Zeitgeist: Agenda 2010 à la française
13 de junho de 2016Do ponto de vista econômico, há tempos que empresários, industriais e políticos franceses olham com admiração e respeito para a Alemanha. Duas palavras logo são mencionadas por eles: "reformés" e "Schröder".
Elas se referem às reformas do mercado de trabalho da Alemanha implementadas em 2003 pelo governo do ex-chanceler Gerhard Schröder, da coalizão entre social-democratas e verdes, e oficialmente conhecidas pelo nome Agenda 2010.
Basicamente, as reformas flexibilizaram leis trabalhistas, cortaram ajudas sociais do Estado e forçaram desempregados a aceitar empregos por eles indesejados. Muito criticadas à época, elas custaram a reeleição de Schröder em 2005 e jogaram o Partido Social-Democrata (SPD) numa crise existencial da qual ele até hoje não se recuperou direito. Dissidentes do SPD se uniram aos antigos comunistas da Alemanha Oriental, formando o que hoje é o partido A Esquerda.
A Alemanha de 2003 é um pouco como a França de hoje no plano econômico: desemprego em alta e competitividade em baixa. O diagnóstico de economistas: um Estado de bem-estar social amparado em leis trabalhistas generosas que asfixiam a economia. A solução: reformas que flexibilizem o mercado de trabalho e tornem o país atraente para investimentos.
Em 2013, quando a Agenda 2010 completou dez anos, o presidente François Hollande não poupou elogios a Schröder. "O progresso também é fazer reformas corajosas para preservar o emprego e antecipar as mudanças sociais e culturais, e é isso que o chanceler Gerhard Schröder fez na Alemanha e que permitiu a esse país estar à frente dos outros", declarou Hollande, em Leipzig. As palavras de Hollande devem ter agradado apenas a uma parte dos presentes, pois até hoje o SPD tem dificuldades para lidar com a Agenda 2010.
A dificuldade reside no paradoxo de que justamente um partido social-democrata implementou reformas que limitam vantagens dos trabalhadores. É o mesmo que acontece na França de hoje.
Hollande e a ala moderada do Partido Socialista, liderada pelo premiê Manuel Valls, resolveram levar adiante sua própria Agenda 2010, ainda que numa versão bem mais modesta do que o original alemão e focada apenas na flexibilização de leis trabalhistas, sem mexer em outros aspectos, como as ajudas sociais.
O resultado, assim como já acontecera na Alemanha, é a forte resistência sindical, numa batalha que opõe a esquerda à esquerda. O resultado desse embate deve definir o futuro da economia da França e – assim como aconteceu na Alemanha – da social-democracia no país.
A coluna Zeitgeist oferece informações de fundo com o objetivo de contextualizar temas da atualidade, permitindo ao leitor uma compreensão mais aprofundada das notícias que ele recebe no dia a dia.