Eleições no Tigray: Há perigo de secessão na Etiópia?
9 de setembro de 2020Mesmo depois de a Casa da Federação da Etiópia ter declarado, no sábado, esta eleição "inconstitucional", a Frente Popular de Libertação do Tigray (TPLF), que dirige a região e que estava em maioria na anterior coligação governamental, vai prosseguir com o escrutínio.
Isso mesmo garantiu à Reuters, na noite desta terça-feira (08.09), o chefe da comissão eleitoral do Tigray, Muluwork Kidanemariam, que disse esperar "que o Governo federal não interfira".
As autoridades têm estado a pressionar a imprensa nacional para não cobrir o escrutínio. Na segunda-feira, agentes dos serviços secretos impediram vários jornalistas de embarcar num voo de Adis Abeba com destino a Mekelle, capital da região norte do Tigray.
Direito de autoadministração
No entanto, à DW, Leake Zegeye, residente em Mekelle, diz que "esta é uma forma de mostrar ao mundo e à Etiópia que estamos a ajudar a garantir os nossos direitos de autoadministração". "Portanto, penso que esta eleição pode ser descrita como a tomada de posição inabalável do Tigray face à autoadministração e à democracia", defende.
Tanto o Governo do primeiro-ministro Abyi Ahmed como a Frente Popular de Libertação do Tigray dizem estar a seguir a Constituição da Etiópia e o Estado de direito. Mas, para o cientista político do Tigray, Yemane Zerai, os argumentos legais são um ponto discutível.
"As relações políticas determinarão a relação [futura entre as partes], que poderá ser de coexistência pacífica ou de desintegração total, o que pode levar à desintegração do Estado etíope, ou pelo menos à separação deste Estado", explica.
Relações
As relações entre o Governo central e as autoridades da região do Tigray têm vindo a deteriorar-se desde a tomada de posse de Abyi Ahmed, em 2018. Mas as tensões intensificaram-se desde que o TPLF se recusou a aderir ao Partido da Prosperidade, criado pelo primeiro-ministro no ano passado.
Quando confrontado, no mês passado, com a intenção da região em seguir em frente com a eleição de uma nova administração regional, Abyi Ahmed excluiu a possibilidade de uma intervenção militar ou de cortes orçamentais, mas garantiu que haverá consequências para a região.
Também em entrevista à DW, o analista Jan Abbink diz não acreditar numa intervenção militar por parte do Governo central. "Conhecendo os objetivos da liderança e o estilo do primeiro-ministro Abiy Ahmed, é pouco provável que ele o faça. Ele tentará manter o diálogo".
No entanto, acrescenta o mesmo analista, "pode muito bem acontecer que outras regiões" sigam o exemplo do Tigray. "Isto não se aplica à maioria dos aliados de Abiy Ahmed no Governo, mas aos que podemos chamar de etno-nacionalistas, há alguns nas regiões de Oromia e Amhara, que realmente querem aumentar a autonomia e podem exercer pressão sobre o Governo".