Turcos alemães oferecem muito mais que döner kebap
28 de junho de 2006Não passa despercebido aos torcedores de todas as partes do mundo em visita à Alemanha durante a Copa: quase 3 milhões de turcos e descendentes de turcos, que formam a maior comunidade estrangeira do país, dão um toque diferente à paisagem urbana das grandes cidades.
Eles vieram para ficar
A maioria deles veio na década de 60, quando a Alemanha desenvolveu programas de trabalho temporário para enfrentar a escassez de mão-de-obra industrial. Na época, a intenção era que esses trabalhadores – recrutados em países como Itália, Iugoslávia e Turquia – permanecessem no país por um tempo determinado e voltassem para seus países após o fim dos contratos.
Mas o controle da imigração acabou se provando um desafio, uma vez que envolve tanto questões profissionais quanto familiares, e aqueles que deveriam ser apenas trabalhadores temporários acabaram virando habitantes permanentes. Os turcos vieram em maior número e logo trouxeram parentes, familiares e amigos.
Conquistando pelo estômago
Diferenças culturais afetam também a formação do espaço urbano, gerando inflamadas discussões, com turcos acusando alemães de segregação e alemães acusando turcos de recusa à integração. Mas, por mais que debates dessa natureza possam turvar a convivência, a verdade é que os turcos já são parte constituinte do cotidiano alemão.
Por exemplo, na gastronomia. Os turcos conquistaram a Alemanha pelo estômago. Pratos como döner kebap, pide e börek são sinônimos de lanche bom e barato, tanto para alemães como para turcos. Lanchonetes com especialidades turcas, às vezes várias em um mesmo quarteirão, são prova de que a integração pode começar pela cozinha.
A barreira idiomática
Uma das principais barreiras à integração é o problema da língua, que tem sérias implicações no sistema educacional. "Como os pais não falam alemão, as crianças têm um aproveitamento abaixo da média nas escolas. Por isso, reforçamos aqui os temas ensinados no horário normal", explica Rüstem Cam, coordenador da Akademische Bildungsplattform, organização que visa melhorar o aproveitamento de crianças turcas nas escolas alemãs.
"Também oferecemos cursos de alemão para adultos. Assim, pais de origem turca podem se comunicar com os professores e ajudar no desempenho dos filhos, além de se integrar eles mesmos", argumenta. Atualmente, muitos professores de escolas alemãs também aprendem o turco para poder se comunicar com pais estrangeiros.
Concessões de ambos os lados
Para Cam, muitos dos primeiros imigrantes turcos que chegaram à Alemanha tinham medo de perder a própria identidade ao se integrar ao padrão de vida alemão. Tal receio seria principalmente de origem religiosa, afinal 99% dos turcos são muçulmanos, enquanto a Alemanha é predominantemente cristã.
O consumo de álcool e de carne de porco, comum entre os alemães, é proibido para muçulmanos. Mas mesmo assim: "É perfeitamente possível seguir os preceitos do Islã e ter amigos alemães", explica Cam. "Dá para ir a um bar e pedir um refrigerante, ou ir a um churrasco e comer lingüiça vegetariana. Não há motivos para isolamento."
Aos poucos, o receio da aproximação diminui. Um exemplo é a série de TV Turkisch für Anfänger (Turco para Iniciantes), veiculada pela rede pública de televisão ARD, que trouxe o processo de integração ao horário nobre e passará para a segunda temporada ainda em 2006.
Minoria de cara nova
Mas Cam admite que a comunidade turca ainda precisa vencer o medo para mostrar sua verdadeira face na Alemanha. "Somos muito mais alegres e receptivos do que nossa fama aqui permite imaginar. Há muito calor humano na Turquia."
Para mostrar o que a comunidade turca tem a oferecer, a Akademische Bildungsplattform iniciou um programa de intercâmbio para estudantes estrangeiros interessados em conhecer a cultura turca na Alemanha. Alunos da Bélgica, da Holanda e da Argentina já se hospedaram em casas de famílias de origem turca.
Durante a Copa do Mundo, conta Cam, o processo de integração cruzou a fronteira da Alemanha e chegou até Istambul. "Lá também é grande o carinho pela seleção alemã. O futebol está servindo como ferramenta de integração entre culturas."