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Visita do emir do Catar a Gaza é parte de nova estratégia ocidental

26 de outubro de 2012

Ocidente busca atrair o Hamas para o seu lado e assim isolar e enfraquecer a Síria e o Irã. Estratégia serve também aos interesses do partido islâmico, que busca legitimidade externa.

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Foto: AP

Em recente visita à Faixa de Gaza, o emir Hamad bin Khalifa al-Thani, do Catar, fez uma doação de 250 milhões de dólares. O dinheiro será usado para a reconstrução de uma região ainda em ruínas após os bombardeios israelenses de 2009 e também para a construção de uma nova cidade. Esta deverá se chamar Hamad City, em homenagem ao emir.

O valor doado pode ser significativo para um lugar como Gaza, onde os níveis de pobreza são elevados. Para o Catar, é uma bagatela, como diz o economista Hamadi el-Aouni, da Universidade Livre de Berlim.

Além disso, não é o suficiente para a reconstrução total das áreas destruídas na região. Mas é um sinal – o pontapé inicial de uma estratégia visando enfraquecer o regime sírio e ao mesmo tempo isolar o Irã. Ajudar a população palestina de Gaza, afirma El-Aouni, é um objetivo apenas secundário.

Aliança internacional

A visita do emir deve ser analisada num contexto mais amplo, diz o economista. Ela seria parte de uma ação coordenada internacional para a reorganização política do Oriente Médio após as revoltas ocorridas nos últimos dois anos na região, levando em conta também a atual situação do regime do presidente Bashar al-Assad na Síria.

O objetivo dessa ação seria atrair o grupo islâmico Hamas para o lado ocidental, do qual fazem parte os países do Golfo Pérsico (como a Arábia Saudita e o próprio Catar), além de Egito, Turquia e Jordânia. Segundo o economista, "é impensável que o emir tomasse essa iniciativa sem o aval dos Estados Unidos, da Arábia Saudita e de Israel. A visita dele é parte de uma estratégia para todo o Oriente Médio".

Emir do Catar é recebido com festa na Faixa de Gaza
Emir do Catar é recebido com festa na Faixa de GazaFoto: AFP/Getty Images

Mas essa estratégia serve também aos interesses do Hamas. O partido soma pontos junto à população com a visita do emir, afirma o analista político Nidal al-Azza, da organização palestina de direitos humanos Badil. Segundo ele, o Hamas espera que o dinheiro do emir transmita uma mensagem às pessoas em Gaza: a de que o partido islâmico está em condições de fazer algo por elas. Trata-se de uma ação de publicidade que vem a calhar.

A publicidade gerada por essa iniciativa pode ajudar a aliviar algumas das tensões na Palestina. Durante anos o Hamas, de orientação religiosa, esteve em oposição ao Fatah, de orientação secular e que controla a Cisjordânia. Os últimos esforços de mediação entre os dois grupos foram realizados justamente pelo Catar. As diferenças entre eles não foram totalmente postas de lado, mas uma pequena aproximação já poderia ser um passo inicial para uma luta conjunta pelo reconhecimento de um Estado palestino.

Nova imagem para o Hamas

A aproximação entre o Hamas e o Fatah não é do interesse de Israel, e assim, diz El-Aouni, não é por acaso que o emir visitou apenas a Faixa de Gaza, deixando de lado a Cisjordânia. Isso pode ser interpretado como uma concessão a Israel. "Não creio que os israelenses aceitariam um gesto que pudesse servir como reforço à exigência dos palestinos para o reconhecimento de seu território."

Al-Azza reforça que a visita foi positiva para o Hamas também do ponto de vista da política externa, uma vez que a organização luta para obter maior legitimidade internacional. Diante disso, a associação com o Catar é altamente benéfica.

Para melhorar sua imagem no exterior, o Hamas já havia fechado, no início de 2012, seu quartel-general em Damasco, iniciativa que recebeu o apoio dos países do Golfo Pérsico, do Egito e da Jordânia. Hoje o quartel-general do Hamas fica no Catar.

Jovens palestinos agitam bandeiras do Catar em homenagem ao emir Hamad bin Khalifa al-Thani
Jovens palestinos agitam bandeiras do Catar em homenagem ao emir Hamad bin Khalifa al-ThaniFoto: Said Khatib/AFP/Getty Images

Novas alianças

Assim, a passagem do emir pela faixa de Gaza serviu aos interesses políticos de todos os envolvidos. Com o afastamento político em relação a Damasco, o Hamas corta também, ao menos em parte, os laços com o principal aliado da Síria, o Irã, país de maioria xiita.

Em troca, o partido islâmico encontra novos parceiros no lado ocidental e sunita. Isso dá ao Hamas uma nova legitimidade. Já os novos parceiros veem uma oportunidade para diminuir a postura agressiva do Hamas em relação a Israel.

Se a estratégia funcionar, a Síria e o Irã vão acabar perdendo um dos seus principais aliados contra os israelenses, um grupo visto no mundo árabe como ponta de lança na luta contra Israel. Também os governos em Teerã e Damasco tiveram por muito tempo essa imagem entre os árabes, até perder legitimidade por causa da violenta repressão à oposição síria.

Já o Hamas deverá tentar influenciar o governo israelense por meio de seus novos aliados, numa tentativa de dar um novo impulso à causa palestina.

Autor: Kersten Knipp (rc)
Revisão: Alexandre Schossler