Ericino de Salema: "Moçambique deveria rever a Constituição"
22 de dezembro de 2016A seu ver, só um acordo entre os partidos com assento parlamentar poderia desencadear tal revisão. É que a oposição sozinha não tem força para exigir tal revisão no Parlamento. Mas parece que ao partido no poder, à FRELIMO, não interessa fazer tal revisão.
DW África: Quais seriam as consequências de se avançar com o processo de descentralização sem antes se rever a Constituição?
Ericino de Salema (ES): Um dos pontos, neste caso, tem a ver com a eleição dos governadores provinciais. Sucede que, na atual configuração constitucional, os governadores provinciais são nomeados pelo Presidente da República. As competências do Presidente da República, enquanto chefe de Estado, enquanto chefe de governo, chefe da diplomacia moçambicana e enquanto Comandante-chefe das Forças de Defesa e Segurança, também se encontram consagradas na Constituição da República de Moçambique. Acho de facto que, por uma questão de consistência, é desejável que se reveja primeiro a Constituição e depois ela seja tomada como base para se modificar o quadro da presente legislação.
DW Africa: Por um lado o Governo da FRELIMO pretende discutir a descentralização a um nível mais restrito e sem a presença de observadores internacionais, por outro, o partido FRELIMO no Parlamento mostra-se aberto a rever a Constituição. Para si isto é um pronunciamento que fica só a nível do discurso?
ES: Quando proferia o seu discurso no Parlamento, a chefe da bancada da FRELIMO, a senhora Margarida Talapa em nenhum momento disse de forma inequívoca que a FRELIMO pretende rever a Constituição. Ela usou muito o condicional. Pouca gente pensaria, de facto, que a FRELIMO iria rever a Constiuição. Logo existe aqui uma contradição. Tendo em conta a fase em que se encontra a RENAMO, não me parece razoável ou possível defender uma alteração antes de mexer na própria Constituição da República. Então a meu ver não passou de mero discurso de forma, um mero discurso político claramente problemático.
DW África: Há algum tempo que a oposição vem pedindo a revisão constitucional que lhe foi sempre negada. E como não tem um número de assentos suficiente está de mãos atadas. O que é possível fazer neste momento para se ultrapassar este impasse, tendo em conta que se está a discutir a descentralização e ela está intrinsicamente ligada à questão da Constituição?
ES: Acho que neste momento tem que haver um acordo entre as três forças que se fazem representar na Assembleia da República e mais concretamente a FRELIMO e a RENAMO. Neste momento nenhum partido seria capaz de rever a Constituição sozinho. Logo tem que haver acordo para que o texto da lei fundamental possa ser revisto. Tanto o MDM, como a RENAMO, como a FRELIMO já manifestaram publicamente, no passado, antes do assunto estar na ordem do dia, que tinham intenções de proceder à revisão constitucional. Sem este acordo político vai ser muito difícil tomar medidas.