Por que há tantas crianças refugiadas viajando sozinhas?
2 de outubro de 2015A busca por pistas começa em Hamburgo. Na cidade hanseática, o número de menores desacompanhados – crianças e jovens com idade inferior a 18 anos que viajam sem os pais ou familiares – quadruplicou em apenas um ano. Em 2014, eram 650 menores recém-chegados. Neste ano, até o momento, já foram registrados 2.800.
É claro que, como um todo, o número de refugiados na Alemanha cresceu drasticamente. No entanto, funcionários de abrigos em Hamburgo dizem que esse fato sozinho não explica o aumento de menores desacompanhados.
Não são todas as crianças e adolescentes que perderam seus pais durante a viagem, o que leva a crer que eles tenham embarcado sozinhos nessa jornada. Muitos dos menores, que vêm principalmente de Afeganistão, Síria ou Eritreia, acabam sendo apanhados pela polícia.
O presidente do sindicato dos policiais em Hamburgo, Joachim Lenders, afirma que muitos dos menores desacompanhados não têm documento de identificação. Por isso, as autoridades dependem das próprias habilidades de observação, além das declarações feitas pelos refugiados, para verificar a idade e origem deles.
Segundo ele, ninguém quer ter 18 anos e ser encarado como um adulto, para quem os critérios de asilo são muito mais rigorosos. Parece ter se espalhado a ideia de que menores refugiados desfrutam de uma proteção especial na Alemanha e são menos propensos à deportação.
“Há muitas fraudes. E há rumores de que exista todo um sistema por trás desse fenômeno. Mas não tem como ser provado”, explica Lenders.
Fugindo com uma missão
Na cidade bávara de Rosenheim, cerca de 2.100 menores refugiados estão recebendo cuidados atualmente. “Jovens de 16 e 17 anos vêm direto para cá, e logo perguntam o que fazer para que suas famílias também venham”, diz a parlamentar Daniela Ludwig, da União Social Cristã (CSU).
Parece que, acima de tudo, menores são enviados para a Alemanha na esperança de estabelecer um ponto de apoio, para que, posteriormente, suas famílias possam encontrá-los no país. Tais reuniões familiares são reguladas por um estatuto de residência do refugiado.
“Eu conheço muitos jovens do Afeganistão que estão aqui porque uma vila inteira juntou dinheiro a fim de pagar um traficante de pessoas para trazê-los para a Alemanha”, conta Ludwig, membro da Comissão de Assuntos Internos do Bundestag. “Os cidadãos da aldeia decidem que aquele determinado jovem tem tudo o que é preciso para fazer a viagem até aqui. Assim, quando ele chegar, os cidadãos que ficaram também serão beneficiados.”
"Crianças-âncora"
Esses jovens são chamados de “crianças-âncora” pelos serviços de proteção à criança (CPS) da Alemanha, encarregados de cuidar dos menores desacompanhados. Johannes Fischer, diretor do escritório regional do CPS de Rosenheim, confirma que esses casos são cada vez mais frequentes. Segundo ele, porém, é impossível saber quantos menores viajam por essa razão.
As informações não podem ser coletadas a partir de entrevistas com os refugiados, nem com as autoridades que cuidam deles. "Vamos continuar observando a situação e provavelmente teremos de fazer algo sobre isso”, afirma a parlamentar Daniela Ludwig.
Andrea Lindholz, também parlamentar da CSU, está familiarizada com os casos de “crianças-âncora” e alerta para julgamentos precipitados. “Não podemos dizer se essa é uma tendência ou não", afirma. “O abuso de tais benefícios é mínimo.”
Em breve, será mais difícil para os jovens refugiados manipularem suas idades, já que mudanças nas leis de asilo entram em vigor até o fim do ano. Dados fornecidos por médicos forenses, por exemplo, que são capazes de determinar com maior precisão a idade de pessoas, ganharão mais importância.
De acordo com Andrea Lindholz, a distribuição de menores desacompanhados em todo o país também será regulamentada de forma mais justa, permitindo que os serviços de proteção à criança acompanhem mais adequadamente a situação dos refugiados e atendam com mais eficiência às necessidades dos menores.