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PolíticaPolônia

Populistas de direita têm maioria na Polônia. Por quê?

Magdalena Gwozdz-Pallokat
13 de outubro de 2019

Boca de urna confirma sondagens, dando vitória ao partido do governo, PiS. Estratégia de promessas ousadas e retórica heroica vem dando certo. Porém ex-presidentes já alertaram para perigo de uma ditadura em Varsóvia.

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Homem atrás de cabine de votação
Estratégia eleitoral do PiS parece ter convencido maioria do eleitorado polonêsFoto: Reuters/K. Pempel

As primeiras projeções, após o fechamento das urnas no pleito legislativo deste domingo (13/10), na Polônia, dão vitória ao partido do governo, o nacional-conservador Lei e Justiça (PiS), com mais de 43% dos votos. Em seguida vem a coalizão liberal de esquerda Plataforma Cívica (PO), com cerca de 27%. Os resultados oficiais serão divulgados nos próximos dias.

Mais de 30 milhões de eleitores compareceram para decidir sobre a distribuição dos 460 assentos do Sejm (câmara baixa do parlamento polonês), assim como os 100 do Senado. Durante a campanha, os membros do populista de direita PiS se mostravam tão convencidos de sua vitória, que o único obstáculo a temer era tropeçarem nas próprias pernas.

Jaroslaw Kaczynski – oficialmente, apenas um deputado, mas, enquanto líder do PiS, o político que realmente dá as cartas no país – considerava: "Temos o respaldo da maioria de nossa sociedade, mas não está claro se essa maioria comparecerá em massa às urna. Caso positivo, venceremos; se não, nossos resultados talvez sejam medíocres."

Em aparição conjunta na véspera do pleito, Kaczynski e o primeiro-ministro Mateusz Morawiecki explicaram seu roteiro pós-eleições: dentro de seu "Plano de Cinco Pontos", os populistas de direita defendem: contribuições de seguro social menores para pequenas empresas; benefícios de aposentadoria adicionais; construção de 100 cinturões rodoviários para cidades de pequeno e médio porte; assim como um esquema para elevar os subsídios da União Europeia para os agricultores poloneses, até o nível de seus colegas alemães e franceses.

A legenda foi rápida em produzir promessas, quando necessário: em resposta a relatos de que a falta de cuidados preventivos estava custando vidas, Kaczynski ofereceu exames médicos preventivos para todos os cidadãos maiores de 40 anos.

"Também desta vez queremos selar um pacto como nossos cidadãos", declarou o premiê Morawiecki. "Afinal, numa democracia, eleições não são nada além da renovação de um contrato social. E, as coisas que prometemos", acrescentou com orgulho, "nós implementamos."

Jaroslaw Kaczynski, líder do partido PiS, beija mão de eleitora durante comício eleitoral
Jaroslaw Kaczynski, líder do PiS, beija mão de eleitora durante comício eleitoralFoto: REUTERS

Marcin Sinczuch, sociólogo da Universidade de Varsóvia, confirma: o partido ultranacionalista, de fato, tem perseguido uma política sem precedente real na Polônia dos últimos 30 anos. "A barra da credibilidade alcançou uma altura quase temerária, pois o PiS está basicamente dizendo: 'Vamos cumprir nossas promessas, não importa o que aconteça.'" A questão é como isso pode funcionar no caso de uma crise econômica. Sinczuch não tem dúvida: "Nesse caso, eles vão ter que fazer cortes orçamentários."

A questão é: onde? A tarefa de enumerar todos os programas do setor econômico e social que o PiS está financiando, ou promete financiar, tornou-se bastante exaustiva: impostos menores, idade de aposentadoria mais baixa e benefícios infantis são apenas os mais conhecidos. Muitos deles são aplicados pelo governo a despeito das advertências e conselhos de especialistas. E, até agora, essa abordagem tem vingado: o dinheiro está fluindo e a economia floresce.

Porém há mais em jogo do que apenas dinheiro. "O PiS restaurou a dignidade do povo", diz um taxista originário do leste do país. A palavra-chave aqui é "simbologia": orgulho nacional, heroísmo, sacrificar as próprias vantagens em benefício de outros – esse é o tipo de retórica que o partido de Jaroslaw Kaczynski tem empregado repetidamente. E que, ao que tudo indica, está em consonância com o zeitgeist: mesmo muitos cidadãos que não têm filhos louvam a introdução de benefícios infantis financiados pelos cofres públicos.

