Responsabilidade social
23 de março de 2007Paulo Tonicelli, presidente da subsidiária alemã Prensas Schuler, em Diadema (SP), não pára de contar o que sua empresa faz de bom pelos empregados e pela comunidade. Ela realiza campanhas de agasalho, doa equipamentos para o corpo de bombeiros, mantém em seu terreno uma horta comunitária que sustenta um lar para crianças e idosos, garante a participação dos empregados nos lucros e muito mais.
A lista das atividades que a Prensas Schuler realiza no âmbito da responsabilidade social empresarial (RSE) é tão extensa que impressionou até o presidente alemão, Horst Köhler, em visita à empresa há duas semanas.
"Os seus lucros são tão altos que você consegue pagar tudo isso?", perguntou Köhler a Tonicelli. Na Alemanha, sempre se diz que isso reduz a competitividade internacional das empresas, disse Köhler.
Tonicelli argumenta numa outra direção. "Naturalmente não podemos medir o benefício resultante de cada uma destas medidas. Mas a motivação dos empregados aumenta e isso gera melhores resultados", explica.
A Prensas Schuler, instalada no Brasil desde 1965, intensificou seu engajamento social a partir de 1995/1996, após um conflito trabalhista. A situação dentro e ao redor da fábrica em Diadema era tensa. "Só tínhamos uma opção: aumentar a altura dos muros ou ajudar a comunidade. Optamos por ajudar e, assim, conseguimos puxar os funcionários e os moradores para o nosso lado", conta Tonicelli.
A empresa, "com capital 100% alemão e mão-de-obra 100% brasileira", mostra que a RSE e o sucesso nos negócios não se excluem. Com 981 funcionários e prestadores de serviços, a fabricante de prensas para a indústria automobilística faturou 130 milhões de dólares em 2006 (57% obtidos com as exportações).
A Prensas Schuler não é a primeira nem a única empresa a investir no social. As paredes do salão de atos da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha (AHK) em São Paulo estão cobertas de painéis sobre atividades de RSE desenvolvidas pelas mais de mil subsidiárias alemãs instaladas no estado, mas também por companhias brasileiras.
"Fomos a primeira empresa no mercado brasileiro a desenvolver motores com baixíssimas eimssões de CO2", lembra o presidente da Volkswagen do Brasil, Thomas Schmall. Nos últimos dez anos, a empresa também investiu dois milhões de reais num programa de tratamento e ajuda a funcionários e familiares portadores do vírus da aids.
A Bosch, por exemplo, financia um programa de profissionalização de adolescentes até 20 anos, atendendo 21 mil pessoas só na região de Curitiba. A Henkel investiu 160 mil euros em 2006 em projetos sociais apresentados por seus funcionários.
O presidente do conselho administrativo da Faber-Castell, Wolfgang Anton Faber-Castell, diz que a RSE há décadas faz parte dos estatutos da empresa, que fabrica material escolar, como lápis, a partir de madeira de reflorestamentos. No ano passado, a empresa cortou relações com um fornecedor brasileiro acusado de usar trabalho infantil.
Segundo Rolf Dieter Acker, presidente da Basf para a América do Sul, a RSE quebra o paradigma de empresa "geradora de lucro" para "geradora de riqueza". "Nesse sentido, gera riqueza para si, para a sociedade, utiliza os recursos naturais de forma a deixá-los às gerações futuras e contribui para aumentar a riqueza do país", afirma.
Assistencialismo?
Segundo Reiner Rademacher, representante da Fundação Friedrich Ebert (FES), que há 30 anos apóia entidades sindicais brasileiras, muitas empresas, no entanto, ainda vêem a RSE apenas como ferramenta de marketing. "Virou moda os empresários dizerem que são socialmente engajados."
Ele acha também que muitas atividades de RSE "fomentam o assistencialismo, enquanto nas fábricas, às vezes, as relações de trabalho remontam ao século 19. Não há no Brasil uma cultura empresarial de diálogo com os trabalhadores e com a sociedade", diz. A própria Schuler ficou muitos anos sem conversar com o sindicato, depois do conflito de 1995, diz.
Pressão da sociedade
Um estudo realizado no ano passado pelo Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social mostra a maior ou menor presença de algumas áreas nos padrões, normas, referências, diretrizes e práticas de RSE no Brasil.
Em primeiro lugar, aparece a área de meio ambiente (25%), seguida pelos direitos das relações de trabalho (21%), ética e transparência (16%), direitos humanos e diálogo (ambos com 11%), proteção das relações de consumo (9%) e governança corporativa (7%).
Segundo o Ethos, este quadro resulta da pressão da sociedade em torno de questões prioritárias a serem atendidas pelas empresas, por exemplo, proteção ao meio ambiente e respeito aos direitos humanos, ou porque o assunto ganha crescente destaque no processo de internacionalização, como governança corporativa ou proteção dos consumidores.
Um perfil social, racial e de gênero das 500 maiores empresas do Brasil, traçado também pelo Instituto Ethos, aponta que ainda há grandes desigualdades nesses aspectos, "mas há avanços, ainda que pequenos, a registrar".
Paulo Tonicelli, da Prensas Schuler, admite que não pensa só em filantropia quando ajuda a comunidade de Diadema. A responsabilidade social faz parte do negócio, diz. Além disso, acrescenta, "no contexto social brasileiro, não é confortável para empresa alguma viver numa ilha de prosperidade".