Comércio mundial
4 de julho de 2011Anúncio
A rodada de negociações iniciada em novembro de 2001 em Doha, capital do Catar, tinha metas ambiciosas. Os membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) queriam reduzir barreiras alfandegárias tanto para produtos agrícolas e industriais quanto para serviços.
A OMC também queria reforçar a regulamentação da propriedade intelectual, de investimentos, da concorrência comercial e de licitações públicas, como também simplificar procedimentos aduaneiros e compatibilizar as regras do comércio mundial com a proteção ambiental.
Mas há três anos que praticamente não há progresso algum. As conversas sobre investimento, concorrência e licitações públicas foram enterradas silenciosamente, e nas negociações sobre os outros temas há grandes divergências entre países em desenvolvimento e economias emergentes. De um lado, estão Europa e EUA, do outro, os emergentes.
Em linhas gerais, os países em desenvolvimento e emergentes querem a abertura dos mercados a produtos agrícolas, enquanto Europa e Estados Unidos pressionam por uma maior abertura para produtos industriais e serviços. As posições estão se endurecendo. Até mesmo uma tentativa realizada pelo G20 de trazer um novo alento à Rodada não fez muito efeito.
Pouco espaço de manobra
"A China e os Estados Unidos não tomam uma atitude", constata o economista Klaus Deutsch, Deutsche Bank Research, órgão responsável pela análise econômica no banco alemão.
"Os chineses já fizeram muitas concessões por ocasião de sua adesão à OMC em 2001 e veem pouco espaço para uma maior abertura do mercado", lembra. E nos EUA, sobretudo o congresso exige amplas concessões dos países em desenvolvimento, "sem ser capaz de poder oferecer muita coisa em troca".
Muitos analistas dão a Rodada Doha como morta. "Ou pelo menos na unidade de tratamento intensivo", ressalva Jürgen Matthes, economista do Institut der Deutschen Wirtschaft (Instituto da Economia Alemã), em Colônia, e especializado em política econômica internacional. "Provavelmente ninguém vai ter coragem de decretar a Rodada Doha como morta. Mas é bastante triste que não haja um engajamento multilateral suficiente dos grandes players", lamenta.
Na retórica dos políticos, a Rodada Doha ainda está muito viva. "Estamos a metros do objetivo", disse a chanceler federal alemã, Angela Merkel, em janeiro, durante o Fórum Econômico Mundial em Davos. "Todo mundo terá que fazer algum tipo de concessão. Mas vai valer a pena para todos", afirmou.
Uma conclusão bem-sucedida da Rodada Doha valeria mesmo muito a pena. "Há várias estimativas sobre o tema, e as melhores avaliam que entre 300 e 800 bilhões de dólares seriam gerados pelo incentivo adicional ao comércio. E a economia global teria um crescimento na ordem de 0,5%", afirma Deutsch.
Pacote gratuito de estímulo
Seria um verdadeiro programa de estímulo econômico gratuito. Mas muitos países perdem a paciência, deixam Doha de lado e apostam em acordos comerciais bilaterais ou regionais. A China assinou recentemente um acordo com os membros da Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean), e a União Europeia reativou ou iniciou uma série de negociações com, entre outros, o Mercosul, Índia, Singapura, Malásia, Vietnã e Canadá. Mas esses acordos são apenas uma opção de segunda classe, segundo Deutsch. "Eles dão trabalho demais. O contrato entre a UE e Coreia do Sul, por exemplo, inclui 1,5 mil páginas de texto", observa.
Matthes também não considera acordos bilaterais como alternativas a Doha. "Em última análise, estamos criando um emaranhado de regras sobrepostas. Uma selva impossível de ser atravessada, especialmente para pequenas e médias empresas envolvidas em exportações", compara o analista.
Matthes afirma que o fracasso da Rodada de Doha e sua substituição por muitos pequenos tratados bilaterais ou regionais pode provocar a erosão de todo o sistema de comércio mundial. "Se a OMC não conseguir liberalizar o comércio mundial, é possível que comece a fracassar em sua segunda função mais importante, que é a administração das regras do comércio internacional, perdendo assim toda a sua autoridade", alerta Matthes.
Autor: Rolf Wenkel (md)
Revisão: Carlos Albuquerque
Revisão: Carlos Albuquerque
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