A verdade que vem do gelo
5 de março de 2008Um dia brando no norte da Alemanha. Lá fora o sol brilha, o termômetro acusa alguns graus positivos. Mesmo assim, Johannes Freitag está agasalhado como um esquimó: calças forradas, parca (casaco de pele), botas árticas.
Ele parece se preparar para uma grande expedição nos pólos. "Melhor ser esquisito do que congelar. Vestimos estas roupas também na Antártida. Aí você se sente bem até a 40ºC negativos."
Freitag é cientista do Instituto Alfred Wegener de Pesquisa Polar e Marítima, com sede em Bremerhaven. Ele pode não estar a caminho do Pólo Sul, mas tem muito a fazer no Laboratório do Gelo.
Gelo milenar
Assim é denominado um complexo laboratorial onde, dia e noite, dominam temperaturas glaciais: é como estar num freezer. Aqui os pesquisadores examinam amostras que não devem derreter, de forma alguma: gelo das profundezas da Antártida ou das geleiras da Groenlândia.
Uma caixa de isopor contém material retirado da calota polar antártica por perfuradoras especiais. São cilindros de gelo de vários metros de comprimento, envolvidos em plástico. Provenientes de profundidades de até 3 mil metros, eles são transportados até Bremerhaven em navios-laboratório.
Após ser serrado em diversas fatias, o material é distribuído por diferentes unidades, para uma série de exames. Parâmetros importantes são a quantidade de poeira e substâncias químicas residuais, assim como as porcentagens de ar e de cristais de gelo.
"A eternidade num grão..." de gelo
Através destes dados, os pesquisadores do Instituto Alfred Wegener podem determinar como o clima global se alterou no último milhão de anos. E este saber é utilizado para prever o clima do futuro.
As medições são realizadas no laboratório ao lado, onde a temperatura é de -15ºC. Como o ar é seco, é possível permanecer na sala durante algumas horas, se preciso. E, claro, munido de roupas quentes.
Freitag corta um pouco de gelo retirado a 19 metros de profundidade – ou seja, relativamente próximo à superfície – e o fotografa no scanner a laser. O monitor do computador exibe um padrão de manchas claras – cristais de gelo, chamados "grãos" – e escuras – bolhas de ar.
Padrões reveladores
A imagem revela um fato extraordinário aos olhos experientes de Johannes Freitag. "Os grãos estão dispostos de forma especial, formando uma linha contínua. É uma crosta-de-vento!" Isto significa que, na época não se depositaram novas camadas de neve durante muitos meses e o tempo era bastante ventoso.
"Os grãos puderam se encontrar de modo a formar uma linha contínua. Ela se manteve durante centenas de anos!", comenta, entusiasmado, o cientista. Momentos como este compensam as longas horas em temperaturas negativas.
E a vida no laboratório do gelo nem sempre é tão fria assim, assegura Freitag. "No verão, que maravilha! O tempo todo temos visita de gente que vem se refrescar um pouquinho aqui." (fg/av)