Prêmio Jabuti destaca traduções da literatura alemã
6 de maio de 2013"Conheço a minha sina." Assim desabafou o filósofo alemão Friedrich Nietzsche em sua autobiografia e última obra literária. "Um dia, meu nome será ligado à lembrança de algo tremendo, de uma crise como jamais houve sobre a Terra, da mais profunda colisão de consciências, de uma decisão conjurada contra tudo o que até então foi acreditado, santificado, requerido. Eu não sou homem, sou dinamite." O trecho faz parte da tradução de Ecce Homo, feita por Paulo César de Souza e laureada com o Prêmio Jabuti em 1996.
Em 2013, em sua 55ª edição, o Prêmio Jabuti escreve um trecho diferente na história. Uma categoria especial foi criada para premiar – exclusivamente – a melhor tradução de obra de ficção do alemão para o português. Além da estatueta e dos 3,5 mil reais – já tradicionais ao ganhador de cada categoria – o vencedor será premiado com uma estada de quatro semanas na Casa do Colóquio em Berlim, na Alemanha, além de uma participação na Academia de Verão de Tradutores, que acontece em agosto do ano que vem, também na capital alemã.
O Prêmio Jabuti é a premiação mais tradicional e prestigiada do Brasil. As inscrições podem ser feitas até o dia 15 de junho e valem apenas para publicações inéditas, editadas no Brasil durante o ano de 2012. A cerimônia de premiação será em novembro.
De acordo com a diretora do Serviço de Informação e Biblioteca para a América do Sul do Instituto Goethe, Stefanie Kastner, a ideia surgiu durante um evento organizado pelo Instituto Goethe para as editoras brasileiras em outubro de 2012. A gerente de marketing e eventos da Câmara Brasileira do Livro, Cristina Lima, em conjunto com o Wolfgang Bader, diretor do Instituto Goethe São Paulo e da regional da América do Sul, trabalharam juntos na elaboração da categoria.
Em entrevista à DW Brasil, tradutores brasileiros que atuam há vários anos no mercado, como Marcelo Backes e Paulo César de Souza, disseram ver o prêmio como boa oportunidade para difundir a literatura alemã. "Acho que a iniciativa é bem-vinda. Qualquer prêmio, sobretudo sendo também monetário, sempre é um incentivo à produção literária, ainda que talvez seu efeito primordial seja apenas quantitativo. Mas da quantidade é mais fácil surgir qualidade. Que o digam os dois mil prêmios literários existentes na Alemanha", comenta Backes.
Fomento à literatura alemã
O Instituto Goethe é um dos principais responsáveis pela difusão da literatura alemã em diversos países, inclusive no Brasil. Há 35 anos, o instituto apoia as publicações arcando com grande parte dos custos das traduções. Em 2012, 14 obras alemãs receberam o apoio do Instituto Goethe e este ano, em função do ano Alemanha no Brasil, foi elaborado um programa especial para fomentar a tradução de 40 obras. O objetivo é também, de acordo com Stefanie, que obras muito importantes da literatura alemã cheguem às livrarias brasileiras.
Backes participou do júri que escolheu os 40 títulos e acredita que o novo programa ajude a sanar parte do déficit da literatura alemã no Brasil, que ainda não tem, por exemplo, obras completas de Goethe, além de alavancar a tradução de obras alemãs no mercado brasileiro. "Alguns clássicos que já deveriam ter sido publicados há tempo, enfim, chegarão às mãos dos leitores brasileiros, e a literatura alemã provavelmente não ficará mais atrás das outras grandes literaturas europeias."
Barreiras da língua
O crescente interesse mundial pela língua alemã interfere positivamente na difusão da literatura alemã no Brasil. Apesar de não ter uma estatística exata, no Instituto Goethe, o número de solicitações de fomento à tradução aumenta a cada ano. Na opinião de Stefanie Kastner, os tradutores têm um papel importante na difusão da literatura alemã no Brasil. "Existem poucas editoras com pessoas que falam alemão. Os tradutores são importantes porque, muitas vezes, sugerem os livros que acham interessantes. Então, eles atuam como editores."
O "preconceito" com a literatura alemã diminuiu, porém, ainda existe, complementa Backes. "Ela continua sendo vítima de alguns preconceitos que a acusam de ser hermética, metafísica demais, pouco narrativa e muito próxima de uma elaboração mais filosófica", diz o tradutor. "Uma vez que o acesso mais amplo à literatura sempre começa com um foco no entretenimento, os alemães acabam penando."