Paquistão x EUA
2 de fevereiro de 2012A relação entre o Paquistão e os Estados Unidos é turbulenta. E fica ainda mais complicada desde que um relatório secreto da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) revelou que forças de segurança paquistanesas apoiam o Talibã no Afeganistão.
Islamabad e Washington mantinham parceria estreita na década de 1980, pelo menos até a retirada do Exército Vermelho do Afeganistão, em 1988-1989. Aí os EUA perderam o interesse. Somente após os ataques de 11 de setembro de 2001, o Paquistão ganhou novamente a atenção norte-americana – principalmente como rota de abastecimento na batalha contra o Talibã e a Al Qaeda.
O Paquistão consentiu essa nova cooperação estratégica, mas sem entusiasmo, pois tinha boas relações com o regime talibã e, até hoje, persegue seus próprios objetivos econômicos no país vizinho.
"O outro interesse do Paquistão é ter a chamada 'profundidade estratégica' no Afeganistão. Trata-se de estabelecer no Afeganistão um governo que corresponda aos interesses paquistaneses", explica Conrad Schetter, especialista para o sul da Ásia. Por isso, o Paquistão não teria interesse em agir com todas as forças contra os talibãs, seus antigos aliados.
A profundidade estratégica no Afeganistão significa um território para retirada para o Exército paquistanês, no caso de uma guerra com a Índia. Três guerras já abalaram as duas potências nucleares. Até hoje as disputas fronteiriças não foram solucionadas. A rivalidade entre os países tem potencial para décadas de conflito.
Aliados contra a Índia
A estratégia atual de Islamabad é buscar uma cooperação estreita com as forças fundamentalistas, diz o paquistanês Rahimullah Yusufzai, especialista em terrorismo. O Paquistão parte do princípio de que os fundamentalistas são contra a Índia, por ela não ser um país de maioria muçulmana.
Em caso de uma nova guerra com a Índia, Islamabad quer ter o Afeganistão como aliado. Por isso os talibãs – com seu objetivo de estabelecer uma teocracia na cordilheira do Hindu Kush – se encaixam, bem nos planos paquistaneses.
Trata-se de uma política, que, segundo Yusufzai, o Ocidente não consegue ou não quer entender. "A divergência de opiniões entre o Paquistão e os EUA, assim como o resto do Ocidente, persiste na política contra o Talibã. O Paquistão busca uma solução política e quer negociar com o Talibã. Além disso, o Paquistão quer desempenhar um papel decisivo nessas negociações. Os EUA, porém, continuam querendo derrotar o Talibã", diz Yusufzai.
Claras exigências dos EUA
Enquanto isso, o governo dos EUA também aposta em negociações. Mas antes disso, os talibãs devem se distanciar da rede terrorista da Al Qaeda. Cerca de 100 mil soldados norte-americanos baseados no Afeganistão devem conduzir o Talibã a negociações de paz. Os maciços ataques de intimidação às áreas dos extremistas no Paquistão fazem parte da estratégia dos EUA.
A mensagem estadunidense é clara: uma cooperação entre o Paquistão e os terroristas não será tolerada. Segundo o cientista político Jochen Hippler, o recado já chegou a alguns funcionários do governo em Islamabad.
No entanto, especialistas duvidam que o governo paquistanês esteja em condição dar uma guinada de 180 graus em sua trajetória política. O exército paquistanês é poderoso, e seu serviço secreto, influente, por vezes até mesmo dominante.
Por outro lado, o país não quer abrir mão da ajuda anual bilionária de Washington. O governo em Islamabad opera, portanto, um perigoso jogo duplo, para manter, ao mesmo tempo, a benevolência dos aliados fundamentalistas e do governo norte-americano, acreditam certos analistas. Um jogo que, aparentemente, os EUA não estão mais dispostos a tolerar.
Parceria difícil
Mas para mudar a maneira de pensar do Paquistão, Washington precisaria ter muita paciência, considera Hennig Riecke, especialista em assuntos norte-americanos do Conselho Alemão de Relações Exteriores. Eas opções disponíveis não são muitas: "Os norte-americanos tentam exercer mais pressão sobre o Paquistão. Ao mesmo tempo, também sabem que, se a pressão se tornar excessiva, e o frágil governo em Islamabad perder o chão, o estrago será muito maior. Então, as forças islâmicas provavelmente prevaleceriam", diz Riecke. E isso os Estados Unidos tampouco desejam, é claro.
Washington e Islamabad possuem, portanto, interesses diferentes na luta contra o Talibã e a Al Qaeda no Afeganistão. No entanto, ambos permanecem dependentes um do outro, na difícil parceria que os une. Esse casamento forçado fica agora ainda mais difícil, depois do novo relatório da Otan.
Autor: Ratbil Shamel (lpf)
Revisão: Augusto Valente