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Schalke 04 dá cartão vermelho para Gazprom

Gerd Wenzel
Gerd Wenzel
8 de março de 2022

Em 2006, clube comemorava parceria milionária com os russos, mas a partir de 2014 torcedores começaram a se opor a esse patrocínio. Guerra na Ucrânia foi a gota d’água que faltava para a rescisão do contrato.

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Tönnies e Putin segurando camiseta do Schalke 04 no anúncio da parceira entre o clube e a Gazprom, em 2006
Tönnies e Putin comemoram parceira entre o Schalke 04 e a Gazprom, em 2006Foto: Dmitry Astakhov/dpa/picture-alliance

Tudo começou em 2006. O bilionário Clemens Tönnies, dono da maior processadora de carnes da Alemanha, começava a costurar o acordo entre o Schalke 04 e a Gazprom, gigante estatal russa de gás natural. Na época Tönnies era o todo poderoso chefão do Schalke e não fazia segredo de suas boas relações com Vladimir Putin, presidente da Rússia.

A assinatura do contrato de patrocínio que garantia ao Schalke 04 o aporte de 10 milhões de dólares por ano até 2021 foi comemorada com pompa e circunstância num hotel cinco estrelas de Dresden, cidade onde Putin serviu como agente da KGB nos anos 1980. Circularam fotos na mídia alemã com Tönnies e Putin sorridentes celebrando o acordo e juntos segurando uma camisa dos azuis reais. No cardápio do regabofe comemorativo, o prato principal foi joelho de porco, tradicionalíssima especialidade alemã muito apreciada pelo autocrata russo.

Os russos eram considerados parceiros ideais contanto que questões políticas sensíveis como a violação dos direitos humanos na Rússia fossem deixadas de lado. Para Tönnies e o "seu" Schalke isto não era problema, afinal só se tratava de futebol e muito dinheiro, que é a única coisa que interessa para homens de negócios.

Nos anos seguintes ao acordo, Tönnies fortaleceu seu relacionamento com Putin e não deixava escapar uma oportunidade sequer para elogiar com todas as letras o seu principal patrocinador, a Gazprom. Tudo isso sob as vistas grossas da diretoria do clube daqueles tempos.

As primeiras vozes dissonantes contrárias a essa parceria vieram das arquibancadas.

Em 2014, pouco antes da anexação da Crimeia pela Rússia, um grupo de torcedores manifestou sua insatisfação pelos rumos do clube e deu vazão aos seus sentimentos na tradicional revista Schalker Unser: "Somos contra este relacionamento com Putin. Somos um clube de princípios democráticos e damos muito valor à liberdade de expressão. Não deveríamos servir aos propósitos de um autocrata que está infringindo a soberania da Ucrânia no leste do país". Sábias palavras ditas em 2014 por Roman Kolbe, porta-voz da revista e do grupo de torcedores.

A insatisfação com o patrocinador russo foi só aumentando e com a saída de Tönnies do Conselho Administrativo em 2019, novos ventos começaram a soprar em Gelsenkirchen o que, entretanto, não impediu que o clube renovasse o contrato com a estatal russa em 2021 por mais quatro anos.

A Gazprom, o maior fornecedor de gás da Alemanha, é também o maior patrocinador do Schalke. Nos últimos 15 anos aportou 150 milhões de dólares aos cofres do clube e calcula-se que pelos próximos quatro anos entrariam mais 50 milhões de dólares. Nada mal para um time que está na segunda divisão e tem uma dívida consolidada de aproximadamente 220 milhões de dólares, de acordo com a revista alemã Der Spiegel.

Diante desse cenário financeiro, chega a ser surpreendente a decisão da diretoria de rescindir o acordo de cooperação com a Gazprom, mas, pensando bem, não lhe restava outra alternativa.

A opinião pública na Alemanha é massivamente contrária à invasão da Ucrânia pela Rússia e centenas de milhares de pessoas foram às ruas das cidades alemãs no último fim de semana para pedir o fim da guerra. Uma das cidades onde também houve protestos foi Gelsenkirchen, casa do Schalke 04.

Bernd Schröder, diretor executivo do clube, em entrevista para o jornal Süddeutsche Zeitung, explica: "Para mim, de repente, ficou claro que não daria para continuar. Não havia outra alternativa. O dano para o clube já tinha se tornando muito grande. Não consigo mais imaginar a Gazprom como parceira do Schalke 04".

Menos mal que o clube já tenha conseguido fechar um acordo temporário com a Vivawest, uma empresa regional do ramo imobiliário, que passa a ser o principal patrocinador dos azuis reais.

O executivo da empresa Uwe Eichner se manifestou a respeito: "É nosso dever apoiar o Schalke. Os terríveis acontecimentos na Ucrânia exigem de nós determinação e solidariedade. Foi nesse sentido que estabelecemos nossa parceria baseada em valores que compartilhamos".

O Schalke se livrou de um patrocinador repentinamente indesejado e lhe mostrou o cartão vermelho. A bem da verdade não foi o único cartão vermelho desta tumultuada primeira semana de março.

Depois da derrota frente ao Hansa Rostock sábado último, o técnico Dimitrios Grammozis também levou cartão vermelho. Foi demitido de imediato e assumiu o treinador assistente Mike Büskens. Vai dirigir o time até o final da temporada que tentará voltar à Bundesliga.

O Schalke 04 se assemelha a um grande canteiro de obras com problemas para tudo quanto é lado. Ao menos o financeiro parece estar encaminhado, mas o esportivo é de amargar e não é de hoje, para tristeza geral da fiel torcida azul real.

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Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991 na TV Cultura de São Paulo, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Atuou nos canais ESPN como especialista em futebol alemão de 2002 a 2020, quando passou a comentar os jogos da Bundesliga para a OneFootball de Berlim. Semanalmente, às quintas, produz o Podcast "Bundesliga no Ar". A coluna Halbzeit é publicada às terças-feiras. 

O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.

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Halbzeit

Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Na coluna Halbzeit, ele comenta os desafios, conquistas e novidades do futebol alemão.