Analistas pedem inquérito sobre acusações a ENI e Guebuza
16 de março de 2015Desde fevereiro que as publicações moçambicanas Canalmoz e Savana vêm informando sobre o caso, usando como fonte o jornal "Il Fatto Quotidiano". Segundo o diário italiano, o ex-Presidente Armando Guebuza terá oferecido à empresa de hidrocarbonetos ENI, uma isenção de impostos na venda das suas ações à China National Petroleum Corporation (CNPC) em troca de favores não especificados. O negócio não terá sido tratado diretamente com o Estado moçambicano, através da Autoridade Tributária de Moçambique, como é suposto, mas sim com o ex-chefe de Estado.
As revelações surgiram na sequência de uma investigação sobre corrupção internacional contra Paolo Scaroni, antigo administrador da petrolífera italiana, levada a cabo pela Procuradoria de Milão. De acordo com gravações telefónicas no poder da PGR italiana, Guebuza terá ainda oferecido um terreno paradisíaco no Bilene, no sul de Moçambique, "com a possibilidade de um DUAT (Direito de Uso e Aproveitamento da Terra) válido por 40 anos".
Os olhos estão agora virados para a Procuradoria-Geral da República (PGR) de Moçambique. Ericino de Salema, jurista e jornalista, autor do artigo sobre o assunto no semanário Savana, diz que há elementos suficientes para que a PGR comece a investigar o caso. "A empresa, o próprio antigo chefe de Estado e, até certo ponto, a Autoridade Tributária terão algo a dizer."
Esclarecimentos são do interesse de todos
O jornalista diz ainda que, no âmbito da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, ratificada por Moçambique em 2006, é possível que as Procuradorias dos dois países trabalhem em conjunto para esclarecer o negócio - se a contra-parte moçambicana manifestar interesse.
"Se solicitada, a Procuradoria-Geral da República de Milão tem o dever de facultar toda a informação relevante", afirma Ericino de Salema.
"O antigo chefe de Estado, como qualquer cidadão, goza da presunção de inocência. Mas, porque ele foi o mais alto magistrado da nação, é do nosso interesse como moçambicanos, e também do interesse dele, que se clarifique o que se diz."
Procuradoria vai investigar?
Borges Nhamiri, pesquisador do Centro de Integridade Pública (CIP), lembra que, até agora, não há dados sólidos que confirmem o envolvimento de Guebuza neste caso. No entanto, é preciso investigar.
A DW África tentou contactar a Procuradoria moçambicana, sem sucesso, para saber se vai abrir um inquérito.
Nhamiri diz que não se pode ficar de braços cruzados à espera que a PGR investigue as acusações.
"Em todos os grandes casos que envolvem pessoas influentes da política e economia, a Procuradoria não tem trazido os resultados expectáveis". Nhamiri dá o exemplo do "caso envolvendo o cidadão Momade Bachir Sulemane, que foi acusado a partir do exterior de estar envolvido em tráfico de drogas. A Procuradoria investigou mas os resultados não são muito convincentes."
Em Moçambique, a credibilidade dos órgãos de Justiça é muito baixa. Ela é considerada ineficiente e parcial. Os seus responsáveis são nomeados pelo Presidente da República.
Por isso, no caso que envolve Armando Guebuza e a ENI, mais uma vez, o pesquisador do CIP não espera resultados "convincentes para os moçambicanos." Borges Nhamiri entende que "a sociedade civil devia fazer a sua investigação paralela."
Procuradora-Geral nomeada por Guebuza
A atual Procuradora-Geral da República, Beatriz Muchili, foi nomeada pelo então Presidente Armando Guebuza. Isso pode influenciar na não abertura de uma investigação ao ex-Presidente?
"Esse ponto é central", responde o jurista e jornalista Ericino de Salema. "Quando somos nomeados para uma função dessas, há alguma confiança política envolvida. Nada pode avançar sem que a Procuradora-Geral da República autorize o Gabinete Central de Combate à Corrupção a avançar com um eventual inquérito. Mas espero que a sua atuação seja profissional, em defesa dos interesses do Estado moçambicano."
De acordo com a imprensa moçambicana, o Estado terá perdido 900 milhões de dólares na transação entre a ENI e a empresa chinesa CNPC. O valor total da operação era de 4,2 mil milhões USD. O Estado deveria ter encaixado 1,3 mil milhões, mas só ficou com 400 milhões.