Reforma tributária esbarra em interesses de estados e municípios
5 de julho de 2013Considerada urgente por economistas e defendida há anos por empresas, uma reforma que simplifique o complicado sistema brasileiro de impostos esbarra principalmente na oposição de estados e municípios, que temem perder dinheiro.
"Estados e municípios temem perder o seu poder de tributar, o que é um poder fantástico, porque quem o possui também tem o poder de fazer concessões na tributação", ressalta o economista Flávio Castelo Branco, da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
O sistema tributário brasileiro tem uma série de impostos parecidos, cobrados, ao mesmo tempo, pelos governos federal, estadual e municipal. A complexa taxação, segundo especialistas, acaba prejudicando a economia, pois desestimula empresas a produzirem no país e diminui a competitividade internacional dos produtos brasileiros, que se tornam mais caros.
"Esse sistema complexo exige das empresas um gasto e um esforço de acompanhamento das obrigações muito grande, além da carga tributária ser elevada. Ele penaliza as exportações e investimentos, gera custos elevados e afeta a competitividade", afirma Castelo Branco.
O consumidor também sai prejudicado, pois os impostos são adicionados ao preço final dos produtos. "Um sistema tributário fácil, desburocratizado, transparente e equilibrado, em termos de impostos diretos e indiretos, é benéfico para toda a sociedade, tanto para as empresas como para o cidadão", diz o especialista em administração pública José Matias-Pereira, da Universidade de Brasília (UnB).
Impostos sobre impostos
No Brasil, existem mais de 80 tributos diferentes, cobrados sobre produção, consumo, movimentações financeiras, renda, entre outros. Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), o brasileiro trabalha em média 150 dias por ano, ou seja, quase cinco meses, só para pagar impostos.
A maioria dos impostos é tributada sobre o consumo e não sobre a renda, diferentemente de muitos países europeus. Com essa forma de cobrança, quem ganha menos acaba, proporcionalmente, pagando mais impostos do quem possuiu uma renda maior.
"A tributação mais perversa e injusta é a sobre consumo, pois quem ganha menos paga mais. Numa reforma esses tributos sobre consumo deveriam ser retirados e deveria se tributar mais renda, patrimônio e lucros", afirma o presidente do IBPT, João Eloi Olenike.
Para economistas, o primeiro passo para uma reforma é justamente diminuir o número de impostos referentes à tributação indireta, ou seja, aqueles cobrados sobre a circulação de mercadorias e pagos pelos produtores e consumidores.
"O ideal seria ter algo tipo um IVA (Imposto sobre o valor adicionado) único, e depois a repartição entre governo, estados e municípios seria feita de outra forma", sugere Castelo Branco.
Para Matias-Pereira, os dois impostos principais que deveriam ser agregados a um IVA seriam o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), em nível federal, e o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), no nível dos estados.
Castelo Branco acrescenta que o IVA deveria também englobar o PIS-Cofins e também o ISS (Imposto sobre Serviços de qualquer natureza), cobrado pelos municípios.
Passos para a reforma
Para Matias-Pereira, a questão de como e quem cobrará esses impostos acaba entrando na discussão e estados mais ricos, liderados por São Paulo, assumem uma postura de defender seus interesses e a reforma não avança. "Para a reforma tributária acontecer, todos os atores têm que sentar na mesa predispostos a ceder e buscar, se necessário no futuro, um processo de compensação para eventuais perdas", afirma o especialista.
Devido aos conflitos de interesses, Castelo Branco acha que o caminho para uma mudança seria uma reforma feita por partes. "Mas não é uma reforma desconectada, é como se fossem peças de um quebra-cabeça montadas aos poucos. Para isso, é necessário saber muito bem o que se quer e as ações que devem ser feitas", argumenta.
Paulo Rabello de Castro, coordenador-geral do Movimento Brasil Eficiente (MBE), tem uma opinião contrária. O MBE luta pela simplificação fiscal e eficiência dos gastos e defende que a reforma deve ser feita em conjunto.
Na proposta defendida pelo MBE, o primeiro passo para uma reforma seria a diminuição na quantidade de tributos, por meio da unificação dos impostos, mas sem a redução da arrecadação. "A tributação não pode ser diminuída, pois não haveria dinheiro para pagar educação, funcionários da saúde e assim por diante", defende Castro.
O próximo passo seria um controle mais eficiente dos gastos. A redução de desvios, desperdícios e corrupção possibilitaria a diminuição da carga tributária. "Á medida em que houver economia no gasto, vai se abrindo espaço para que a carga tributária caia sem cair a arrecadação porque o país está crescendo está subindo, mas o peso diminuiu frente ao que o país produz", diz Castro.
Paralisia política
A dificuldade de modificar o sistema tributário é percebida pela quantidade de propostas que esperam para serem votadas na Câmara dos Deputados e no Senado – ao todos são 11, uma delas sugerida em 1992.
"Não há interesse do governo em fazer uma reforma tributária, desde o governo Fernando Henrique já se fala disso. O governo entende que, se fizer uma reforma tributária, ele pode vir a perder a arrecadação e, se está arrecadando bem, por que fazer uma reforma?", resume Olenike.