Africanas cuidam de idosos alemães
29 de abril de 2017Segunda-feira, por volta das sete horas da manhã. No serviço de atendimento da Caritas, uma organização católica, em Sankt Augustin, uma pequena cidade perto de Bona, no oeste da Alemanha, Arianne Kenfack e sua instrutora planeiam o próximo compromisso.
Arianne Kenfack vem dos Camarões e está na Alemanha há três anos. Há alguns meses, participa numa formação como enfermeira geriátrica na Caritas – um projeto da Bonner Verein für Pflege - und Gesundheitsberufe, uma associação para profissões de Enfermagem e Saúde em Bona, que busca facilitar a entrada no mercado de trabalho para mães com origem migratória. A metade das participantes são africanas.
Arianne, vai de casa em casa cuidar dos pacientes. Uma delas é a senhora Schütz, que tem 90 anos de idade e vive sozinha. Ela necessita de apoio. Arianne ajuda a senhora a vestir suas meias de compressão. São meias especiais, projetadas para prevenir coágulos sanguíneos.
A idosa está satisfeita com o trabalho de Arianne Kenfack. "A comunicação é boa. Ela é também atenciosa e faz tudo para que eu não tenha dores quando trabalha", relata a senhora Schütz.
Arianne Kenfack só teve conhecimento da profissão de cuidadora de idosos, na Alemanha. Nos Camarões, ela ainda não tinha ouvido falar deste trabalho.
"No meus país, os membros da família cuidam dos avós. Eu não entregaria os meus a estranhos", afirma. "Mas também é preciso ver que lá não há trabalho suficiente. As pessoas têm mais tempo para a família. Aqui na Alemanha, as pessoas estão tão ocupadas, têm tanto trabalho, que é difícil cuidar dos pais. Não é fácil", avalia Arianne Kenfack.
Apoio para vencer desafios
Arianne veio há quase quatro anos para a Alemanha para viver com seu marido alemão. Eles se separaram e Arianne tem que encontrar um meio de vida para si e seu filho de três anos de idade. No início, não foi fácil cuidar dos idosos, revela.
"No começo, eu realmente tive medo. Eu nunca havia tocado num estranho, que está nu numa cama. Quando eu queria lavar um paciente, eu tinha medo de machucá-lo ou fazê-lo sentir-se desconfortável. Mas minha chefe me mostrou como fazer isso, me acostumei e percebo como o medo vem diminuindo", revela a camaronesa.
Nos Camarões, estudou Química por um ano e fez um curso de alemão. Em seguida, conseguiu o visto e pôde vir para a Alemanha. Sua formação foi reconhecida aqui e ela rapidamente encontrou uma vaga de treinamento. A camaronesa teve o apoio de um projeto voltado especificamente para mulheres com origem migratória.
"É preciso ser paciente, quando se cuida deles"
A Bonner Verein für Pflege- und Gesundheitsberufe, uma associação para profissões de enfermagem e saúde em Bona, ajuda essas mulheres, por exemplo, a fazer um curso de orientação, aprender alemão e a conseguir uma vaga de treinamento.
Neste projeto, Arianne conheceu Grace Alloua Ahizi, da Costa do Marfim, e que também gostaria de trabalhar como cuidadora de idosos: "Gosto de cuidar das pessoas mais velhas, porque em África respeitamos muito os mais velhos. É preciso ser paciente, quando se cuida deles. Eu descobri que esta profissão vai me ajudar muito no futuro", afirma.
A mulher de 42 anos de idade vive na Alemanha há 15, tem dois filhos e já havia trabalhado em restaurantes ou como faxineira. Grace queria um emprego fixo e com melhor rendimento. Mas como não tem formação, não conseguiu uma vaga de treinamento.
Por meio do projeto da associação em Bona, ela pode, finalmente, começar num curso. O centro de emprego local já lhe havia oferecido vários estágios na área de cuidados. Mas lá, ela não recebeu formação.
"Dizem-lhe, você faz um estágio de três semanas e lá, você tem um choque! Mas sou corajosa, posso fazer isso, então eu pesquisei e fiz como as outras. Funcionou bem, mas não é a mesma coisa de quando você realmente aprendeu uma coisa", avalia Grace Alloua Ahizi.
Trabalho duro e reconhecimento
Beate Holl, administra o posto de enfermagem da Caritas em Sankt Augustin, organiza e distribui o trabalho. "Não podemos empregar todas as pessoas como mão de obra não qualificada, porque para boa parte do trabalho, precisamente nos cuidados com doentes e idosos, é preciso ter bons conhecimentos", critica.
Segundo Holl, "não é suficiente que as pessoas estejam alimentadas e limpas, mas também tem muito a ver com a observação dos pacientes. E no curso, que é muito exigente, é esperado que a pessoa tenha formação".
Ao mesmo, Beate Holl sabe o quão difícil é encontrar estagiários motivados. Trabalho em turnos, remuneração relativamente baixa e duro trabalho físico – por exemplo, quando o idoso tem que ser levantado – fazem com que a ocupação não seja exatamente popular.
Mas seus formandos atuais, como Arianne Kenfack dos Camarões, fazem um bom trabalho, diz Beate Holl. Até agora, ela só recebe elogios dos pacientes. Também Arianne se diz satisfeita.
"A maioria dos pacientes é gentil. As pessoas mais velhas gostam quando você ri com elas. Quando alguém faz piadas, é educado e sorri muito. Se eu fosse arrogante, eles não gostariam de mim", considera.
Preconceito, caridade e gratidão
Mas o trabalho, especialmente para as africanas, nem sempre é fácil, conta Graça Alloua Ahizi.
"Há pessoas que, por exemplo, não querem ser cuidadas por pessoas de pele escura. Mas isso não aconteceu muitas vezes comigo. Não ligo muito porque sei que a pessoa precisa de ajuda", garante.
Muitas vezes, problemas de comunicação resultaram em mal-entendidos. Mas isso nem sempre tem algo a ver com a língua, diz Arianne Kenfack.
"Por exemplo, quando alguém não tem dentes e fala, então eu não o entendo. Mas presto atenção em suas reações, como ele move suas mãos ou como olha para mim. Observo a fim de entender o que ele quer dizer-me", descreve Arianne.
Kenfack não escolheu um trabalho fácil. Mas com uma perspectiva de emprego fixo e a possibilidade de, em algum momento, apoiar sua família em Yaoundé. A gratidão dos pacientes a deixam feliz, diz Arianne. Embora ela agora viva no exterior e não possa cuidar da sua própria avó, como fez quando era adolescente.
"Lavei minha avó, esquentei sua comida, alimentei-a. Estou orgulhosa disso. Toda vez que ela ganhava um doce, ela me chamava para me dar. Porque ela estava feliz que eu cuidava dela", recorda.