"Trabalho de Levy foi minado dentro e fora do governo"
18 de dezembro de 2015O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, foi substituído nesta sexta-feira (18/12) por Nelson Barbosa, que estava no Ministério do Planejamento.
Marcos Troyjo, diretor do BricLab da Universidade de Columbia, nos EUA, acredita que Levy era o nome certo na hora certa, principalmente levando em conta a necessidade do Brasil atingir o reequilíbrio fiscal como precondição para retomada do crescimento econômico.
"Os possíveis 'planos de voo' em termos de política econômica para um período pós-Levy não comportam muitas variações – a não ser realmente que o governo tivesse uma recaída intervencionista e decidisse implementar uma versão 2.0 da danosa 'nova matriz econômica' que causou tantos estragos país durante o primeiro mandato de Dilma", diz Troyjo.
DW Brasil: O Orçamento de 2016 foi aprovado, e nele houve a redução da meta fiscal de 0,7%, defendida pelo ministro Levy, para 0,5% do PIB, como defendido pelo Planalto. O que isso vai significar para o restabelecimento do crescimento da economia?
Marcos Troyjo: Muito pouco. Creio que o governo está superestimando o potencial multiplicador que esses 0,2% da meta fiscal podem representar para a retomada do crescimento. Entendo que essa fatia não economizada tem mais a ver com dois outros pontos. Por um lado, a necessidade do Planalto não ser visto como "destruidor" de programas de alívio à pobreza, como o Bolsa Família. Por outro, o governo federal dá um "refresco" ao passivo de estados e municípios, o que supostamente fortalece a base política da presidente num momento em que ela precisa de todo apoio possível.
O Orçamento também conta com uma arrecadação de 10 bilhões de reais com uma possível volta da CPMF a partir de setembro, o que pressupõe que o Congresso deverá aprovar a recriação do tributo até maio. Você acredita que o governo conseguirá aprovar o tributo?
Isso vai depender da dinâmica parlamentar do processo de impeachment. Caso o cenário de impedimento seja afastado antes de maio, o governo se sentirá revigorado para tentar impor sua agenda – na qual a aprovação da CPMF ocupa importante espaço. Caso o impeachment ainda paire pelo ar por volta de maio, vejo como difícil a implementação da CPMF.
Quais serão as consequências de uma possível CPMF para uma economia já fragilizada?
Creio que o imposto pode até trazer algum alívio de médio prazo às contas do governo, mas, no que toca à volta do crescimento, a CPMF mais atrapalha do que ajuda. A medida esfriará ainda mais o ânimo dos empresários para alocar recursos à atividade produtiva, o que significa deprimir ainda mais o já baixo nível de investimento como percentual do PIB.
Quais são os ganhos e perdas para a economia com a saída do ministro?
Levy era o nome certo na hora certa – sobretudo se considerarmos a necessidade de um ambicioso reequilíbrio fiscal como precondição à retomada do crescimento. Seu trabalho, no entanto, foi minado dentro e fora do governo. Ele jamais deixou de ser um "estranho no ninho" – e, por isso, o alcance de sua passagem pelo governo foi bastante limitado.
O cálculo de ganhos e perdas com a sua saída não é apenas função deste ou daquele nome, mas sobretudo do grau de apoio e autonomia com que o futuro ministro contará para realizar seu trabalho.
Como seria o país pós-Levy?
Os possíveis "planos de voo" em termos de política econômica para um período pós-Levy não comportam muitas variações – a não ser realmente que o governo tivesse uma recaída intervencionista e decidisse implementar uma versão 2.0 da danosa "nova matriz econômica", que causou tantos estragos país durante o primeiro mandato de Dilma.
É claro que nomes de peso como alguns que se vêm aventando por aí, como Otaviano Canuto ou Henrique Meirelles, gozam de imenso prestígio no exterior e no Brasil – e isso ajudaria muito na formação de expectativas mais positivas. No entanto, o critério mais determinante do sucesso do próximo ministro será o grau de autonomia e apoio com que ele trabalhará.
Quando a economia brasileira vai realmente se recuperar?
Quando, para além dos ajustes macroeconômicos – que são essenciais e urgentes –, o Brasil também mexer em sua "economia política". Ou seja, quando adotar um modelo menos baseado em consumo e mais alimentado por poupança e investimento; menos baseado no papel do governo e mais no da iniciativa privada; quando direcionar mais recursos à inovação e facilitar a vida dos empreendedores; quando abandonar a atual visão autárquica de comércio e política industrial e passar a costurar acordos internacionais que lhe permitam inserir-se de forma competitiva nas chamadas "redes globais de produção".
Apesar da crise política, existe um espaço para reformas mais amplas?
Por vezes, as crises são grandes catalizadores de mudança. Acho que um dos corolários desta crise pode ser uma maior conscientização quanto à premência de uma agenda reformadora. Parte dela foi iniciada no governo Fernando Henrique Cardoso, e mesmo no primeiro mandato de Lula vimos alguma coisa, como a implementação da Lei de Recuperação Judicial. Ambos os movimentos, contudo, restaram incompletos. Não consigo ver reformas mais profundas sob a batuta de um governo Dilma. Para maiores inflexões estruturais, julgo necessário uma mudança na titularidade do Planalto.
O que deveria ser mudado na política fiscal para o Brasil poder crescer rapidamente?
Realizar profundos cortes nas despesas do governo – acompanhados de uma atitude junto ao Congresso Nacional para que se reinterpretem alguns referenciais de pouca flexibilidade como os que tocam a áreas como previdência, saúde e educação. No limite, é diminuindo o peso da carga tributária como percentual do PIB que o Brasil pode redirecionar mais recursos à produção, crescer mais e, por conseguinte, melhorar o quadro arrecadatório do governo.
Qual é o impacto da elevação dos juros nos EUA sobre o Brasil?
Tal impacto já foi precificado e inserido nas perspectivas sobre o Brasil. O país de pior performance neste ano dentre as maiores economias do mundo – e que, por mais vezes, teve seu crescimento revisado para baixo – ostenta curiosa característica: é, a um só tempo, o mais fechado dentre os 15 maiores mercados e o mais distante dos atuais riscos geopolíticos. Isto é, má gestão, erosão da confiança e ausência de estratégia – todas no âmbito interno – machucam mais do que choques externos como a mudança da política de juros nos EUA.