Ucranianos vão às urnas em meio a escalada de violência
23 de maio de 2014Seis meses após a eclosão da crise que levou à queda do presidente Viktor Yanukovytch, acentuou os movimentos separatistas pró-Rússia e levou as relações entre Ocidente e Moscou a níveis similares aos da Guerra Fria, os ucranianos vão às urnas neste domingo (25/05) com o desafio de eleger um líder capaz de unir um país hoje polarizado e à beira de uma guerra civil.
A principal ameaça à eleição vem do leste. No controle de cidades como Donetsk e Lugansk, grupos pró-russos prometem fazer de tudo para impedir a votação, que consideram ilegítima. Segundo eles, organizá-las nas "repúblicas populares independentes" – que representam 15% da população da Ucrânia – seria "ilegal". Há duas semanas, um "referendo" organizado pelos insurgentes mostrou que 90% da população são favoráveis à independência da região.
Kiev considera as consultas realizadas no leste do país ilegítimas. E conclama os 35 milhões de ucranianos aptos a votar a irem às urnas, a fim de legitimar um novo governo e tentar estabilizar a situação na região. O primeiro-ministro interino Arseniy Yatsenyuk garantiu que qualquer tentativa de impedir as eleições estará "condenada ao fracasso".
Yatsenyuk admitiu, porém, que poderá haver "complicações" em alguns locais. A autoridade eleitoral ucraniana estima que 5% dos eleitores registrados não poderão exercer o direito ao voto devido a ameaças dos insurgentes. O português João Soares, coordenador de uma missão internacional de observação, disse esperar problemas em cerca de 20% dos colégios eleitorais
Megaesquema de segurança
A violência no leste ucraniano vive seu ápice desde que as forças leais a Kiev iniciaram a operação para combater os separatistas. Só na quinta-feira, pelo menos 16 soldados foram mortos por milícias armadas em Lugansk e Donetsk.
"Nunca permitiremos que ninguém nos tire a liberdade e independência, e que transforme nossa Ucrânia em parte do império pós-soviético", afirmou o presidente Olexandr Turtchinov, em discurso na televisão.
Algumas pessoas convocadas para trabalhar no pleito foram atacadas por insurgentes, que destruíram cédulas de votação e computadores. Outras afirmam terem sido ameaçados por homens armados. Nos últimos dias, rebeldes em Lugansk e Donetsk ocuparam 18 dos 34 comitês eleitorais da região.
Apesar de admitir sérias dificuldades, o chefe do Conselho Nacional de Segurança e Defesa da Ucrânia, Andriy Parubiy, afirmou estar certo de que em alguns lugares desta área as urnas estarão sob total controle das forças do governo.
Cerca de 55 mil policiais e 20 mil voluntários farão a segurança no dia da votação, além de mil observadores da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) e 5 mil observadores ucranianos formados pelo Conselho da Europa
Principais candidatos
Vinte e um candidatos concorrem neste domingo ao cargo de presidente da Ucrânia. Pesquisas de opinião mostram o bilionário Petro Poroshenko largamente na frente, mas sem alcançar os 50% necessários para definir as eleições já no primeiro turno. Em segundo lugar vem a ex-primeira-ministra Yulia Timoshenko, mas com uma margem de diferença de 20 pontos percentuais com relação a Poroshenko. O segundo turno, caso confirmado, está marcado para o dia 15 de junho.
Poroshenko, 48 anos, também chamado de "rei do chocolate", prometeu em sua forte campanha pela televisão e outdoors um "novo estilo de vida" aos ucranianos. O empresário garante que, caso saia vencedor das urnas, fará uma política de aproximação com a União Europeia e, ao mesmo tempo, vai restabelecer as boas relações com os vizinhos russos dentro de três meses.
Além do desafio de unificar o país e resolver os conflitos no leste do país, o próximo presidente ucraniano terá que satisfazer também os anseios da parcela da população que ainda ocupa a Praça da Independência em Kiev – palco dos protestos que levaram à saída de Yanukovytch há quatro meses.
Os ativistas querem garantias de que os novos governantes respeitarão os princípios democráticos e colocarão fim à corrupção. E há quem já fale em uma "terceira revolução" (a Revolução Laranja, de 2004, seria a primeira) caso os políticos eleitos retornem ao "antigo sistema corrupto".
Putin: "Guerra civil"
Pressionado por ameaças de mais sanções impostas pela Europa e pelos EUA, que afetariam setores inteiros de sua economia, a Rússia garantiu nesta sexta-feira que vai respeitar o resultado das eleições presidenciais na Ucrânia.
"Estamos vendos que os ucranianos querem que seu país supere essa prolongada crise. Nós também queremos que haja uma estabilização da situação ao final e respeitaremos a escolha do povo ucraniano", afirmou presidente Vladimir Putin durante o Fórum Econômico Internacional em São Petersburgo.
Ele também afirmou que vai trabalhar juntamente com o futuro novo líder ucraniano e pediu a Kiev que suspenda as operações militares contra os separatistas pró-russos. Putin ainda acusou os americanos de, em fevereiro passado, terem armado o "golpe" contra o então presidente ucraniano, apoiado por Moscou.
"A crise ucraniana foi desencadeada porque Yanukovytch adiou o acordo de associação com a União Europeia. A isso se seguiu um golpe de Estado apoiado por nossos amigos americanos. O resultado: caos e uma verdadeira guerra civil", disse Putin.
MSB/dpa/afp/ap/rtr/lusa