Prefeita alemã renuncia após receber ameaças de extremistas
22 de novembro de 2019A prefeita da cidade alemã de Arnsdorf, no estado da Saxônia, renunciou ao seu cargo, nesta sexta-feira (22/11) após receber uma série de ameaças de morte de membros de grupos da extrema direita. As ameaças passaram a ser enviadas após ela ter condenado veementemente o ataquede quatro membros de um grupo local de “milicianos” contra um refugiado iraquiano.
O ataque ocorreu em 2016. À época, a prefeita Martina Angermann, do Partido Social-Democrata (SPD), criticou publicamente as ações dos homens, que se autodenominavam como membros de uma patrulha comunitária. O alvo do ataque tinha problemas mentais e foi amarrado em uma árvore pelos quatro homens.
O julgamento dos quatro autores do crime, que justificaram seu comportamento como de autodefesa, foi interrompido logo depois de seu início, em janeiro de 2017. O juiz responsável pelo caso entendeu que o crime era de pouca gravidade os membros do grupo não foram punidos.
No entanto, a ex-prefeita continuou recebendo ameaças, de acordo com a emissora pública Mitteldeutscher Rundfunk (MDR). Recentemente, ela também foi alvo de um processo por difamação apresentado por um dos membros do grupo.
A emissora afirmou ainda que o partido populista de direita e anti-imigração Alternativa para a Alemanha (AfD) entrou com um pedido para retirar Angermann de seu cargo em outubro, mas, antes dele ser considerado, a política de 61 anos pediu aposentadoria antecipada alegando motivos de saúde. Ela governava Arnsdorf desde 2001.
Detlef Oelsner, um vereador local era um dos membros do grupo que atacou o refugiado iraquiano. À época do episódio, ele era filiado à União Democrata Cristã (CDU), o partido da chanceler federal Angela Merkel. Hoje é membro da AfD, "Mostramos coragem moral e teria feito isso com qualquer pessoa, até mesmo um alemão", disse Oelsner à época.
Após a renúncia da prefeita, o SPD da Saxônia condenou as ameaças contra a ex-prefeita.
"Durante meses ela foi verbalmente atacada, ameaçada e tentam intimidá-la com uma denúncia", afirmou Henning Homann, secretário-geral do SPD. "Não podemos permitir que campanhas de [extrema] direita ponham em causa nossos valores democráticos e a nossa coesão. Tal coisa não deve acontecer."
A ministra da Justiça da Alemanha, Christine Lambrecht, condenou a série de acontecimentos que levaram à renúncia de Angermann.
"Quando as pessoas deixam de se envolver com sua comunidade por causa de ameaças e uma campanha de difamação em curso, então a nossa democracia está em perigo", afirmou Lambrecht, que também é do SPD.
Ela expressou ainda a solidariedade com a prefeita e "todos que dão seu tempo à nossa sociedade todos os dias".
A prefeita entrou em licença médica em fevereiro, depois de apelar repetidamente à Lambrecht por leis mais duras contra crimes de ódio e extremismo. A ministra da Justiça afirmou que o governo planeja endurecer a legislação.
A cidade de Arnsdorf, com cerca de 5 mil habitantes e perto de Dresden, ficou em evidência depois do caso ocorrido em 21 de maio de 2016. Um vídeo mostra vários homens retirando o iraquiano, à época com 21 anos, de um supermercado. O refugiado, que tinha problemas mentais, havia ido ao local duas vezes naquele dia.
De acordo com a polícia, o refugiado comprou crédito para celular no local no dia anterior à agressão e retornou duas vezes à loja no dia seguinte porque estaria tendo problemas para ativá-lo. Nas duas ocasiões, ele foi escoltado para fora por policiais.
Um vídeo capturou o momento em que ele se recusou a cumprir o pedido de uma funcionária para largar uma garrafa de vinho. Os dois também pareceram enfrentar dificuldades de se entender devido ao idioma Ao mesmo tempo, é possível ouvir alguém sugerindo que é preciso chamar a polícia novamente.
Mas, em vez de policiais, desta vez apareceram quatro homens em roupas escuras. Eles agarraram o iraquiano com cabos e, depois, o amarraram a uma árvore fora da loja. A empresa responsável pelo supermercado negou que seus funcionários tenham chamado o grupo de justriceiros.
O vídeo gerou uma grande repercussão nas redes socais. Várias pessoas expressaram choque com a ação. Mas outras parabenizaram os homens que bateram no refugiado e defenderam a formação de milícias comunitárias. À época, no Facebook, as imagens foram compartilhadas em grupos de extrema direita e atraíram diversos comentários xenófobos.
Em setembro, nas eleições para o Parlamento estadual, a AfD se tornou o segundo maior partido da Saxônia, com 27,5% dos votos, logo atrás da União Democrata Cristã (CDU), legenda da chanceler federal Angela Merkel, que obteve 32,1%. O SPD ficou na quinta posição, com 7,7% dos votos.
FC/dpa/epd/ap/ots
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