Existe um mercado informal de sangue em Nampula
27 de janeiro de 2016Foi, durante muito tempo, uma prática silenciosa. Mas, hoje em dia, é quase feita à vista de todos: a venda de sangue na província moçambicana de Nampula. Tudo acontece no Hospital Central de Nampula, a maior unidade sanitária da região norte do país.
Meio litro de sangue, 500 meticais
A reportagem da DW desloca-se ao banco de sangue do Hospital Central de Nampula, onde encontra imediatamente um homem a vender sangue. Abordado pela nossa reportagem, pede, por meio litro de sangue, 500 meticais, o equivalente a 10 euros. Mas está disposto a negociar o preço: "Você tem quanto aí? Vou baixar para 300 meticais", diz-nos o homem.
Segundo doentes e familiares, trata-se de uma prática comum, em Nampula. Um dos utentes do hospital, de nome Hélder Caetano, confirma que se viu obrigado a pagar dinheiro por sangue para salvar a vida de um familiar, internado no Hospital Central de Nampula: “Para ter facilidade de sangue a pessoa tem que falar com um enfermeiro em serviço. Eu tive uma prima que trabalhava lá no banco de sangue, mas já não está lá, e a situação ficou mais complicada.”
Outra cidadã abordada pelo repórter DW, Angelina Sardinha, familiar de um doente internado na pediatria, não autorizou a gravação da entrevista, mas também confirmou que há sangue à venda.
Stocks de sangue diminuiram drásticamente
Oficialmente o sangue é gratuito em Moçambique. No entanto, segundo apurou a DW África, começou a ser comercializado em 2000, depois da extinção de uma organização de dadores voluntários, que fornecia sangue aos hospitais da província de Nampula. A venda de sangue tornara-se necessária, segundo alguns funcionários do hospital, depois dos stocks de sangue terem diminuido drásticamente.
Mais tarde, em 2008, foi criada a "Associação dos Voluntários de Doação de Sangue", em Nampula, mas a "comercialização" continuou. O presidente da associação, Zacarias Juriasse, diz que é preciso alertar a população de que o sangue não está à venda: “Está-se a propagar informações falsas de que o sangue é vendido, por causa de um punhado de doadores que vendem seu sangue.”
Na cidade de Nampula há apenas 141 pessoas que doam sangue com frequência. Juriasse admite ter conhecimento de membros da associação que vendem sangue, embora não saiba quantos ao certo. Conhece também casos de pessoas que usaram ilegalmente o nome da associação para fazer esse tipo de negócio ilícito.
Os próprios funcionários dos hospitais vendem sangue
A directora clínica do Hospital Central de Nampula, Bainabo Sahal, diz não ter detalhes sobre o caso. Mas a directora Provincial da Saúde de Nampula, Munira Abudou, reconhece a existência de pessoas, incluindo funcionários da Saúde na província, que vendem sangue, particularmente naquele hospital. Munira Abudou promete punições: “Sangue não se paga, é de borla.”
O Banco de Sangue do Hospital Central de Nampula tem falta de sangue. As autoridades apelam aos cidadãos que façam doações, que podem salvar vidas. Mas chamam à atenção: Doar sangue não pode e não deve virar negócio.