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Chang e Boustani: Operativos à deriva no "rio das dívidas"

12 de fevereiro de 2019

Se o caso Chang fosse um rio, o ex-ministro seria o operativo a montante e Jean Boustani o operativo a jusante. Da nascente ninguém fala no caso que agita Moçambique e sem certezas de que os seus sinais chegarão à foz.

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Deputado da FRELIMO Manuel Chang e antigo-Presidente Armando Guebuza

Não é à toa que a justiça norte-americana a todo o custo quer Manuel Chang, deputado e ex-ministro das Finanças de Moçambique, e Jean Boustani, negociador da empresa Privinvest, no banco dos réus. É que com o conhecimento que ambos possuem sobre os crimes financeiros em que supostamente estão envolvidos pode concluir-se o puzzle do crime todo e mais facilmente chegar-se a cabeça e a dezenas de outros envolvidos, detê-los e concluir-se o caso.

O criminalista António Frangoulis estabelece uma analogia entre um rio e o caso Chang ao explicar a filosofia que terá norteado a composição do delito: "A Manuel Chang podemos chamar de operativo a montante e Jean Boustani é o operativo a jusante."

Para se saber de todo o resto, explica o especialista, "em termos de processos, métodos e pessoas que participaram nesta fraude, são necessárias essas duas pessoas a quem podemos chamar de claviculares. Estas duas pedras são angulares: um [Manuel Chang] a montante e outro, Jean Boustani, a jusante, quando o rio já tem o leito mais largo."

A "nascente" Guebuza

Mas o rio não surge do nada: tem origem numa nascente, o olho d´água onde tudo floresce. O caso em questão está intimamente ligado ao caso das dívidas ocultas, avaliadas em dois mil milhões de dólares, contraídas durante a Presidência de Armando Guebuza.

Chang e Boustani: Operativos à deriva no "rio das dívidas"

O último sim a uma iniciativa de grande envergadura teria de vir dele, tal como a responsabilidade final. Lutero Simango, chefe da bancada parlamentar do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), o segundo maior partido da oposição, tal como muitos outros têm feito há muito tempo, insiste em chamar a nascente ao problema.

"Ninguém me convence que o Manuel Chang tenha assinado todos os documentos sozinhos sem que tenha uma autorização superior. O Chang era simplesmente membro de um Governo, nomeado", lembra. Para Lutero Simango, "é preciso que se chame o próprio ex-chefe de Estado, porque ele é uma parte [do processo], para esclarecer o povo moçambicano. E o silêncio deles assusta-nos."

O tortuoso percurso do rio

E o rio corre arrastando consigo muito do que encontra pelo caminho: umas são parte natural dele e outras são apenas vítimas da sua força, ou as duas coisas. Assim, pode-se depreender que se o ministro das Finanças fosse outra pessoa que não Manuel Chang muito provavelmente teria o mesmo fim. Nesta conta não entra a suspeita de Chang ter usado indevidamente o dinheiro adquirido em nome do Estado para proveito próprio.

Lutero Simango, Mitglied der MDM-Partei
Lutero Simango: "Chang foi apenas um executor"Foto: DW/R.daSilva

O deputado do MDM olha com suspeita para o facto de em Moçambique se focar as atenções apenas no "operativo a montante", ignorando o rio no seu todo.

"Há uma tendência de quererem convencer-nos de que o centro de toda esta operação, toda esta engenharia financeira é de Manuel Chang, o que não corresponde à verdade. Ele apenas foi um executor e nós sabemos muito bem que, de acordo com a nossa Constituição, o chefe do Governo é o Presidente da República são simplesmente executores, membros do Governo. Portanto, a legitimidade recai sobre o chefe de Estado", argumenta. "Agora se se mantém no silêncio, é sinal de que é um silêncio de cumplicidade", conclui Simango.

Será manobra de distração de outras partes do rio ou de quem não quer enfrentar os seus danos? Enquanto a resposta não chega, o rio segue na sua fase de meandro, o percurso tortuoso do rio, com a montante e a jusante aparentemente a servirem de bodes expiatórios. E na foz há uma plateia enfurecida a aguardar pela chegada das águas e os seus detritos. Mas será que o olho d´água também chegará ao final?

Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África