Dívidas ocultas: Nhangumele nega ter "massajado" o sistema
26 de agosto de 2021Esta quinta-feira (26.08), a audiência de Teófilo Nhangumele durou pouco mais de dez horas. Nhangumele identificou-se como intermediário no negócio entre o Governo moçambicano e a Privinvest, uma das empresas envolvidas no escândalo das dívidas ocultas.
Em tribunal, o arguido negou ter sugerido o pagamento de "luvas" para que as entidades governamentais flexibilizassem a criação de um projeto para a proteção da Zona Económica Exclusiva, de que a Privinvest e outras empresas tirariam proveito.
"Massajar o sistema" não foi uma sugestão sua, reiterou Nhangumele. O Ministério Público perguntou o que isso significa.
"É facilitar as coisas", respondeu o réu.
"Uma das maneiras de fazer com que as pessoas percebam o que nós queremos implementar é levá-las a viajar para verem as potencialidades e os equipamentos. Esse é que era o pensamento. Massajar o sistema é exatamente isso", argumentou Teófilo Nhangumele. "Por exemplo, se queremos obter uma aprovação do Governo, podemos levar membros do Governo a assistir a uma conferência internacional sobre pirataria. Então, ao processo de educar as pessoas de modo a tomar decisões informadas e lúcidas chama-se massajar o sistema", acrescentou.
Pagamento de subornos
O Ministério Público entende que "massajar o sistema" foi um esquema de pagamento de subornos a entidades governamentais para que o projeto fosse aprovado.
Ana Sheila, magistrada do Ministério Público, apresentou como prova um e-mail que o réu teria trocado com o negociador da Privinvest, Jean Boustani, mas Nhangumele negou a sua autoria.
"Não, esta resposta não é minha", afirmou.
"Parece que a resposta vem do Jean [Boustani], segundo aquilo que entendi da leitura. Eu tenho e-mails. Essa resposta aqui é do Jean Boustani", insistiu o réu.
A proposta de "massajar o sistema" não terá avançado porque a Privinvest teria afirmado que todos os pagamentos seriam efetuados apenas depois da concretização do projeto.
Dividir 50 milhões de dólares
O Ministério Público exibiu um outro e-mail, trocado entre Boustani e Nhangumele, onde se sugeria a divisão de 50 milhões de dólares entre Nhangumele e os co-arguidos Armando Ndambi Guebuza e Bruno Langa.
Nhangumele disse em tribunal que Ndambi Guebuza, o filho mais velho do ex-Presidente Armando Guebuza, recebeu 33 milhões de dólares da Privinvest.
"Confirmo. Confirmo que escrevi isso no e-mail, sim", afirmou o réu.
O próprio Nhangumele teria recebido oito milhões de dólares. A acusação quis saber o que ele fez para receber esse dinheiro.
"Eu fiz um trabalho de facilitação. Uma das coisas que demonstra que fiz a ponte é que a Privinvest teve contactos com as autoridades governamentais – isso, doutora Sheila, pode valer quinhentos [milhões] assim como pode valer um bilião [mil milhões] de dólares. Não há nenhum preço de mercado que possa ser consultado" para se chegar ao valor do trabalho, respondeu o arguido, admitindo o recebimento do valor.
Em alguns e-mails trocados entre Boustani e Nhangumele, Ndambi Guebuza era chamado de "Cinderela", António Carlos do Rosário, ex-diretor da inteligência económica da "secreta", era chamado de "Bang", e Manuel Chang, ex-ministro das Finanças, era chamado de "Yellow Man" ou "Chopstick".
A audiência de Nhangumele começou na quarta-feira (25.08) e deverá continuar na sexta-feira.