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Polônio como veneno desafia investigadores

Fabian Schmidt (msb)9 de novembro de 2013

Fatal e difícil de ser detectado, elemento radioativo é considerado instrumento ideal para um crime perfeito. Legistas constataram presença de polônio no cadáver do ex-líder palestino Arafat, mas as dúvidas permanecem.

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Foto: picture-alliance/dpa

Quando o ex-agente do serviço secreto da antiga União Soviética Alexander Litvinenko foi envenenado com polônio, em 2006, sua doença fatal, provocada pela radioatividade, transcorreu rapidamente: entre a internação hospitalar do agente e sua morte, passaram-se apenas 23 dias.

Só mesmo as condições políticas à época permitiram provar, sem sombra de dúvidas, ter sido o polônio a desencadear a doença radioativa de Litvinenko. Ele era inimigo declarado do então presidente russo Vladimir Putin, e repetidamente levara a público informações sobre o presumível envolvimento do Kremlin em atividades criminosas. Por isso, os investigadores da morte do ex-agente já desconfiavam de um envenenamento – ou seja, eles buscavam especificamente a presença do elemento radioativo.

O caso do líder palestino Yasser Arafat, falecido no dia 11 de novembro de 2004, foi diferente. A rede de televisão Al Jazeera foi quem, no fim de 2011, investigou pela primeira vez a suspeita de que ele teria sido intoxicado com polônio.

O canal árabe encomendou ao instituto forense da Universidade de Lausanne, na Suíça, a análise de objetos pessoais de Arafat disponibilizados por sua viúva, Suha. Como os resultados laboratoriais apresentaram irregularidades, o corpo do ex-presidente da Autoridade Nacional Palestina foi exumado em 27 de novembro de 2012, e amostras enviadas a três institutos independentes.

O diretor da Agência Federal russa de Medicina e Biologia, Vladimir Uiba, declarou em outubro nada ter encontrado. Já o relatório do instituto forense de Lausanne, recentemente divulgado, revelou altos níveis de polônio. Ainda se aguarda a conclusão dos peritos franceses.

Variante volátil

Os resultados contraditórios refletem o dilema dos pesquisadores, na tentativa de comprovar a presença da volátil substância. Ele se apresenta em 33 diferentes isótopos, sendo o polônio 210 o mais provável de ser utilizado como veneno. No entanto, essa variante tem uma meia-vida (período em que a radiação e quantidade do elemento se reduzem pela metade) de apenas 138 dias.

Ermittlungen zu Giftmord an Alexander Litwinenko
Investigadores do caso Litvinenko buscam indíciosFoto: picture-alliance/dpa

Muitas substâncias praticamente não são mais comprováveis após dez meias-vidas, já que resta apenas um décimo de milésimo da quantidade inicial. Entre a morte de Arafat e a exumação de seu corpo passaram-se oito anos – ou seja, 21 meias-vidas. Consequentemente, apenas um milionésimo do polônio original estaria presente.

Além disso, uma comprovação irrefutável é dificultada pelo fato de o polônio também surgir como produto da desintegração de radionuclídeos (tipo de átomo instável e, portanto, radioativo) existentes na natureza. Assim, pode-se encontrá-lo, por exemplo, em porões ou dutos onde haja rochas radioativas. Isso significa que, em certo estágio do processo de desintegração, a quantidade de presumível veneno será idêntica à concentração natural do elemento.

Exhumierung Yasser Arafat Jassir Palästinenser Präsident
Mausoléu de Yasser Arafat em Ramallah, preparado para exumação, em novembro de 2012Foto: picture-alliance/dpa

Difícil obtenção

Porém o polônio não se presta a fins criminosos apenas por ser difícil de comprovar posteriormente. É raro se levantarem suspeitas de seu emprego, pois sua produção não é fácil, possível apenas em escala industrial. Para obter uma dose mortal de 100 nanogramas, é necessário o processamento complexo de centenas de quilos de minério de urânio. O processo é mais fácil num reator nuclear: para produzir polônio, basta então bombardear com nêutrons uma quantidade de bismuto, elemento de baixa radiação.

Assim, em princípio, só as potências nucleares têm acesso ao material tóxico. Além disso, geralmente os processos técnico-nucleares nas usinas são controlados com tanto rigor, que não é possível um funcionário qualquer fabricar uma dose de polônio na pausa do café e levá-lo consigo para casa.

Embora a ministração do elemento como veneno envolva riscos, o criminoso consegue contorná-los através de um manuseio cuidadoso. O polônio é forte emissor de partículas alfa, cuja radiação iônica é fácil de ser detida, bastando uma folha de papel para se proteger do contato externo.

Morte inevitável

O polônio só apresenta perigo extremo ao entra no corpo, pois as partículas radioativas causam danos massivos às células. Seu efeito é especialmente perigoso para as células-tronco, que se multiplicam com rapidez, permitindo a recuperação do organismo. A radiação alfa pode, no entanto, impedir sua divisão celular. Os médicos fazem uso desse fenômeno na luta contra as células-tronco cancerosas – mas o polônio não é usado para esse fim.

No caso de ingestão, o polônio primeiro destrói as mucosas do estômago e do intestino, provocando vômitos, falta de apetite e náuseas. Então é assimilado pela corrente sanguínea, atacando os glóbulos brancos, causando anemia e, portanto, o enfraquecimento do sistema imunológico. Aqui, os sintomas são tonturas, dores de cabeça e falhas do sistema nervoso. Por fim, a vítima morre em consequência de infecção generalizada e colapso dos órgãos.