Tribunal alemão considera lesão corporal a circuncisão por razão religiosa
28 de junho de 2012A circuncisão de meninos é um ritual muito antigo, como também uma tradição religiosa. No judaísmo, o procedimento deve acontecer no oitavo dia de vida e sela a "aliança com Deus". Também para os muçulmanos, a circuncisão é um dever religioso, que é praticada em bebês ou mais tarde na infância – geralmente como parte de uma grande festa familiar.
O Tribunal Regional de Colônia vê a remoção do prepúcio do pênis de uma criança pequena como, primeiramente, algo mundano: uma lesão corporal e, portanto, uma violação da lei alemã, passível de punição. Um juiz absolveu um réu médico na terça-feira (26/06), mas somente porque a situação jurídica não estava esclarecida.
Pesando os direitos
Na Alemanha, a liberdade religiosa e o direito ao exercício da religião são garantidos pela Constituição. No entanto, eles não estão acima da lei, mas encontram seus limites no momento em que outros direitos de elevada importância sejam afetados. Um direito fundamental extremamente importante é o "direito à integridade física" – que é violado por uma circuncisão. Um adulto pode dar, facilmente, a sua anuência, mas um recém-nascido, não.
A grande questão é saber se o desejo motivado religiosamente e o consentimento dos pais, no contexto de seu direito de educar os filhos, tornam uma circuncisão legal. "Não", afirma o professor Holm Putzke, da Universidade de Passau. Em 2008, por meio de um artigo científico, ele deu início a uma discussão jurídica sobre as circuncisões na Alemanha. Para o jurista, o argumento de que a inclusão simbólica na comunidade religiosa, através da circuncisão, estaria relacionada ao "bem-estar da criança" não seria, afinal, convincente.
Ele e outros críticos da circuncisão de meninos apontam para o fato de antigas tradições religiosas e culturais terem de ser mensuradas à luz da compreensão moderna da lei. Uma solução seria postergar a decisão sobre a circuncisão até que a pessoa em questão tivesse idade suficiente para fazer a própria escolha. Por esse motivo, para Putzke, o veredicto do Tribunal Regional é uma "decisão inovadora e corajosa."
Considerável incerteza
Bijan Fateh-Moghadam, professor da Universidade de Münster, analisa a questão juridicamente de forma bem diferente. Para ele, a circuncisão de meninos "é um procedimento relativamente fácil com riscos mínimos e, por outro lado, com reconhecidos benefícios medicinais". O consentimento dos pais não seria, portanto, nenhum abuso da autoridade parental, explica.
No processo em Colônia, um médico acusado da prática de circuncisão foi absolvido da acusação de lesão corporal. De acordo com o tribunal, frente à atual situação jurídica não esclarecida, o médico não poderia deduzir que estaria fazendo algo ilegal. Após o veredicto, a situação é diferente, lamenta Fateh-Moghadam. "Acho que a decisão do Tribunal Regional de Colônia levará a uma insegurança considerável entre os pais afetados e também entre médicos que praticam circuncisões."
Passagem através das instâncias
Mesmo com o veredicto, a discussão jurídica está longe de terminar, confirma o jurista Martin Bose, da Universidade de Bonn. Uma instância superior poderá decidir de outra forma. Um esclarecimento final, portanto, poderia ser realizado somente pela Corte Federal de Justiça ou pelo Tribunal Constitucional Federal.
Böse não considera boa a ideia de permitir a circuncisão de meninos através de uma lei especial. Segundo o jurista, atualmente, está sendo planejado justamente o contrário com vista à circuncisão feminina, ou seja, a completa proibição. "E caso se crie uma lei agora que privilegie tais costumes religiosos, excluindo-os das leis penais, surgiria uma regra com consequências imprevisíveis." Na Alemanha, a mutilação do clitóris de meninas é ilegal, sendo considerada uma grave lesão corporal.
Circuncisão no exterior
Para o professor Bijan Fateh-Moghadam, uma lei especial para a circuncisão seria teoricamente possível, mas não seria sensata nem necessária. "O melhor seria se a situação jurídica fosse esclarecida pela instância maior, pelo Tribunal Constitucional Federal. Então seria possível dispensar tal lei especial muito difícil de ser formulada." Ambos os especialistas concordam: a causa pode acabar até mesmo na Corte Europeia de Justiça. Dessa forma, a controvérsia sobre a circuncisão pode ainda levar anos.
No entanto, o tempo urge: mesmo após a decisão de Colônia, pais muçulmanos e judeus continuarão a circuncidar os filhos na Alemanha. Os procedimentos deverão ser realizados agora mais frequentemente no exterior ou em esfera privada, suspeita Fateh-Moghadam. "Acredito que, a partir desse veredicto, um efeito paradoxal irá surgir: o padrão de proteção da saúde da criança afetada irá diminuir em vez de aumentar."
Autor: Michael Gessat (ca)
Revisão: Roselaine Wandscheer