Relações teuto-brasileiras: entre amizade e proibição
27 de março de 2015Quais eram os objetivos do governo Getúlio Vargas?
A Era Vargas começou com a Revolução de 1930. Getúlio Vargas tornou-se presidente do Brasil depois de um golpe de Estado. Seu governo seguiu, de início, objetivos democráticos. Entretanto, sob o argumento de ter que combater o "perigo comunista", Vargas dissolveu o Congresso Nacional em 1937, acabou com todos os partidos políticos e outorgou uma nova Constituição. Ele fundou o chamado Estado Novo, dando início aos anos mais autoritários de seu governo.
O Estado Novo surgiu no Brasil num momento em que também na Europa havia vários regimes autoritários. Vargas, considerado um governante populista, inspirava-se, inclusive, nos sistemas de governo da Itália e de Portugal.
"A ditadura Vargas nunca foi fascista", afirma Jens Hentschke, professor de História e Política Latino-Americanas da Universidade britânica de Newcastle. O Estado Novo, diz ele, era uma "ditadura autoritário-corporativista", ou seja, um governo absolutista, por um lado, mas que, por outro, abria espaço para determinados grupos sociais participarem de decisões políticas. Assim sendo, Vargas destruiu organizações políticas autônomas, mas, ao mesmo tempo, fundou sindicatos.
Em seu governo, Vargas também introduziu o salário mínimo, criou o Código Penal e instituiu a Previdência Social, a Carteira de Trabalho e o direito a férias – medidas que vigoram até hoje. Aos olhos de muitos brasileiros, Vargas deixou uma herança política respeitável, embora tenha modificado de maneira dramática o destino de muita gente, como o da vó Nena.
Quais foram as consequências da proibição da cultura alemã no Brasil?
Até 1942, o Brasil mantinha relações amistosas com a Alemanha – tanto do ponto de vista econômico, quanto político, tendo inclusive implicações desastrosas. Houve "colaboracionismo político" no caso de judeus comunistas deportados para a Alemanha, afirma a historiadora Ana Maria Dietrich. Um deles foi Olga Benário Prestes. Além disso, a correspondência pessoal mostra que Vargas era simpático a Hitler, a quem chama de bom e fiel amigo.
No entanto, o Estado Novo de Vargas era um projeto político, no qual não havia lugar para diversidade cultural. "A homogeneização das diferenças étnicas e linguísticas foi estabelecida como meta", afirma Hentschke.
Por isso, Vargas proibiu, em 1938, todos os partidos estrangeiros, entre eles o Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDAP), nazista, que tinha vários membros no Brasil. "Na mentalidade das autoridades nazistas, uma vez que o partido representava a Alemanha, o Brasil se tornou inimigo da Alemanha ao proibi-lo", escreve Dietrich em seu livro Nazismo Tropical? O Partido Nazista no Brasil.
A nacionalização das escolas foi outra tarefa vista por Vargas como importante. Todas as escolas estrangeiras em território brasileiro foram obrigadas a mudar seus nomes e a ministrar aulas em português. E todos os diretores tinham que ser brasileiros. A Deutsche Schule (Escola Alemã) em São Paulo, frequentada pela vó Nena, passou por diversos ajustes às leis de ensino brasileiras, mas conseguiu, a princípio, manter as aulas em alemão.
No entanto, em 1942, quando o Brasil declarou guerra ao Eixo (Alemanha, Itália e Japão), aumentou a pressão sobre as comunidades de língua estrangeira. O ex-diretor da Deutsche Schule, Gustaf Adolf Hoch, foi preso ao lado de 11 outros professores alemães. As aulas em alemão foram totalmente suspensas, e a escola ganhou outro nome: Instituto Visconde de Porto Seguro. Para a vó Nena e vários de seus colegas, foi impossível concluir os estudos em português.
Entretanto, as medidas nacionalistas de Vargas não se voltaram somente para as escolas. Quando o Brasil se posicionou do lado dos Aliados, os alemães que ocupavam posições estratégicas no país – em companhias aéreas, por exemplo – foram simplesmente demitidos. Eles passaram a precisar de uma permissão especial para mudar de casa ou para viajar pelo país. Era proibido ouvir rádio em alemão ou falar a língua em público. Todas as atividades culturais eram submetidas à censura, e igrejas alemãs luteranas foram incendiadas.
E como ficou a situação depois da guerra?
Quando a Segunda Guerra estava por acabar, a ditadura Vargas foi perdendo força e apoio político. Os mesmos militares que tinham estado várias vezes ao lado do presidente durante seus 15 anos de governo o depuseram no dia 29 de outubro de 1945.
Quando a guerra chegou ao fim, o projeto de nacionalização conduzido por Vargas também terminou. "A guerra resultou numa Alemanha destruída e dividida, cujas relações internacionais foram sendo reconstruídas pouco a pouco", afirma Hentschke. Em 1951, Brasil e Alemanha reataram relações diplomáticas.
Nesse momento, Vargas era presidente do país novamente, tendo dessa vez sido eleito diretamente. "Fui um ditador, porque a realidade do país me conduziu à ditadura", dizia ele. "Mas agora quero ser um presidente constitucional."
Entre os membros da comunidade alemã, muitas vezes ainda é tabu falar sobre o que aconteceu entre os anos 1930 e 1940. No entanto, hoje a cultura alemã é respeitada e apreciada no país, sendo o Brasil o principal parceiro comercial da Alemanha na América Latina. Muitos brasileiros aprendem alemão com o intuito de estudar ou trabalhar na Alemanha. Blumenau, fundada por alemães em 1850, organiza a segunda maior Oktoberfest do mundo.