Para muitos é uma experiência positiva que – após anos de privações na sequência da queda da Cortina de Ferro, quando mesmo os governos de esquerda louvavam o livre-mercado – o governo esteja de volta e cuide de sua gente, mesmo dos que aparentemente não desempenhavam nenhum papel, até então.

"Para eles a virada política foi uma experiência traumática", explica o sociólogo Sinczuch. "No socialismo, as pessoas não tinham simpatias pelo Estado, entretanto ele oferecia uma certa segurança e provia os bens essenciais."

Devido a seu trabalho social, mas também graças à ênfase em valores comuns como "nação", "Igreja" e "família", o PiS angariou a reputação de ser um partido defensor do retorno à ordem e segurança. "Muitos, especialmente os mais idosos, são recordados de seus anos de infância e adolescência."

Grande parte desses artifícios funcionou subliminarmente, explica Sinczuch. Só que o tipo de política que poderia unir a nação teve, antes, o efeito contrário: a sociedade polonesa está mais dividida do que nunca.

Onde anda a oposição?

O problema da ala liberal polonesa é que o líder oposicionista Grzegorz Schetyna não é especialmente popular, sendo responsabilizado pela imagem da Plataforma Cívica como legenda essencialmente anti-PiS, em vez de representar ideias próprias.

E no entanto as falhas do ultradireitista Lei e Justiça são óbvias: o sistema judiciário se encontra em estado deplorável, com os processos se alongando mais do que nunca. Partes substanciais de sua "reforma" – como a aposentadoria compulsória de juízes do Supremo Tribunal – foram sustadas pela Corte de Justiça Europeia.

Diversos juízes se recusam a comparecer diante da nova Câmara Disciplinar quando convocados, pois sua imparcialidade política é colocada em questão. E ninguém sabe se os juízes que assumiram através do novo protocolo de nomeação foram indicados de modo legítimo, nem se seus veredictos e decisões serão mantidos.

Contudo, em vez de apresentar planos próprios, a PO não para de lançar advertências de que a democracia está em perigo. Por outro lado não está muito claro como, exatamente, a aliança de oposição pretende renovar a democracia, critica Wojciech Szacki, do think tank liberal Polityka Insight: "Não há nenhum pacote de leis e emendas para restaurar o Estado de direito."

No máximo, uma mudança de poder só seria possível numa coalizão ampla. A Esquerda tem boas chances de entrar para o Sejm, e as sondagens também mostravam o democrata-cristão e ruralista PSL-KP se aproximando do mínimo de 5% dos votos. O mesmo se aplica ao grupo Confederação, que reúne extremistas de direita, radicais ativistas antiaborto e palhaços da política.

Num ponto, contudo, todas as pesquisas concordavam, e a boca de urna confirma: o PiS está à frente. A questão é se poderá governar sozinho ou se precisará de um parceiro de coligação. Devido ao sistema polonês de distribuição de votos, na eleição anterior o partido nacionalista ficou com maioria absoluta, apesar de só ter obtido um terço nas urnas.

E aí vem a grande questão: como os populistas de direita transformarão a Polônia? Será que estava correta a avaliação de presidentes anteriores, inclusive do líder do Solidarinosc, Lech Walesa, e o país está tendendo em direção a uma ditadura autoritária?

Apesar da parcialidade das emissoras de direito público, o jornalismo crítico ao governo se mantém. Apesar de todos os esforços do PiS de "reforma judiciária" – amplamente condenados dentro e fora do país, e que lhe valeram reprimendas de Bruxelas –, os tribunais continuam pronunciando decisões contrárias aos interesses ao partido do governo. Mas até onde o Lei e Justiça irá, depois das eleições?

Nos círculos liberais, muitos temem que no futuro ele procurará cercear a mídia privada. Certo está que seguirá tentando reorganizar e reconfigurar as instituições estatais como lhe convém. Varsóvia tem que se transformar numa "nova Budapeste" – declarou Kaczynski, alguns anos atrás, numa aparente alusão à Hungria nacional-conservadora e ultradireitista de Viktor Orbán. Cabe ver se, de lá para cá, ele reconsiderou essa meta.