Analista discorda com avaliação económica negativa de Angola
27 de setembro de 2016A economia angolana não terá o crescimento reduzido a zero em 2016. Esta é a estimativa do economista e investigador da Universidade Católica de Angola Manuel Alves da Rocha, que em entrevista à DW África criticou o relatório divulgado no final de semana pela agência de notação financeira Fitch. De acordo com este relatório, a queda do crescimento económico em Angola se deve, entre outros fatores, à crise da indústria do petróleo.
Segundo a Fitch, a previsão de crescimento da economia angolana deve chegar a zero até o fim deste ano. A redução contrasta com a meta do ano passado, que foi de 3,3%. Para o professor Manuel Alves da Rocha, apesar de o país enfrentar uma forte crise na economia, a estimativa da agência internacional não corresponde à realidade.
"Isso são previsões da Fitch, não quer dizer que venham a se consolidar. O FMI (Fundo Monetário Internacional) tem uma previsão, o Governo tem a sua previsão. E apesar de o Governo estar a fazer um esforço para manter o nível do investimento público, e manter também o investimento público como uma das alavancas da economia, o crescimento tem vindo a diminuir, isso é verdade. Mas eu não estou nada de acordo com a Fitch ao dizer que em 2016 a economia angolana vai apresentar um crescimento zero”, pontua o especialista, acrescentando que na revisão do Orçamento Geral do Estado 2016 o Governo baixou a sua estimativa de crescimento para cerca de 1% este ano.
Outros setores da economia
A queda da economia angolana se deve, sobretudo, segundo a Fitch, à baixa da cotação internacional do barril de petróleo. Angola seria grande dependente desta produção, uma vez que 95% de suas exportações são petróleo e a metade de suas receitas são oriundas destas vendas. Mas Alves da Rocha discorda e chama atenção para outros setores económicos do país.
"Não podemos esquecer que, para além do petróleo, Angola tem uma indústria transformadora; tem agricultra; tem a construção; tem o setor do comércio; tem o setor das telecomunicações; Angola tem o setor de energia. Apesar de não se beneficiarem de investimentos como no passado, estes setores de atividades estão a funcionar. Em uma menor intensidade, mas estão a funcionar”, pondera Alves da Rocha.
Em relatório divulgado em julho deste ano, afirma o investigador do Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade Católica de Angola, a projeção de crescimento económico do país estava à volta de 2%. Contudo, Alves da Rocha admite que se uma nova análise fosse feita agora, a previsão para o fim deste ano seria bem menor. "Mas não estamos a admitir que o crescimento seja 0% este ano”, ressalta.
Para 2017, o economista diz que a projeção pode chegar a 0%, "dependendo da produção do petróleo e dos problemas financeiros das companhias petrolíferas estrangeiras que estão em Angola”. "O que nós admitimos para 2017, 2018 e 2019 é que o setor do petróleo cresça a uma taxa de 0%. Mas temos outros setores, e portanto não é lícito dizer que a taxa deste ano será de zero porcento”, acrescenta.
Crise financeira e investimentos
De acordo com o economista, a crise financeira do país pode se agravar ainda mais devido às reformas económicas necessárias que foram deixadas de lado.
"Nós não fizemos reformas que devíamos ter feito, no tempo em que devíamos ter feito, e no tempo em que essas reformas seriam, sobretudo, mais baratas, menos sacrificantes para a população. Nós não fizemos. Ou não fizemos as mais essenciais. E por isso a dinâmica de investimentos da economia angolana tem vindo a diminuir. Isto é um fato”.
A estimativa da Fitch reduziu a avaliação de Angola no mercado financeiro internacional. O país agora, segundo esta avaliação, é classificado como B – ou "lixo”. Manuel Alves da Rocha critica esta classficação e alerta que a avaliação negativa deve retrair ainda mais os investimentos estrangeiros em Angola.
"A Fitch, ao divulgar essas informações, já baixou o índice de classificação de Angola. E o que vai acontecer é que, como os investidores privados estrangeiros guiam-se muito por essas classificações, e o investimento estrangeiro em Angola, que já não estava a ser de grande monta este ano, vai se retrair e simultaneamente as taxas de juro no mercado estrangeiro sobem, o que vai contribuir para agravar a situação económica e financeira do país”.
Segundo o especilista angolano, os investimentos asiáticos em Angola são uma saída para a falta de outros investidores estrangeiros no país.
"Muitas vezes critica-se a dependência desses países africanos dos investimentos da China, mas é que às vezes o ocidente e essas agências não nos deixam outras alternativas. E como os países africanos necessitam realmente de fazer investimento nas infraestruturas para promover a diversificação económica do continente, naturalmente que os dirigientes africanos – como há estas barreiras levantadas por agências como a Fitch – recorrem a quem estiver mais perto e a quem estiver disposto a financiar o crescimento económico de África em outras condições. É o caso da China, da Índia, do Japão”.
Baixo crescimento económico até 2020
A estimativa da Fitch é que o crescimento de Angola não ultrapasse 4% até o final desta década. Alves da Rocha concorda com esta projeção e diz que a informação coincide com as análises que realiza no centro de investigação.
"Estas projeções até o final da década coincidem com as nossas projeções. Nós também estimamos que até 2020 a intensidade de crescimento em Angola diminua justamente para uma média anual em torno dos 3 ou 3,5%. É uma taxa de crescimento muito baixa, entendendo as inúmeras dificuldades que a nossa população tem em termos de condições de vida”.
Na segunda metade do mês de outubro, uma missão do FMI deverá chegar a Luanda, com objetivo de verificar as contas do país. O economista diz que vai aguardar as estimativas dos agentes: "o FMI está alinhado com as nossas previsões de 3% ou 3,5% até 2020. Agora vamos ver se o FMI vai alterar essas previsões relativamrnte à Angola”.