Angola: Realização das autárquicas não será em 2015
15 de outubro de 2014Discursando sobre o estado da Nação, na Assembleia Nacional, o Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, não só afirmou que o país não dispõe de condições para a institucionalização das autarquias, como também não deu qualquer indícios de que elas venham a ser realizadas num futuro próximo.
No seu discurso, que marcou abertura da terceira sessão legislativa da III legislatura do Parlamento angolano, iniciada em 2012, o chefe de Estado angolano começou por dizer que "a situação política e económica no país é estável'' e que a democracia está em franco crescimento.
"Situação económica e social estável"
Segundo o Presidente angolano, “esses esforços visam também a melhoria da convivência política e o respeito pela diversidade e preservação das liberdades, garantias e direitos dos cidadãos. A sociedade civil e os diferentes atores não estatais, multiplicam as suas iniciativas. A situação económica e social do país é estável”.
Dos Santos anunciou, em primeira mão, o resultado final do censo geral da população que, segundo afirmou, poderá ajudar a melhorar a execução das politicas públicas do seu Governo.
“Os primeiros resultados preliminares dizem-nos que o país tem 24 milhões e 300 mil habitantes. Há muito que ansiávamos por esses resultados. Temos finalmente uma boa base para estudarmos as vias que nos permitam alcançar os objetivos do Plano Nacional de Desenvolvimento”, salientou.
Relativamente ao índice de desenvolvimento humano e ao acesso à educação, o Presidente de Angola disse que o país tem um longo caminho a percorrer e que o seu Governo elaborou um plano de contingência para erradicar o analfabetismo num prazo não superior a dez anos.
“Constatamos que ainda existem milhares de crianças fora do sistema de ensino. Esta realidade levou o Governo a preparar um plano de contingência com um orçamento que prevê a construção de cerca de 63 mil salas de aula e a formação de 126 mil professores".
Realização das autárquicas não será por enquanto
A concretização do poder autárquico era o momento mais esperado no discurso sobre o estado da Nação. Neste capítulo, o Presidente angolano foi mais do que claro ao referir-se que, por enquanto, não há condições para a institucionalização das autarquias.
“Prefiro sempre ser realista e pragmático. Prefiro ter um calendário de tarefas que possa efetivamente cumprir. São assuntos muito sérios para apreciar e para se clarificar o calendário de tarefas a realizar nos dois processos eleitorais. Penso que todos queremos dar passos em frente firmes para aprofundarmos o nosso processo democrático. Mas é melhor evitar a pressa para não tropeçarmos”, sublinhou José Eduardo dos Santos.
Ao fazer referência às dificuldades do processo de registo eleitoral, tendo em conta também a realização de eleições gerais dentro de três anos e da adaptação legislativa à substituição dos atuais órgãos locais do Estado pelas autarquias, o Presidente angolano escusou-se a adiantar prazos para a marcação das autárquicas, cuja realização tem vindo a exigir publicamente por todos os partidos da oposição e como está estabelecido na Constituição angolana.
Ao comentar o discurso do chefe de Estado angolano, o analista João Misselo da Silva considerou que José Eduardo dos Santos se contradiz nas suas alegações sobre a não existência de condições para a institucionalizaçao das autarquias.
“Se por um lado o Presidente José Eduardo dos Santos afirma que existem condições económicas e sociais em Angola, também acredito que haja condições técnicas e materiais para que de facto se realizem as eleições autárquicas no país. E isso para a normalização da Constituição”, defende o especialista.
Oposição desiludida
Os partidos da oposição angolana com representação parlamentar consideraram esta quarta-feira que o discurso do Presidente sobre o estado da Nação "quebrou expectativas", sobretudo com o anúncio da exclusão por enquanto de eleições autárquicas.
Em declarações à agência de notícias Lusa, o líder da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), Isaías Samakuva, que assistiu à cerimónia, referiu que os argumentos apresentados não foram convincentes.
"Porque o Presidente levou quatro anos a gizar estratégias para encontrar também coragem e vir dizer ao povo angolano que não há eleições autárquicas antes das próximas eleições legislativas", criticou Samakuva, que agendou para quinta-feira (16.10) uma posição final ao discurso de José Eduardo dos Santos.
O líder da Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), Abel Chivukuvuku, esperava um discurso "com mais visão, mais ambicioso e sobretudo programático."
Um discurso "em que o Presidente anunciasse uma reforma institucional para a implementação do poder local autárquico. O Presidente veio com um discurso de inércia, o conceito de realismo e pragmatismo é diferente de inércia. Aqui foi um discurso em que o Presidente catalogou todas as dificuldades e não deu mais nenhum calendário nem opção", acusou Chivukuvuku.
O presidente da bancada parlamentar do Partido de Renovação Social (PRS), Benedito Daniel, também não escondeu a desilusão com o anúncio feito por José Eduardo dos Santos.
"Realmente, o discurso correspondeu às expectativas, queríamos que o Presidente abordasse o assunto e que estabelecesse um horizonte temporal para quando a realização das eleições autárquicas, mas infelizmente esse discurso caiu como se fosse uma bomba, porque esperávamos que fosse num curto espaço de tempo", lamentou.
O discurso proferido esta quarta-feira por José Eduardo dos Santos é um assunto que poderá desencadear muitas outras reações nos próximos dias e semanas.