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MídiaAlemanha

Por que a DW e a RT não são comparáveis

4 de fevereiro de 2022

Distanciamento em relação aos governos de seus países é principal diferença entre as emissoras alemã e russa.

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Logos das emissoras Deutsche Welle e da RT
DW e RT foram transformadas em alvos em meio a tensões entre Rússia e OcidenteFoto: Andre M. Chang/ZUMAPRESS.com/picture alliance

Agora a imprensa também se tornou um alvo. Em meio ao agravamento das tensões entre a Rússia e o Ocidente, o Ministério russo do Exterior revogou nesta quinta-feira (03/02) a licença da DW para transmitir programas de televisão em inglês, alemão e russo.

Além disso, a sucursal da emissora internacional alemã em Moscou foi fechada. Essa dura medida veio em seguida a uma decisão dos reguladores alemães, na véspera, banindo a emissora RT DE de transmitir qualquer programa na Alemanha.

Pode parecer uma reação "olho por olho". Mas, analisadas de perto, percebe-se que as situações não são comparáveis. Há diferenças significativas tanto entre os dois processos como em relação ao modo como funcionam as duas empresas internacionais, que um termo alemão expressa bem: Staatsferne, distanciamento em relação ao Estado.

Lições do período nazista

Após a experiência da ditadura nazista, a imprensa alemã foi estruturada de forma a evitar que os detentores do poder possam controlar os jornais, rádios, televisão e, mais recentemente, também a mídia online.

Tanto a DW quanto RT – antes chamada Russia Today – são organizações financiadas pelo Estado. Para assegurar que a DW trabalhe de modo independente do governo e siga padrões jornalísticos, a emissora não é uma sub-repartição do Departamento Federal de Imprensa, mas organizada no âmbito do que na Alemanha se chama direito público (öffentlich-rechtlich).

Isso significa que, mesmo que o financiamento saia do orçamento federal, o diretor-geral da emissora responde apenas ao Conselho de Radiodifusão da DW, que o elege para um mandato de seis anos. Mesmo no caso de uma mudança de governo na Alemanha, o diretor tem seu cargo assegurado.

O Conselho é formado por 17 membros honorários: representantes da sociedade civil, sindicatos, grupos religiosos e também partidos políticos. Eles cuidam para que o serviço internacional de notícias siga a Lei da DW, ou seja: "Fornecer um fórum para as perspectivas alemãs e outras, em temas fundamentais, especialmente em política, cultura e economia, tanto na Europa quanto em outros continentes, com o objetivo de promover a compreensão e o intercâmbio entre culturas e povos."

Linha direta com o Kremlin

Por sua vez, o site em inglês da RT afirma que a emissora russa "é uma organização sem fins lucrativos financiada publicamente a partir do orçamento da Federação Russa”.

Porém, o portal não revela muito mais sobre a RT, seja sobre seu orçamento, sua estrutura ou sobre órgãos responsáveis por sua supervisão. Claro está que não há qualquer menção ao distanciamento em relação ao Estado, como é exigido na Alemanha.

Quando o correspondente da revista americana Time em Moscou Simon Shuster visitou a editora-chefe da RT, Margareta Simonyan, na redação da emissora, em 2015, ele notou na mesa de seu escritório um telefone amarelo de modelo antigo. Ela admitiu que se tratava de uma linha segura com o Kremlin, usada para "discutir coisas secretas".

Simonyan, que está no cargo desde a criação da RT, em 2005, se vê em meio a uma guerra de informação com todo o mundo ocidental. Ela descreveu dessa forma o seu papel: "Defendemos nosso país como faz o nosso Exército."

Já em 2013, o presidente russo afirmara que a RT "não tem como não refletir a posição oficial do governo russo sobre os acontecimentos em nosso país e no resto do mundo".

O especialista em Rússia da Sociedade Alemã de Política Externa (DGAP) Stefan Meister descreve a RT como uma ferramenta de propaganda: "É um instrumento da política externa russa com objetivos bastante específicos. É uma emissora administrada pelo Ministério do Exterior, mas também por outras instituições do Estado".

Licença nem foi pedida

Há diferenças na forma como os dos casos foram tratados nos dois países. Tudo começou com o banimento das transmissões da RT DE na Alemanha por uma agência reguladora independente de mídia, como reza o princípio do distanciamento em relação ao Estado.

A decisão partiu da Comissão de Licenciamento e Supervisão de Mídia de Berlim-Brandemburgo. A proibição foi justificada pela falta da autorização exigida pela lei de imprensa. O requerimento referente, para o início das transmissões, em dezembro, nunca fora feito - talvez por estar claro que não havia o necessário distanciamento do Estado.

A não ser em caso excepcionais, a diretriz para a mídia na Alemanha proíbe a concessão de licenças de transmissão a órgãos de governos, seja da Alemanha, seja do exterior.

A empresa-matriz da RT, a TV Novosti, obteve uma licença de transmissão para a RT DE na Sérvia e achou que isso já bastava. A agência reguladora alemã discordou e argumentou que a proibição se deu por a RT DE ter sua sede e seu estúdio de transmissões em Berlim.

Os jornalistas da RT podem continuar a viver na Alemanha, protegidos pela liberdade de imprensa. Eles frequentam regularmente, por exemplo, as coletivas de imprensa do governo alemão. A RT DE pode também manter seu website e divulgar vídeos, mas não em streaming ao vivo.

Ato claramente político

Na Rússia, os correspondentes estrangeiros têm que se credenciar, num processo muitas vezes obscuro. Na Alemanha a RT DE pode contratar jornalistas e repórteres sem credenciamento.

O anunciou do fechamento do escritório da DW em Moscou e o fim das transmissões para a Rússia foi feito pelo Ministério russo do Exterior. Um ato claramente politico. A justificativa foi que a Rússia estaria reagindo às "ações hostis da República Federal da Alemanha" contra a RT DE.

A Rússia ocupa atualmente na 150ª posição entre os 180 países listados no ranking da liberdade de imprensa.