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Quão perigosos são os ataques a usinas nucleares ucranianas?

Mikhail Bushuev
17 de março de 2022

Bombardeios contra Chernobyl e Zaporíjia provocam pânico, não apenas na Ucrânia. Especialista defensora do uso pacífico da energia nuclear pondera os riscos e critica comunicação de crise da liderança política em Kiev.

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Bombardeio contra usina nuclear de Zaporíjia, Ucrânia, em 04/03/2022
Danos a usina de Zaporíjia podem resultar em "cenário Fukushima", afima pesquisadoraFoto: Zaporizhzhya NPP/REUTERS

A usina nuclear ucraniana de Chernobyl precisa de eletricidade, os bastões de combustível radioativo remanescentes ainda têm que ser refrigerados, 36 anos após o acidente. E isso é um problema no contexto da guerra na Ucrânia.

Mal se acabara de restabelecer o abastecimento às instalações bombardeadas na segunda-feira (14/03), a operadora estatal Ukrenergo anunciou que a rede recém-consertada fora novamente danificada pelas forças russas.

Em seu canal no serviço de mensagens instantâneas Telegram, a operadora Energoatomt afirmou que sua equipe não podia continar trabalhando, por estar "física e psicologicamente exausta".

Desde 24 de fevereiro, o exército de Moscou já atacou três usinas nucleares ucranianas, inclusive a maior ainda em funcionamento na Europa, Zaporíjia, em 4 de março. Além disso, segundo a Energoatomt, os invasores teriam posicionado munição próximo ao primeiro reator e a detonado. A DW não pôde verificar essas afirmações.

Em defesa da energia nuclear pacífica

Os ataques às usinas têm como finalidade alastrar temores de uma catástrofe nuclear, explicou à DW Anna Veronika Wendland, coordenadora de pesquisa do Instituto Herder de Pesquisa Histórica sobre a Europa Central-Oriental, que defende o uso pacífico da energia atômica.

Além do jogo do medo, "assumir o controle de objetos de infraestrutura é o segundo fator importante para o lado russo", prossegue a especialista em história da tecnologia e no Leste Europeu. Em sua opinião, o medo internacional que tais ofensivas geram é em parte exagerado ou contraproducente.

Ela acha que o público deveria ser mais bem informado sobre o possível dano e os riscos em relação a Chernobyl, por exemplo. O último reator remanescente no local do desastre foi desativado mais de 20 anos atrás, e "os cerca de 1.900 bastões de combustível que ainda precisam de refrigeração estão fora do reator há quase 21 anos".

Seu calor de desintegração é, proporcionalmente, muito baixo, "de modo que a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e outros peritos concordam que eles não representam perigo agudo", diz Wendland. Além disso, a usina tem um gerador de emergência funcional, movido a diesel, capaz de manter operacionais os sistemas de refrigeração por 48 horas. Se essa fonte falhar, contudo, ainda haverá até 14 dias para restaurar o abastecimento.

Vista aérea da usina nuclear de Cherrnobyl após acidente nuclear (fofo de maio de 1986)
Catástrofe de Cherrnobyl foi primeiro grande acidente nuclear da história (fofo de maio de 1986)Foto: picture-alliance/AP

"Situação inaceitável"

De acordo com um teste de estresse da União Europeia, o pior cenário será se a água da piscina em que estão os bastões irradiados chegar a 70ºC. Por isso a AIEA não considera a situação em Chernobyl agudamente crítica.

Apesar de tudo isso, Anna Veronika Wendland enfatiza que "ocupar uma instalação nuclear, cortar suas comunicações com o mundo externo e com sua instância supervisora, e tomar os funcionários como refém é uma situação irregular e inaceitável".

Por outro lado, ressalva, o perigo é muito maior em Zaporíjia, que está conectada a duas redes de alta voltagem. Lá, o combustível dos sistemas elétricos de emergência duraria de sete a nove dias. Caso estes falhem, o resultado poderia rapidamente ser um cenário semelhante ao da usina de Fukushima, no Japão, em 2011.

Para sua tese de doutorado, Wendland estudou uma usina análoga à de Zaporíjia em Rivne, no noroeste da Ucrânia. No caso de um desastre, os bastões de combustível se aqueceriam a "até 70, 80ºC numa questão de 11 a 15 horas". Ela enfatiza que a situação seria muito mais grave do que a de Chernobyl, mas ainda não se chegou a esse ponto.

Crítica à comunicação de crise de Kiev

A historiadora do Instituto Herder prefere descrever a situação como parte de uma crise de comunicação seguindo-se ao ataque russo contra Zaporíjia, e critica a liderança política da Ucrânia: "Durante a noite, houve uma notícia falsa atrás da outra: o ministro do Exterior, Dmytro Kuleba, e o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, se saíram com palavras muito grandes."

"Falou-se de um mega-acidente nuclear, na escala de seis Chernobyls. Eu compreendo que o governo em Kiev se encontra sob enorme pressão, está gritando por socorro. Mas tomadores de decisões e líderes como esses têm que saber que não é assim que se pratica comunicação de crise."

Wendland diz estar segura que resultado foi que "o povo da Alemanha começou a procurar comprimidos de iodo nas farmácias". "No fim das contas", afirma a partidária da energia nuclear, "isso só vai resultar num efeito de dessolidarização, do tipo: 'Cara Ucrânia, por favor, pare de oferecer resistência, para a gente não ter que sofrer nenhuma dor.'"