Sanções dos EUA fortalecem Maduro, dizem especialistas
11 de março de 2015As já complicadas relações entre Estados Unidos e Venezuela parecem ter atingido seu ponto mais agudo nos últimos dias. Alegando "emergência nacional", a Casa Branca aplicou sanções a membros do governo Nicolás Maduro, que respondeu convocando seu máximo representante diplomático em Washington para consultas.
Para analistas políticos ouvidos pela DW, ao mesmo tempo em que são uma forma de pressão sobre a Venezuela, as sanções podem se encaixar bem no discurso de Maduro, que se vende como uma voz de resistência ao "imperialismo americano".
"As sanções podem ser entendidas como uma reação à crescente brutalidade dos atos de Maduro contra a oposição, mas são também combustível para o discurso do presidente, que se define como combatente da resistência contra o sempre ameaçador imperialismo dos EUA", opina Thorsten Benner, diretor do instituto alemão GPPI.
Discurso mais agressivo
A classificação por parte de Obama da situação na Venezuela como um risco para a segurança dos EUA é necessária para que o governo americano possa decretar sanções contra determinados indivíduos.
Obama acionou uma lei aprovada pelo Congresso americano, no ano passado, que permite punir indivíduos por determinados atos, mas não o país. Assim, as sanções americanas se dirigem a sete funcionários ligados, principalmente, à polícia, ao Exército e à Justiça da Venezuela.
Segundo Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), as sanções são bem-recebidas pelo governo venezuelano, que se serve desse tipo de medidas ou ameaças para legitimar a repressão.
"A decisão dos EUA tornou isso mais fácil para Maduro agora", diz Stuenkel, explicando que isso dificulta ainda mais o diálogo com a oposição – e com os EUA.
O especialista diz que a postura "relativamente agressiva" dos EUA frente à Venezuela fará com que Caracas continue acusando a oposição de cooperar com Washington e querer derrubar o governo Maduro.
Para Javier Ciurlizza, diretor para a América Latina e Caribe do think tank independente International Crises Group, as sanções são também o produto da incapacidade de outros órgãos e mecanismos que deveriam ter ajudado a resolver a crise: "Elas alimentam o discurso anti-imperialista do governo de Caracas e convertem uma crise nacional num problema bilateral entre Washington e Caracas, algo que não é."
Falta de mediação
O diálogo entre oposição e governo na Venezuela está estagnado desde meados do ano passado. O país enfrenta a maior crise do governo Maduro – no poder desde a morte, há dois anos, de Hugo Chávez
A Venezuela vive hoje grave crise econômica, com escassez de produtos básicos e a mais alta inflação da América do Sul, e enfrenta novamente o fantasma do golpe de Estado, o que amplia a tensão política em torno de Maduro.
As tensões políticas se acentuaram sobretudo depois da prisão arbitrária do prefeito de Caracas, o opositor Antonio Ledezma, e da morte do adolescente Kluivert Roa, baleado pela polícia durante um protesto contra o governo no estado ocidental de Táchira.
Oliver Stuenkel afirma que é importante a realização de eleições parlamentares livres e justas – os venezuelanos vão às urnas para renovar o Congresso no segundo semestre. Segundo o especialista, o grande problema é que no país não há atores neutros que possam ser considerados legítimos.
E, ao tomar partido contra o governo, afirma Stuenkel, os EUA perdem assim a possibilidade de mediar um diálogo entre o governo e a oposição.
"As sanções unilaterais dos EUA não são nem serão solução para o grave problema que a Venezuela enfrenta em termos políticos, sociais e econômicos", diz Ciurlizza, do International Crises Group.
Com os EUA praticamente descartados de qualquer papel mediador e a União Europeia com as relações desgastadas com Caracas, é no Brasil que observadores apostam como possível mediador.
Na semana passada, no entanto, uma visita de chanceleres da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) a Caracas, com a presença do ministro brasileiro Mauro Vieira, não produziu resultados.
"É o único país da região que tem os meios, os interesses e o potencial para pressionar as partes a chegarem a um consenso. O Brasil tem grandes investimentos na Venezuela, e o governo brasileiro tem estado perto do chavismo, em geral, mas não assume esse papel", destaca Ciurlizza.