apoiar nem incentivar os filhos".

Continue lendo sobre a violência entre os colegiais alemães e em suas famílias, e as possíveis soluções.

É preciso integrar

Para Klaus Böger, secretário de Educação de Berlim e membro do Partido Social Democrata da Alemanha (SPD), a integração das famílias imigrantes é um problema sério e que deve ser priorizado na lista de decisões do governo. Böger acha indispensável que estas famílias tenham melhores conhecimentos do idioma e do sistema jurídico do país.

Para Böhmer, o ocorrido na escola "é o resultado de uma política de integração deficiente". Caberia aos políticos de diversas esferas – nacional, estadual e municipal – diminuir o déficit.

Ele insiste numa distinção entre dois grupos de jovens. O primeiro seriam aqueles que podem se afastar da violência através da ajuda de psicólogos e assistentes sociais. O outro grupo incluiria os verdadeiros delinqüentes. "Neste caso, não há muita coisa a ser feita, a não ser impor sanções, chamar a polícia e, eventualmente suspender ou expulsar os alunos ", completa.

Incentivo individual aos jovens

Ulrich Thöne, diretor do Sindicato da Educação e Ciência (GEW), criticou o desleixo com que são tratados muitos jovens na Alemanha. Há anos 15% dos jovens são considerados "educacionalmente perdidos" e deixados à margem da sociedade.

Em sua opinião, são justamente estes jovens os que mais precisam de ajuda. O ideal seria um tratamento individual. A integração de jovens estrangeiros requer uma rica oferta de atividades, e os cortes no orçamento destinados à integração somente levam à criação de sociedades paralelas.

Ponta do iceberg

Grossrazzia in Offenburg
A violência é o resultado de uma política de imigração ineficienteFoto: AP

Udo Beckmann, diretor da União para Educação e Formação Escolar do Estado da Renânia do Norte-Vestfália (VBE–NRW) denominou o incidente da escola Rütli de "ponta do iceberg".

Beckmann, chamou atenção para o problema de "criação de guetos" que está ocorrendo em comunidades de imigrantes. A VBE de Berlim declarou à imprensa que o fechamento da escola Rütli não mudaria em nada a situação da comunidade.

Peter Struck, pedagogo de Hamburgo, disse à emissora de rádio NDR que "o problema da violência está aumentando nas escolas alemãs", mas não será resolvido com sanções.

Escola para perdedores

O professor Christian Pfeiffer defende o fechamento da escola em Berlim. "A Hauptschule alemã se tornou uma escola para perdedores. A situação no norte do país ainda é pior do que no sul."

Para ele, as crianças que freqüentam este tipo de escola têm menores chances de encontrar uma vaga em cursos profissionalizantes e piores condições de ingressarem no mercado de trabalho. Pfeiffer defende uma fusão entre a Hauptschule e a Realschule, o que ajudaria a integrar melhor as crianças com histórico familiar de imigração.

A porta-voz do Partido Verde, Priska Hinz, disse que a existência da Hauptschule não tem mais sentido e defendeu a criação de "um novo tipo de escola, na qual as crianças possam aprender juntas por mais tempo". Indispensável seria o apoio individual de acordo com as necessidades dos alunos.

Medidas diferenciadas

Em entrevista à revista Spiegel, Friedbert Plüger, candidato democrata-cristão à prefeitura de Berlim, acusou o atual governo de "ter fechado os olhos e ignorado o problema por muitos anos". Pflüger não acredita que a reforma escolar seja a solução para o problema.

"Não podemos mais tolerar salas de aulas sem regras e livres para a violência nas escolas alemãs", completa Pflüger, que também acha que medidas como as tomadas nos Estados Unidos sejam necessárias no país. "Temos que aceitar que, em casos extremos, a presença policial é indispensável e talvez precisemos de detectores de metal como em Nova York."

O secretário de Cultura da Baixa-Saxônia, Bernd Busemann (CDU), advertiu contra as generalizações. O agrupamento de muitos estrangeiros em uma escola não seria imediatamente sinônimo de violência. Para Busemann, a eliminição da Hauptschule do sistema escolar alemão não eliminaria os jovens e, por conseguinte, não resolveria o problema da violência.

Wilfried Bos, chefe do Instituto de Pesquisas sobre o Desenvolvimento Escolar da Universidade de Dortmund, acredita que a Hauptschule funcione bem em alguns Estados como Baden-Württemberg, Baviera e em alguns municípios da área rural. Contudo, "em algumas áreas como Berlim, a Haupschule virou uma escola de excluídos".

Bos acredita que as medidas devam ser tomadas individualmente, pois cada caso é um caso diferente. "Existem também escolas do tipo Gymnasium que são ruins", completa Bos.